15.10.07

As dívidas de Wellington Salgado

Família de aliado de Renan é acusada de sonegar R$ 75 mi

Senador Wellington Salgado é co-réu em oito ações; defesa alega "vícios processuais"

Montante pode ser maior por conta de defasagem dos valores fixados no início das ações e também porque há mais processos na Justiça

O governo federal acusa na Justiça o senador Wellington Salgado (PMDB-MG), seus pais, irmãos e instituições de ensino da família no Estado do Rio e em Minas Gerais de sonegarem pelo menos R$ 75,13 milhões em contribuições previdenciárias e Imposto de Renda.
Um dos principais aliados do presidente licenciado do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), Salgado é co-réu em oito ações de execução fiscal que tramitam na 8ª Vara de Justiça Federal de Niterói (RJ). Os advogados da família alegam "nulidades e vícios processuais".
Em valores não-atualizados, a Fazenda Nacional e o Instituto Nacional do Seguro Social cobram dele, dos parentes e entidades que controlam R$ 75,13 milhões, mas o montante devido pode ser bem maior, não só pela defasagem dos valores fixados na abertura das ações mas também porque existem mais processos tramitando na Justiça fluminense e mineira.
Só na 1ª Vara Federal de São Gonçalo (RJ) correm mais três ações de execução fiscal movidas pelo INSS contra a Asoec (Associação Salgado de Oliveira de Educação e Cultura), instituição da qual Salgado se licenciou da presidência ao assumir há dois anos a vaga no Senado do ministro das Comunicações, Hélio Costa. Na própria 5ª Vara de Niterói tramita mais uma execução fiscal, cujo valor não foi informado pela Justiça.
A gestão de Salgado na Asoec já chegou ao STF (Supremo Tribunal Federal) em outros dois inquéritos em que é acusado de apropriação indébita no valor de R$ 12 milhões de IR. Segundo a Receita, a Asoec descontou de funcionários e prestadores de serviço o imposto, mas não repassou os valores ao fisco. Segundo a Receita, o dinheiro foi desviado entre maio de 2000 e dezembro de 2005.
Só em uma ação da 5ª Vara de Niterói a Asoec é cobrada pela Fazenda em R$ 43,282 milhões, em valores de outubro de 2005. São réus no processo, além da instituição, o senador Salgado, seu pai, Joaquim de Oliveira, e seus irmãos Wallace e Jefferson Salgado de Oliveira, que assumiu a Asoec em 2005.
Noutra ação, o INSS acusa a Asoec de sonegar R$ 24,112 milhões em contribuições previdenciárias. Nesse processo, além dos três irmãos, do pai e da instituição, é co-ré a professora Marlene Salgado, matriarca da família e reitora da Universo (Universidade Salgado de Oliveira). Também é ré em parte das ações a Sociedade de Ensino do Triângulo, de Uberlândia (MG), gerida pela Asoec.
Além da educação, a família tem expandido sua atuação na área das comunicações. Wellington Salgado controla, associado aos irmãos e a amigos, três emissoras de TV: a TV Vitoriosa, canal 3 de Ituiutaba (MG), retransmissora do SBT; a TV Goiânia, retransmissora da Band em Goiás, e a TV Passaponte, emissora educativa de São Gonçalo, onde a Asoec foi fundada em 1971 e até hoje tem sede. A TV Goiânia ele comprou dos Diários Associados em 2002, mas só quitou a dívida de R$ 9,5 milhões em 2005, dois anos após o previsto e após ser acionado judicialmente.
O senador, que há dias anunciou a intenção de deixar a política em 2008, é sócio ainda de pelo menos cinco rádios -no Rio (Angra dos Reis, Cabo Frio e Rio Bonito), Minas (Araguari e Uberlândia) e Goiás (Senador Canedo)- e ainda do jornal "O São Gonçalo", dirigido pelo irmão do senador, no Rio.

Folha
Privataria!

Carlos Alberto Sardenberg

Quer dizer que o governo Lula entrega o patrimônio nacional para empresas estrangeiras e não cobra nem um centavo por isso? De graça, as companhias espanholas vão ficar 25 anos cobrando pedágio e ganhando dinheiro com estradas construídas com imposto pago pelo contribuinte brasileiro!

Quer dizer que o governo Lula monta um modelo de privatização que favorece o capital estrangeiro? Só multinacionais, que trazem capital de fora, mais barato, conseguem assumir pedágios tão baixos. Mais ainda: o dólar tão barato, outra proeza de Lula, favorece os estrangeiros, pois a tarifa em dólar fica maior e as companhias gastarão menos reais para enviar seus polpudos lucros aos acionistas lá fora.

Nunca na história deste país um governo foi tão servil às empreiteiras multinacionais. Uma privataria!

Essa turma que pede a reestatização da Vale, por ter sido vendida a "preço de banana", não vai pedir uma "CPI da doação das estradas"? Aliás, deveria ser uma CPI ampliada, pois a Vale, entregue por FHC, acaba de ganhar de Lula um trecho enorme da Ferrovia Norte-Sul.

Isso aí, pessoal. Quem quiser pode usar os motes acima, sem pagar direitos autorais. Tão de graça quanto as rodovias.

Agora, está mesmo muito engraçado observar Lula, seus ministros e os formadores da opinião de esquerda defenderem seu modelo de privatização de rodovias.

Muitos começam por apresentar a ressalva: não é privatização, é concessão. Tudo bem: concessão de uma via pública, construída pelo Estado, para uma empresa privada explorá-la por 25 anos, conforme regras, mas sempre sob a "ótica do lucro".

Depois, segue o argumento, ao contrário da privatização tucana, com seus pedágios caros e "elitistas", a privatização, perdão, a concessão petista é popular-democrática, pois cobra pedágios bem baratinhos.

Assim é, temos agora uma privatização tucana e outra petista. E - quer saber? - ficou melhor para o País. Resta uma discussão de método, os dois lados concordando que a empresa privada, nacional ou estrangeira, é mais competente para operar e oferecer ao usuário uma estrada de qualidade e eficiente para negócios e turismo.

Isso posto, eis algumas observações razoáveis sobre o tema:

Modelo de concessão - o governo, poder concedente, "dono" da estrada, pode ou não cobrar pela outorga da concessão. No primeiro caso, seria como cobrar um aluguel. As duas modalidades têm justificativas. Quando cobra, o governo faz caixa para, por exemplo, investir em estradas menos rentáveis (modelo adotado em São Paulo). Quando há cobrança, ganha o leilão a empresa que oferecer o pagamento mais alto, dentro de um padrão para os pedágios. Obviamente, o custo da operação é maior, de onde sai um pedágio mais caro. Já no caso dos últimos leilões federais, o governo Lula decidiu não cobrar a outorga. Ganhou a empresa que ofereceu pedágio mais barato. É um critério mais simples, melhor para o usuário, pior para o governo. De todo modo, o governo Lula pode se dar ao luxo de perder essa receita, pois está arrecadando como nunca na história deste país.

