8.5.06

Choque à vista

Meirelles e Mantega: choque à vista
Presidente do BC revela a autoridades monetárias estrangeiras que 'não se sente bem' com o ministro da Fazenda

O presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, confessou a autoridades monetárias estrangeiras sua insatisfação em relação ao ministro da Fazenda, Guido Mantega. "Meirelles me disse que não se sente bem com Mantega", afirmou um importante presidente de BC estrangeiro que esteve com Meirelles em Washington na semana passada.

Desde a noite de ontem, chefes de bancos centrais das principais economias do mundo estão reunidos na Basiléia na sede do Banco de Compensações Internacionais (BIS), o banco central dos bancos centrais.

Mantega deu entrevista nos últimos dias a um meio de comunicação no Brasil alertando que a "sintonia" entre o BC e seu ministério dependeria da manutenção da tendência do Banco Central em continuar a reduzir as taxas de juros.

Meirelles, que chegou à Basiléia vindo de Washington, afirmou não ter visto nada em relação aos comentários de Mantega. "Vou ler só amanhã", disse, evitando falar no assunto. Apesar de a assessoria ter preparado resumo das notícias para o presidente do BC, Meirelles, no começo da noite, insistia que não havia lido as declarações do ministro da Fazenda. "Tenho que trabalhar", justificou.

Segundo uma autoridade monetária de um país em desenvolvimento, as diferenças de percepção da política entre Mantega e Meirelles não têm afetado ainda a imagem do Brasil nos fóruns internacionais. "Todos consideram a atuação do BC brasileiro exemplar. Meirelles parece ter a confiança do presidente Luiz Inácio Lula da Silva", afirmou.

Na avaliação do presidente do Banco Central do Chile, Vittorio Corbo, a pressão pela queda de juros no Brasil é similar a que ocorreu no Chile nos anos 90. "Se o BC (brasileiro) mantiver a mesma direção em relação às expectativas de inflação, as taxas de juros vão se tornar mais parecidas com as taxas internacionais. Nós também tínhamos juros altos. Mas, à medida que se vai se aceitando que temos uma inflação controlada, hoje podemos ter juros nos mesmos níveis que os EUA."

DISCURSO DE CANDIDATO

Para Corbo, o BC brasileiro fez "grande progresso em reduzir a inflação para níveis que não se via há muitos anos". "A inflação está estabilizada e permite pela primeira vez em muitos anos que o investidor tenha um horizonte a longo prazo, criando condições para o crescimento a longo prazo."

Outras autoridades monetárias também parecem confiar no discurso de Meirelles. "Meirelles defende suas posições e a condução de sua política com muita precisão", disse Jaime Caruana, presidente do BC espanhol. "Tenho impressões muito positivas em relação a Meirelles", afirmou o presidente do Banco Central Europeu, Jean Claude Trichet.

Mas os banqueiros que participam desses encontros internacionais também já comentam nos bastidores que Meirelles já não está falando apenas de política macroeconômica em suas conversas com outras autoridades monetárias. "Meirelles começa a falar de outros temas políticos", afirmou um banqueiro, insinuando que o presidente do BC brasileiro está começando a adotar um discurso de candidato às eleições municipais em 2007.
Estadão