Exigências impostas à concessionária - mais ou menos investimentos no início do contrato, maior ou menor qualidade do piso, quando se inicia a cobrança do pedágio. No caso do último leilão das sete rodovias federais, técnicos dizem que há exigências menores para o piso, por exemplo. A cobrança do pedágio é imediata, enquanto no caso das privatizações feitas em São Paulo (no governo Mário Covas), essa cobrança se fazia depois de feita parte das obras. Com isso o fluxo de caixa é menor, o custo da operação é maior.

O ambiente macroeconômico - em momento de instabilidade, inflação e desarranjo das contas públicas, as empresas privadas só fazem negócio com o governo se tiverem garantias de que a rentabilidade não será reduzida. Preços começam mais elevados para prevenir choques futuros, como inflação ou desvalorização da moeda local. Por exemplo: a empresa estrangeira topa um pedágio de R$ 1,80, o equivalente a US$ 1. De repente, o real se desvaloriza e a cotação vai a R$ 3,60, fazendo com que a tarifa caia a US$ 0,5. E é evidente que o ambiente macroeconômico hoje é muito superior ao do momento em que foram feitas as concessões mais antigas. Há razoável convicção de que não haverá inflação, que os juros vão cair e que o dólar não vai disparar.

Capacidade das empresas privadas - concessão de rodovias (e outros serviços) é um negócio relativamente novo. Só agora existem muitas companhias internacionais, entre as quais as espanholas, que desenvolveram enorme capacidade no setor. O Aeroporto de Heathrow, em Londres, é de propriedade de uma empreiteira espanhola. Por isso, no último leilão brasileiro, apareceram tantas empresas competindo. Isso é outro fator que derruba os preços.

E mais: pedágio barato não é garantia de sucesso da operação. Em alguns países, como no México, o fracasso de concessões de rodovias teve como causa justamente o preço baixo do pedágio e os prazos menores de concessão (abaixo dos 20 anos). Com isso, as concessionárias, a um determinado momento, perceberam que não obteriam o retorno do capital e pararam de investir. O barato saiu caro.

Por isso cuidado com as comparações entre os preços da última licitação e os das anteriores.

O que sabemos é que as atuais estradas privatizadas vão muito bem, obrigado. São as melhores do País, têm o menor número de acidentes. O modelo funcionou.

O novo modelo, dos pedágios baratos, ainda não foi testado - e só vai ser testado mesmo sabem quando? No próximo governo, no mesmo período, 2010/2011, em que se saberá se o novo modelo lulista deu conta do fornecimento de energia.

É preciso admitir: na política e na mídia, o cara é craque.

Estadão

11.10.07

Defensores e adversários batem boca no plenário

A pressão provocada pelo caso do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), gerou ontem debates inusitados entre seus defensores e adversários. Depois que Gilvam Borges (PMDB-AP), aliado de Renan, avisou em discurso que não condenaria um senador sem provas, Mário Couto (PSDB-PA) o interrompeu para perguntar se ele não recebia mensagens pela internet o criticando. Segundo Gilvam, 90% dos e-mails que recebe são elogiosos.

Foi o suficiente para que Couto começasse a gritar: "Ai, meu Deus do céu! Ai, que eu estou maluco!", disse, agitando braços e pernas e arrancando risadas do plenário, incluindo Gilvam. "O senhor não deve estar lendo os e-mails que recebe. Mil por cento dos e-mails que eu recebo diz para tirar esse Renan daí. Eu estou maluco! Vou correndo agora me tratar no hospital!", gritou o senador.

"O senhor lembra que, quando o senador Renan fez seu primeiro discurso de defesa, formou-se uma fila para parabenizá-lo? Dessa vez ninguém foi lá cumprimentá-lo", criticou Couto. Gilvam reagiu. "Joana D’Arc foi queimada viva na fogueira. Jesus Cristo foi preterido em relação a Barrabás. Sou um homem do perdão e um homem justo. Se me convencerem, eu aceito. Só não aceito a intransigência brutal e violenta dizendo que ele tem que ser condenado sem provas. Quem tornou ele esse grande demônio? Onde estão as provas?" E acrescentou: "Eu ando tranqüilo nas ruas no meu Estado. As pessoas me abraçam. E sobre os e-mails, eu separo os que criticam e leio os que cumprimentam", disse, provocando outra reação instantânea de Couto: "Então não vai sobrar nada para o senhor ler."

Magno Malta (PR-ES) entrou no debate. "O clima está asfixiante. Parece que o Senado é um elevador que deu pane, cheio de pessoas com síndrome de pânico, e não dá para sair. E veja só. Tudo nesse caso faz sucesso. A Mônica Veloso está fazendo sucesso na Playboy. Daqui a pouco, o Francisco Escórcio posa para uma G Magazine e pode fazer sucesso. Com Photoshop, quem sabe?", disparou, referindo-se ao ex-senador e assessor de Renan suspeito de tentar espionar senadores da oposição.
Estadão
"Se preciso, farei acareação entre Renan e Lyra"


Indicado para relatar a terceira e mais documentada representação contra o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), o senador Jefferson Péres (PDT-AM) afirma que fará uma acareação entre o usineiro e ex-deputado federal João Lyra e o peemedebista, se houver necessidade de novos esclarecimentos a respeito das empresas de comunicação que ambos teriam comprado em nome de laranjas.

É a terceira vez que ele assume a tarefa de aprofundar investigações contra colegas. Nos episódios anteriores, em 1999 e em 2006, pediu a cassação dos mandatos dos investigados Luiz Estevão (PMDB-DF), aceita pelo plenário, e Ney Suassuna (PMDB-PB), absolvido no Conselho de Ética.

Péres integra a lista dos adversários que estariam sendo chantageados por Renan com a insinuação de que empregaria a mulher e dois filhos em seu gabinete no Senado. Além de o próprio senador negar, a Diretoria-Geral também diz que a informação é falsa e que, em nenhum momento, ele empregou parentes na Casa.

A escolha do senhor coincidiu com a decisão dos governistas de se alinharem aos que querem a saída de Renan da presidência. Foi coincidência ou uma sinalização de que a situação de Renan piorou?

Há um novo clima no Senado a partir dos fatos ocorridos na semana passada, seja o afastamento desrespeitoso dos senadores Pedro Simon (PMDB-RS) e Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE) da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), seja o episódio da suposta tentativa de espionagem dos senadores goianos Marconi Perillo (PSDB) e Demóstenes Torres (DEM). Esses são fatos que realmente reduziram a margem de apoio do senador Calheiros e que deixaram claro que o presidente do Senado tem hoje muito poucos senadores que o apóiam e dispostos a ir às últimas conseqüências por ele.

Ao pedir que Renan se afastasse da presidência no início do primeiro processo, o senhor previa que o episódio chegaria ao ponto em que chegou?

Não, não previa, não. O comportamento do senador Renan Calheiros, a obstinação dele em permanecer no cargo, contrariando até o bom senso, e a interferência dele nos processos que tramitam no conselho, direta ou indiretamente, isso me surpreendeu.

A principal testemunha dessa representação é o ex-deputado e usineiro João Lyra (PTB-AL). O senhor vai pedir que ele compareça ao conselho?

Vou pedir ainda hoje o depoimento dele prestado ao corregedor Romeu Tuma, em Alagoas. Farei uma leitura e, se for o caso, pedirei novos esclarecimentos a ele e, se ele confirmar o que disse ao Tuma, terei de pedir uma acareação com o senador Renan Calheiros. Pretendo ouvir, também, as pessoas apontadas como laranjas. Espero fazer isso rapidamente. Se necessário, ouvirei duas, três testemunhas no mesmo dia até.

Como o senhor vai conduzir o trabalho da relatoria?

Farei um grande esforço para ser isento, independentemente do que eu pense do senador Renan, do comportamento dele. No processo, eu terei de me ater rigorosamente às provas dos autos e, se os mesmos não forem convincentes, não vacilarei - mesmo diante da incompreensão da opinião pública -, se for o caso, em pedir o arquivamento do processo por falta de prova.
Ministro "se esquece" de citar recordes de arrecadação


Ao dizer que a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) se tornou imprescindível - a ponto de exigir medidas duras, se não for prorrogada -, o ministro Guido Mantega mais uma vez deixou de citar que o governo bate seguidos recordes de arrecadação de impostos, superando o ganho com o "imposto sobre o cheque". De janeiro a agosto, segundo a Receita Federal, a arrecadação de impostos e contribuições da União cresceu em ritmo duas vezes superior ao aumento do Produto Interno Bruto (PIB) - atingindo R$ 381,48 bilhões. São R$ 37,33 bilhões a mais que no mesmo período de 2006, descontada a inflação.

Os números indicam, portanto, que os cofres federais receberam um montante extra superior à própria arrecadação prevista da CPMF para este ano. O valor também é similar à arrecadação da contribuição estimada para o ano que vem, de R$ 38 bilhões. São recordes acumulados desde o início de 2004: em agosto, por exemplo, atingiu o patamar inédito de R$ 48,65 bilhões.

O cenário do País apontado pela Receita e pelo IBGE é claro. Enquanto a economia cresceu 4,9% no primeiro semestre de 2007, a arrecadação teve expansão real de 10,71%. O total coletado via CPMF, cuja prorrogação virou prioridade total do governo no Congresso, subiu em ritmo maior: 11,19%. O discurso oficial, no entanto, é de que não houve aumento de alíquotas e esse resultado é conseqüência natural do dinamismo e do crescimento da economia.

Quando sugere elevar alíquotas de outros tributos ou limitar o PAC, em caso de derrota no Senado, Mantega ignora, também, a carga tributária de 37% do PIB. Para tributaristas, a arrecadação extra acumulada até o mês de agosto já mostra que é possível extinguir a CPMF em 2008, desde que o governo enxugue gastos e evite criar novas despesas. Lembram, ainda, a necessidade de fazer uma reforma séria no sistema.
Estadão

Ideli: "Ai, eu fiquei com uma inveja!"

Ideli: "Ai, eu fiquei com uma inveja!"
Mônica Bergamo

Lula Marques/Folha Imagem



"Ai, eu fiquei com uma inveja!"

A senadora Ideli Salvatti (PT-SC), líder do PT no Senado, foi flagrada anteontem, em plena sessão legislativa, vendo fotos do ensaio de Mônica Velloso, a mãe da filha do senador Renan Calheiros, na "Playboy". Ela falou à coluna:


FOLHA - Como se sentiu ao ser flagrada vendo fotos da "Playboy"?
IDELI SALVATTI -
Deixa eu lhe dizer, é assim, ó: a gente tem lá no Senado um computador na mesa [de cada parlamentar]. E é normal, durante a sessão, você acessar o noticiário, sites, blogs e tal. O [blog do jornalista Ricardo] Noblat estava fazendo uma transmissão online da sessão, do nosso bate-boca lá no plenário, meio que uma retransmissão de corrida de cavalo, né? Eu estava lendo. E de repente me aparece três fotos da Mônica Veloso! (rindo) Foi um constrangimento! (mais risos) E eu louca para tirar as fotos [da tela do computador], e só aparecia mais fotografia, e mais fotografia, né? E os senadores atrás de mim, cacarejando: "Ideli! Ideli! Os repórteres estão tirando foto. Ideli...". Foi um constrangimento geral! O Senado pegando fogo, um bate boca, entendeu... Mas aí eu vi que tinha horrores de gente olhando as fotos, no Senado inteiro, né? Então, relaxa e goza. Fazer o quê?

FOLHA - Por que a senhora se sentiu tão constrangida?
IDELI -
É o tipo da coisa que... Como é que eu vou lhe dizer? Você vê fotografias desse tipo, mas quando você se sente observada vendo fotos desse tipo, não tem jeito de não ficar constrangida, né? Ainda mais num ambiente onde... Sabe, aquela coisa do mínimo de sobriedade do cargo, da função. Não é bem o lugar para você ter na tua frente, na telinha do computador, três fotos da moça, né?

FOLHA - O que achou do ensaio?
IDELI -
Ai, eu fiquei com uma inveja! (rindo) Ela é muito linda, né? É bonita, muito bonita.

FOLHA - A senhora concorda com aquelas colocações de pessoas que, "como mulher", desaprovam a decisão de Mônica de fazer o ensaio?
IDELI -
Eu fui criada com o nu em casa, com muita naturalidade, tanto na minha infância quanto com meus filhos. Ninguém teve preconceito de andar nu em casa, de trocar a roupa, tomar banho, essas coisas todas. Eu não tenho preconceito, nada, entende? Mas quando o corpo começa a servir para questão comercial ou política, eu não posso deixar de dizer que é constrangedor.

9.10.07

Renan levanta dados sobre despesas de todos os senadores

Gasto com verba indenizatória, às vezes atestado com nota fria, serviria de munição contra adversários do senador

A direção do Senado produziu nos últimos meses um raio X dos gastos oficiais de todos os senadores. O dossiê começou a ser feito após as primeiras denúncias contra o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) no Conselho de Ética. O diretor-geral do Senado, Agaciel da Silva Maia, pediu à Secretaria de Controle Interno uma cópia, em papel, da prestação de contas da verba indenizatória de todos os 81 senadores. Na papelada, estão as despesas feitas pelos parlamentares e as respectivas notas que, pelo menos em tese, comprovam como o dinheiro foi gasto. A verba indenizatória, de R$ 15 mil, é mensal, mas a explicação para os gastos é entregue a cada três meses.

<Veja especial sobre o caso Renan

O movimento do diretor-geral fez parte de uma série de ações organizadas por Renan para intimidar os colegas que ameaçam votar a favor de sua cassação. As informações obtidas por Agaciel serviriam como munição porque, em muitos casos, as notas apresentadas seriam frias, indicariam gastos incompatíveis ou inapropriados. Nas mãos de Renan e de sua tropa de choque, o rol de supostas irregularidades representaria o aumento de poder de barganha e intimidação perante os senadores flagrados em deslizes.

A produção do dossiê foi confirmada ao Estado ontem por três pessoas. Elas contaram que Agaciel teria agido a mando de Renan. Da Espanha, o diretor-geral telefonou ontem para um funcionário da secretaria, que seria amigo do senador Demóstenes Torres (DEM-GO), para saber se o parlamentar havia dito algo especial.

“Sei que você é amigo do Demóstenes. Gostaria de saber se ele te pediu alguma coisa”, teria dito o diretor-geral ao funcionário, segundo relato de pessoas que presenciaram a conversa. O servidor negou: “Sou funcionário do Senado Federal.”

NOTAS

Ainda da Europa, Agaciel enviou uma nota, lida em plenário pelo primeiro vice-presidente da Casa, senador Tião Viana (PT-AC), na qual diz que os funcionários do quadro permanente do Senado “têm seu procedimento administrativo regulado por lei, sendo seu dever acatá-la de forma plena, sem qualquer espaço para ações informais, não previstas no quadro de funções administrativas”. E prossegue: “No que se refere à prestação de contas, destacamos não haver nada a ser investigado, uma vez que todas as despesas do Senado são realizadas dentro da estrita legalidade e auditadas pela Secretaria de Controle Interno e pelo Tribunal de Contas da União (TCU).”

A preocupação de Agaciel de se antecipar na defesa do sigilo das contas não surpreendeu os senadores. Vários confirmaram a suspeita de que havia vazamento da prestação de contas de colegas. O primeiro sinal de que o rastreamento havia sido feito foi emitido por Renan em 12 de setembro, data de sua absolvição no primeiro processo de cassação. Na sessão secreta, ele fez ameaça direta ao senador Pedro Simon (PMDB-RS).

Encarando Simon, Renan disse que, se quisesse misturar o público com o privado, teria contratado a produtora da jornalista Mônica Veloso - com quem teve uma filha e se tornou pivô da primeira denúncia contra ele. Simon teria apresentado notas de produtora para justificar parte de seus gastos referentes à verba indenizatória.

Renan fez outras ameaças. Ao todo, já levantou suspeitas sobre dez colegas. Um parlamentar resumiu assim a estratégia do presidente do Senado: “Ele está utilizando a tática do gambá: espalhando mau cheiro para todo lado na tentativa de igualar todos.” São alvos de Renan: José Agripino Maia (DEM-RN), Tião Viana (PT-AC), Pedro Simon (PMDB-RS), Ideli Salvatti (PT-SC), Jefferson Péres (PDT-AM), Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE), Aloizio Mercadante (PT-SP), Serys Slhessarenko (PT-MT), Demóstenes Torres (DEM-GO) e Marconi Perillo (PSDB-GO).

Como se tivesse um serviço particular de inteligência, Renan recolheu contra cada um deles indícios - verdadeiros ou não - de irregularidades para constrangê-los. No PT, a desconfiança é de que ele esteja sendo orientado e aconselhado pelo deputado Jader Barbalho (PMDB-PA). Jader já foi presidente do Senado e renunciou ao mandato para escapar de cassação.

RENDA

Apesar de buscar dados sobre o uso da verba indenizatória pelos colegas, Renan também se complicou com esse assunto, ao se defender da primeira denúncia - de ter contas pessoais pagas por um lobista. Ele citou a verba para inflar seus vencimentos.

Só que essa verba não é renda e sim ressarcimento de despesas - como aluguel e combustíveis - para o exercício do mandato no Estado de origem. Além disso, é paga mediante a apresentação de notas e não é tributável. A verba indenizatória, em 2006, foi citada pela defesa de Renan como sua segunda maior fonte de renda: R$ 244.632,68.

Estadão
Reação ao cangaço no Senado


A tal ponto chegaram os abusos do presidente do Senado, Renan Calheiros, que está em vias de se consolidar na Casa, ecoando na Câmara dos Deputados, uma frente suprapartidária contra os movimentos da escória de que o político alagoano se utiliza para se servir desbragadamente do poder. Nos últimos dias, a justaposição de uma "canalhice", na expressão do senador acreano Geraldo Mesquita, do mesmo PMDB de Calheiros, com uma "sem-vergonhice sem limites", nas palavras do seu colega goiano Demóstenes Torres, do DEM, deve desencadear, a partir de hoje, ações efetivas de repúdio, compartilhadas por integrantes de siglas habitualmente adversárias, contra a transformação do Senado em "chiqueiro", no dizer do democrata - ou, o que talvez seja mais apropriado, numa caatinga onde imperam as leis do cangaço.

A "canalhice" - que chegou a enojar o próprio presidente nacional do PMDB, Michel Temer - foi a substituição sumária, na quinta-feira passada, de dois peemedebistas históricos, o pernambucano Jarbas Vasconcelos e o gaúcho Pedro Simon, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Ambos são conhecidos por sua independência diante do governo de que a sua legenda é a principal parceira e por sua insistência no afastamento de Calheiros da direção do Senado até a apuração cabal das denúncias levantadas contra ele por afronta ao decoro. Já a "sem-vergonhice" está contida na revelação, divulgada no dia seguinte na internet pelo jornalista Ricardo Noblat e detalhada na edição da revista Veja que foi às bancas sábado, de que um assessor de Calheiros, o ex-senador Francisco ("Chiquinho") Escórcio, teria tentado montar um esquema para bisbilhotar o senador tucano e ex-governador de Goiás Marconi Perillo e o já citado Demóstenes Torres.

O disparo que atingiu Vasconcelos e Simon saiu da arma do líder do PMDB, Valdir Raupp, de Rondônia. Não poderia ser de outra forma: são os líderes que, em última instância, designam os representantes partidários nas comissões do Legislativo. Mas é claro como o sol que a ordem de puxar o gatilho partiu de Calheiros. Foi um dos seus mais notórios paus-mandados, o "franciscano" mineiro Wellington Salgado, por sinal cheio de contas a acertar com a Justiça, que sugeriu a eliminação dos correligionários, num jantar na casa de Raupp, na terça-feira passada. No dia seguinte, o mesmo Salgado investiu contra Vasconcelos em plenário por apoiar o projeto de resolução pelo qual senadores envolvidos em denúncias devem se afastar dos cargos que exercerem no Senado - iniciativa motivada pelos escândalos em seqüência colados à pele de Calheiros. Não bastasse isso, o seu maior lambe-botas, Almeida Lima, de Sergipe, foi para o lugar do pernambucano.

Tampouco paira a menor dúvida sobre a origem da tentativa de espionar os dois senadores goianos, abortada pela aparente recusa do dono de um hangar em permitir que eles fossem filmados ao embarcar ou desembarcar ali. A idéia, naturalmente, era a de colher imagens comprometedoras que serviriam para chantageá-los. Chiquinho Escórcio, apontado como o operador da baixaria, teria dito ao dono do hangar, Pedrinho Abrão, na presença de dois advogados: "Renan está montando um dossiê contra os senadores que votaram a favor da cassação dele. Vamos ter de estourá-los." Perillo e Torres fazem parte do Conselho de Ética. Quando os renanzistas tentaram tornar secreta a votação sobre o primeiro dos quatro processos contra Calheiros que chegaram ao colegiado, Perillo e Torres figuraram entre os resistentes ao golpe. O alagoano, de resto, já fez saber que recorreria à chantagem para calar os adversários.

Mal haviam começado os seus problemas, tentou intimidar o pedetista amazonense Jefferson Péres, o democrata potiguar José Agripino Maia, além de Pedro Simon. Agora, ao ordenar a defenestração do gaúcho da CCJ, terá pretendido acertar dois alvos com um tiro só. Além da vingança pessoal, se tornaria credor do Planalto por remover um opositor da prorrogação da CPMF da comissão que examinará a constitucionalidade da proposta. (O mesmo vale para Vasconcelos.) Senadores de diversas siglas, entre os quais pelo menos cinco peemedebistas, já exigiram que a patifaria fosse desfeita. E estão dadas as condições para um quinto processo contra Calheiros, agora por uso do cargo em benefício próprio - uma abjeção a olho nu.

Editorial Estadão

7.10.07

Convênios suspeitos deram R$ 330 mi do governo a ONGs

Levantamento da Câmara pode servir de subsídio para CPI recém-instalada

Estudo abrange contratos feitos de 2003 a 2007 por sete ministérios; problemas foram encontrados em 860 acordos com 546 entidades

Cerca de R$ 330 milhões foram repassados pela União a 546 organizações não-governamentais por meio de convênios com indícios de irregularidades, segundo um levantamento da Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados.
O estudo analisou convênios assinados entre julho de 2003 e abril de 2007 e poderá servir de subsídio para linhas de investigação da CPI das ONGs, instalada na última quarta-feira no Senado para averiguar denúncias de desvio de recursos públicos entre 1999 e 2006.
Segundo o estudo, repasses financeiros relacionados a 860 convênios em sete ministérios desobedeceram duas normas da LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias). Uma veda as transferências de capital para obras de construção civil e aquisição de máquinas, veículos e equipamentos, entre outros, e a outra exige um mínimo de três anos de funcionamento para a entidade estar apta a receber recursos da União.
Sobre as transferências, ministérios e ONGs afirmam que os bens adquiridos são revertidos para a União, ao término dos convênios.
A LDO, segundo a consultoria da Câmara, não prevê incorporações ao patrimônio da União nas modalidades de convênios averiguadas pelo estudo.
Segundo a consultoria, as cláusulas dos convênios que prevêem as devoluções não são superiores à LDO, e os repasses não autorizados em lei podem configurar "crimes de responsabilidade e prevaricação". O espírito da lei é impedir que ONGs enriqueçam às custas do dinheiro público.
"Análise preliminar indica que o descumprimento das vedações e restrições da LDO na transferência voluntária de recursos para ONGs não está restrito apenas aos órgãos analisados", concluiu o consultor Leonardo José Rolim Guimarães, que assessorou a CPI dos Bingos em 2005.
O estudo da consultoria da Câmara apontou que ONGs foram criadas apenas meses antes da assinatura dos convênios. Isso aconteceu principalmente na esfera do Ministério do Turismo, durante a gestão do atual ministro das Relações Institucionais, Walfrido dos Mares Guia (PTB-MG).
No Turismo, 55 convênios, no valor total de R$ 11,8 milhões, foram assinados com organizações que tinham menos de três anos de registro na Receita Federal.
A "Associação dos Amigos" de uma escola de samba no Rio de Janeiro foi criada em agosto de 2006. Cinco meses depois, recebeu R$ 499 mil do ministério a título de incentivo ao turismo.
Uma ONG foi criada em agosto de 2003 em São Paulo para "atender demandas de empresas e associações em busca de certificação do projeto Fome Zero". Também cinco meses depois, assinou um convênio no valor de R$ 1,61 milhão com o Ministério do Desenvolvimento Social e do Combate à Fome.
Um centro de "inclusão social" fundado em Rio Branco (AC) em agosto de 2003 recebeu R$ 950 mil do Ministério da Ciência e Tecnologia no último dia de 2005.
De acordo com a LDO, os convênios devem trazer "declaração de funcionamento regular da entidade beneficiária nos últimos três anos, emitida no exercício de 2006 por três autoridades locais, e comprovante de regularidade do mandato de sua diretoria".
Ao todo, segundo o levantamento feito pela consultoria, R$ 37,6 milhões foram liberados pela União no decorrer de 80 convênios firmados com entidades com menos de três anos de existência.

Folha

Assessor tratou de espionagem, diz advogado

Heli Dourado afirma que foi em seu escritório que Escórcio, que trabalha com Renan, falou com empresário para filmar tucano

Assessor negou ter discutido espionagem; para senador do DEM, caso é pior que Watergate e houve quebra de decoro parlamentar


O advogado Heli Dourado confirmou à Folha que Francisco Escórcio, assessor especial do senador Renan Calheiros (PMDB-AL), tratou com o empresário Pedro Abrão de filmar e fotografar o senador Marconi Perillo (PSDB-GO) embarcando em jatinhos de empresários da região.
Segundo Dourado, Escórcio e Abrão conversaram por cerca de 45 minutos no escritório do advogado, em Goiânia. Abrão, ex-deputado pelo PMDB, é dono de hangar e da empresa Voar Aviação, em Goiânia
"Eles falaram, falaram, aí entraram nessa discussão. O Chiquinho [Escórcio] disse que o Renan estava muito preocupado, mas que a primeira votação já passou e tal. E aí o Pedrinho Abrão disse que o senador Marconi Perillo sempre saía do hangar dele e que, se [Escórcio] quisesse, podiam fotografar, filmar ele [Perillo] entrando e saindo", contou Dourado.
Conforme a Folha publicou ontem, Escórcio foi a Goiânia na segunda-feira na tentativa de espionar Perillo e Demóstenes Torres (DEM-GO). O democrata disse que Escórcio agiu a mando de Renan e que o DEM já decidiu que vai apresentar uma nova representação contra o presidente do Senado ao Conselho de Ética.
"Quebra de decoro. Esse caso é pior do que o Watergate. No Watergate, o Nixon queria espionar os passos de seus adversários politicamente. Renan, além de politicamente, ele quer espionar civilmente, criminalmente, ele quer montar dossiê", disse.
A Folha não conseguiu contatar ontem a assessoria do presidente do Senado.
Na sexta-feira, Escórcio confirmou à Folha que conversou com Abrão no escritório de Heli. Mas negou que tivessem falado sobre espionar os dois senadores. Ele disse que foi a Goiânia buscar um material sobre supostas irregularidades cometidas pelo grupo do governador do Maranhão, Jackson Lago (PDT), para repassar a um canal de TV, que teria interesse em fazer uma reportagem sobre o caso.
Ele contou que é amigo de Abrão e que, como estava em Goiânia, telefonou para ele e pediu que o encontrasse no escritório de advocacia.
"Fiz perguntas sobre o Marconi e o Demóstenes, mas sobre a conjuntura política. Não tinha nada a ver com levantar informações contra os dois. Isso não tem o menor cabimento. Ele [Abrão] deve ter confundido as coisas", disse Escórcio que já foi assessor parlamentar da Presidência da República.
Heli Dourado confirmou a versão de Escórcio e disse que foi contratado em novembro do ano passado pelo PMDB para entrar com ações contra Jackson Lago. Segundo ele, Escórcio foi a Goiânia para buscar material sobre o caso do governador maranhense.
Demóstenes Torres tem sido um dos principais opositores a Renan, desde que começaram as acusações de irregularidades contra o presidente do Senado. Tendo se livrado de uma representação no Conselho de Ética, Renan ainda enfrenta outras três por suspeita de quebra de decoro parlamentar.
Demóstenes defendeu publicamente, várias vezes, que Renan se afastasse da presidência do Senado.
Até o fechamento desta edição, a Folha não conseguiu localizar nem Marconi Perillo nem Pedrinho Abrão.
Folha

6.10.07

Raupp culpa secretária e poupa Renan no episódio


Na tentativa de aliviar a situação do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), responsabilizado pela decisão de tirar os senadores peemedebistas Jarbas Vasconcelos (PE) e Pedro Simon (RS) da Comissão de Constituição e Justiça, o líder do PMDB, Valdir Raupp (RO), investiu contra a secretária-geral da Mesa, Cláudia Lyra. Raupp acusa a servidora de agir indevidamente, não por ter concretizado a substituição dos senadores, mas por ter atuado antes de ele falar com Jarbas e Simon. "Infelizmente (ela) quebrou a confiança, não posso deixar mais nada para o dia seguinte." O líder nega que Renan tenha interferido. É desmentido pelos fatos.

Segundo testemunhas, minutos antes de os requerimentos terem sido lidos, Renan chamou Cláudia a seu gabinete. Heráclito Fortes (DEM-PI), que presidia a sessão, contou anteontem que estava para encerrar a sessão quando a secretária levou-lhe o documento, lido com o plenário vazio. "Lamento ter sido testemunha deste episódio", disse Heráclito.

Na terça-feira, em jantar na casa de Raupp, a idéia de retirá-los da CCJ tinha sido sugerida por Wellington Salgado (PMDB-MG), da tropa de choque de Renan. Na quarta, na reunião da CCJ, Salgado acusou Jarbas de promover "um golpe", ao relatar o projeto de resolução que determina o afastamento de senadores envolvidos em denúncias dos cargos da Casa. Ninguém no Senado duvida que Salgado, também desta vez, atuou por orientação de Renan.

Raupp tenta passar a idéia de que a servidora - à revelia de Renan - resolveu que Heráclito deveria atrasar o encerramento dos trabalhos até que os requerimentos fossem lidos. Cláudia tem quase 30 anos de Senado e o fato de sempre ter sido fiel a seus superiores desmonta a tese de que teria agido por conta própria.

Mas, para Raupp, a culpada foi mesmo a servidora. "Eu tinha de tomar a decisão mais cedo ou mais tarde porque os senadores não votam com a orientação do partido. Mas antes queria conversar com eles." O líder disse não entender a solidariedade recebida por Jarbas e Simon. "Só porque são da oposição não se pode mexer?" E comparou os dois a seus filhos. "Pesa, dói no coração, mas você tem de dar puxões de orelha nos seus filhos."

Rosa Costa para Estadão
Laranjada em Roraima
Marcelo Carneiro Romero Jucá, Atual Líder do Governo No Senado

Romero Jucá, atual líder do governo no Senado, está na vida pública desde a década de 80. Nesse período, sua carreira foi marcada por duas características: a freqüência com que troca de partido – já foi do PFL, do PSDB e hoje está no PMDB – e a incrível capacidade de envolver-se em negócios mal explicados. Em especial, sociedades em emissoras de rádio e televisão. Já em 1999, então vice-líder tucano no Congresso, ele foi acusado de ter se apropriado de um canal, a TV Caburaí, dado pelo governo federal a uma fundação cultural de Roraima. A reportagem que trouxe o assunto à tona, publicada por VEJA, é um fantasma que até hoje assombra o senador. Volta e meia Jucá se vê cobrado a dar explicações sobre essa história. Em 2005, em uma nova acusação, descobriu-se que a tal fundação arrendou a emissora para uma produtora controlada pelos filhos de Jucá. O senador, porém, continua a negar que tenha qualquer vínculo com o canal. Agora, o líder do governo Lula está às voltas com uma nova suspeita: a de que, além de continuar à frente da Caburaí, é dono de outros dois veículos de comunicação em Roraima: a TV Imperial e a Rádio Equatorial, ambas adquiridas por meio de laranjas. O autor da acusação é um desafeto político, o deputado federal Marcio Junqueira (DEM-RR). Só isso, porém, não implica que a acusação deva ser descartada como leviana. Os elementos que tornam a acusação do adversário de Jucá passível de investigação estão nos parágrafos seguintes.

No papel, a TV Imperial e a Rádio Equatorial estão hoje sob o controle formal de Antonio Emílio Saenz Surita, apresentador do programa Pânico na TV. Surita é cunhado de Jucá – sua irmã, Tereza, é casada com o senador. A entrada do apresentador no negócio se deu em 8 de julho de 2005. Nesse dia, o médico Juan Sragowicz, residente nos Estados Unidos e detentor de mais de 90% das cotas das duas emissoras, lavrou no Consulado do Brasil em Miami uma procuração dando plenos poderes a Surita. Pelo documento, o cunhado de Jucá pode "vender, comprar, fazer cessão" ou até mesmo "doar" todas as cotas que pertencem a Sragowicz. Quatro dias depois de lavrada essa procuração, Surita assinou um documento em que repassa a administração da TV Imperial e da Rádio Equatorial ao advogado Alexandre Matias Morris. A entrada de Morris no negócio chama atenção por uma peculiaridade: ele também é o administrador da TV Caburaí – aquela que todo mundo em Roraima diz pertencer a Romero Jucá, mas o senador jura que não é dele. A Caburaí e a Imperial são, respectivamente, retransmissoras dos canais Bandeirantes e Record em Boa Vista, a capital do estado. Isso quer dizer que Morris consegue dar expediente em duas emissoras que disputam audiência e publicidade na mesma cidade. Há outro dado intrigante no currículo de Morris. Por um brevíssimo período (entre fevereiro e março de 2004), o advogado ocupou um cargo no gabinete de Jucá no Senado.

Foto Edmilson Junior
Fachada da TV Caburaí: em 1999, VEJA já tinha relatado operações irregulares que levaram Jucá a ter controle sobre outra emissora

O deputado Marcio Junqueira, que apresentava o principal programa da Equatorial – espaço sempre preenchido com críticas ao senador e à sua mulher, então prefeita de Boa Vista –, diz que a rádio e a TV foram vendidas a Jucá por 600.000 reais. Junqueira relata que a negociação teve lugar em um hotel de São Paulo. Teriam participado do encontro o próprio Jucá e um intermediário de Juan Sragowicz. "O Romero tomou o controle da rádio e a primeira coisa que fez foi impedir a minha entrada na sede da emissora", diz Junqueira, que move na Justiça uma ação contra a transferência de controle da Equatorial. Em 2005, a rádio já tinha um caminhão de dívidas com o governo federal. Hoje, os débitos chegam a 900.000 reais. Se o que Junqueira afirma for verdade, Jucá, que na ocasião era ministro da Previdência, tornou-se sócio oculto de uma rádio que deve quase 1 milhão de reais à União.

VEJA apresentou a documentação das duas emissoras e declarações de renda do senador a dois advogados especializados em legislação de telecomunicações. Na opinião desses especialistas, há duas razões para que Jucá não tenha registrado em seu próprio nome as empresas.

Ana Araujo
O denunciante: Marcio Junqueira diz que Jucá o afastou da rádio

• A atual lei de telecomunicações impede que parlamentares tenham a direção ou a gerência de empresas de radiodifusão, caso da Equatorial. Como o negócio envolveu 90% das ações da rádio, o poder de gerência – e ingerência – do sócio majoritário é evidente. Daí a necessidade de apelar para o uso de laranjas.

• Em 2006, quando concorreu ao governo de Roraima, Jucá apresentou uma declaração de bens em que seu patrimônio era de pouco mais de 512.000 reais. Já que, de acordo com o deputado Marcio Junqueira, as emissoras foram compradas por 600 000 reais, o senador não teria como explicar à Receita Federal de onde saíram os recursos para a transação.

Há, ainda, um terceiro problema. A transferência de controle acionário não foi comunicada previamente ao Ministério das Comunicações, como prevê a legislação. Procurado por VEJA, Surita diz que isso não ocorreu porque ele não é o dono da rádio. "Eu estava interessado em comprá-la e recebi a procuração para que pudesse tomar pé da situação da empresa. Como ela tem muitas dívidas, não concretizei o negócio", afirma Surita. O apresentador do Pânico só não consegue explicar por que a procuração continua em vigor. E por que o administrador nomeado por ele permanece como manda-chuva da emissora. Jucá, por meio da assessoria de imprensa, diz que apenas apresentou seu cunhado a Juan Sragowicz. Também afirma que não é dono de nenhuma emissora em Boa Vista. É impressionante. Só falta dizer que a dona das TVs e da rádio é a mulher-samambaia, colega de Surita no Pânico.

Fotos Adriano Machado/AE; Edmilson Junior e Maurício Piffer/AE
Jucá (à esq.) e a sede da Rádio Equatorial: depois que o controle da emissora e da TV Imperial foi para o cunhadão Surita, este deu poderes de administrador a um ex-assessor do senador


O jogo sujo de Renan Calheiros

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Para salvar seu mandato, o senador Renan Calheiros já usou a tática de constranger e ameaçar colegas do Parlamento com a divulgação de informações supostamente comprometedoras. Fez isso com dois respeitáveis senadores, Pedro Simon e Jefferson Peres, transformando-os em alvos de boatos sórdidos. Repetiu a fórmula com os petistas Tião Viana e Ideli Salvatti, aliados fiéis que pensaram em se rebelar contra a permanência dele no cargo e acabaram acuados por denúncias de irregularidades. Às vésperas de enfrentar três outros processos no Conselho de Ética, Renan Calheiros é flagrado em outro movimento clandestino e espúrio: a espionagem de senadores. VEJA apurou que Calheiros montou um grupo de arapongas e advogados para bisbilhotar a vida de seus adversários. Na mira estão dois dos principais oponentes do presidente do Congresso: o tucano Marconi Perillo e o democrata Demostenes Torres. Ambos tiveram a vida privada devassada nos últimos três meses. A ousadia chegou ao ponto de, há duas semanas, os arapongas planejarem instalar câmeras de vídeo em um hangar de táxi aéreo no Aeroporto de Goiânia para filmar os embarques e os desembarques dos parlamentares. O objetivo era tentar flagrar os senadores em alguma atividade ilegal para depois chantageá-los em troca de apoio. O plano só não foi em frente porque o dono do hangar não concordou em participar da operação.

O grupo de espionagem é comandado pelo ex-senador Francisco Escórcio, amigo, correligionário e assessor direto de Renan Calheiros. No dia 24 passado, o assessor se reuniu em Goiânia com os advogados Heli Dourado e Wilson Azevedo. Discutiram uma estratégia para criar uma situação que comprometesse os senadores Perillo e Demostenes. "Vamos ter de estourá-los", sentenciou Escórcio. Um dos advogados disse que a melhor maneira de constranger os senadores oposicionistas era colher imagens deles embarcando em jatos particulares pertencentes a empresários da região. Um dos presentes lembrou que os vôos eram feitos a partir do hangar da empresa Voar, cujo proprietário é o ex-deputado Pedro Abrão, um ex-peemedebista. Na mesma noite, Abrão foi convidado a ir a um escritório no centro de Goiânia. Lá, na presença dos advogados, ouviu a proposta diretamente de Francisco Escórcio: "Nós precisamos de sua ajuda para resolver um problema para Renan", disse Escórcio. Os dois já se conheciam do Congresso Nacional. "Queremos instalar câmeras de vídeo para gravar Perillo e Demostenes usando seus aviões." E completou: "Quero ver a cara deles depois disso, se eles (os senadores) vão continuar nos incomodando". Abrão ouviu a proposta e ficou de estudar. Depois, preocupado, narrou o estranho encontro a um amigo.

Ex-governador de Goiás, Perillo está em seu primeiro mandato. Na reta final do processo que investigava o envolvimento de Calheiros com o lobista de empreiteira, foi Perillo que apresentou a tese vencedora de que o voto no Conselho de Ética deveria ser aberto. Já Demostenes Torres, ex-promotor público, é hoje um dos mais destacados parlamentares da oposição. Não é a primeira vez que ele, titular do Conselho de Ética, é vítima de arapongas. Em junho passado, logo depois das primeiras denúncias contra Calheiros, Demostenes foi um dos primeiros a defender com veemência a instalação do processo por quebra de decoro. Os arapongas de Renan passaram a investigá-lo desde então. Sem cerimônia, estiveram na cidade de Rio Verde, no interior de Goiás, onde moram pessoas próximas a Demostenes. Lá, procuraram amigos e amigas que já fizeram parte da intimidade do senador. Uma dessas pessoas chegou a receber uma oferta para gravar um depoimento. Os arapongas se apresentavam como advogados, tinham sotaque carregado e, ao que parece, estavam muito interessados em fazer futrica. Não escondiam que o objetivo era intimidar o senador.

Na semana passada, Demostenes Torres e Marconi Perillo foram procurados por amigos em comum e avisados da trama dos arapongas de Renan. Os senadores se reuniram na segunda-feira no gabinete do presidente do Tribunal de Contas de Goiás, onde chegaram a discutir a possibilidade de procurar a polícia para tentar flagrar os arapongas em ação. "Essa história é muito grave e, se confirmada, vai ser alvo de uma nova representação do meu partido contra o senador Renan Calheiros", disse o tucano Marconi Perillo. "Se alguém quiser saber os meus itinerários, basta me perguntar. Tenho todos os comprovantes de vôos e os respectivos pagamentos." Demostenes Torres disse que vai solicitar uma reunião extraordinária das lideranças do DEM para decidir quais as providências que serão tomadas contra Calheiros. "É intolerável sob qualquer critério que o presidente utilize a estrutura funcional do Congresso para cometer crimes", afirma Demóstenes.

Francisco Escórcio foi contratado em novembro do ano passado pelo senador Calheiros como assessor técnico da Presidência. Antes, trabalhou com o ex-ministro José Dirceu no cargo de assessor especial da Casa Civil. Despacha em uma sala a poucos metros de Renan e ganha um salário de 9.301 reais. O que ele faz? "Faço o que Renan me mandar fazer", disse a VEJA. Escórcio, o advogado Heli Dourado e seu sócio Wilson Azevedo foram ouvidos simultaneamente sobre o plano para bisbilhotar os senadores. Escórcio afirmou que esteve em Goiânia no dia 24 "para pegar umas fotos", que se reuniu com o advogado Heli Dourado e "outras pessoas" num escritório e que, por acaso, o empresário Pedro Abrão "apareceu por lá e eu até disse que ele estava bem magrinho". Heli Dourado confirma que esteve reunido com Escórcio "para discutir um processo judicial de interesse da família Sarney" e garante que "Pedro Abrão não participou da conversa". Wilson Azevedo, seu sócio, diz que "esteve com Escórcio há uns dez dias num encontro informal" e que não vê Pedro Abrão "há uns seis anos". Pedro Abrão, por sua vez, confirma que os senadores usam seu hangar, que conhece os personagens citados, mas que não participou de nenhuma reunião. O empresário, que já pesou mais de 120 quilos, fez uma cirurgia de redução de estômago e está bem magrinho, como disse Escórcio. Renan Calheiros não quis falar.

Policarpo Junior e Otávio Cabral para Veja
Com reportagem de Alexandre Oltramari

4.10.07

Um símbolo esquecido


Guaribas (PI) — Uma cidade que vive de esperar. Por melhorias na educação, na saúde, no saneamento básico. Mas, principalmente, por uma visita do presidente da República. No município-piloto do programa Fome Zero, localizado a 650km da capital, Teresina, dorme-se e acorda-se na expectativa de que Luiz Inácio Lula da Silva apareça. “Lula, nos acuda. O povo do Fome Zero está morrendo à míngua. Venha ver nós (sic). A sua cidade está acabada.”

O apelo é de Orlando Rocha, 65 anos. Na época do lançamento do programa, em 2003, ele esteve em Brasília. Fez propaganda, apareceu em todos os jornais. Hoje, sente-se esquecido. “Eu sei que o ‘Lulinha’ acha que aqui está tudo uma maravilha. Você, que é de Brasília, pede pra ele aparecer aqui”, diz Carmelita. A agricultora aposentada conta que gostaria de escrever uma carta ao presidente. “Mas a gente não sabe escrever, não. Na época do Fome Zero, a gente fez curso de alfabetização. Só aprendemos a assinar o nome”, explica Elza Rosa, cunhada de Orlando.

Quase cinco anos depois de sair do obscurantismo para ganhar destaque no país como símbolo de investimento na área social, Guaribas ainda depende das aposentadorias e do cartão Bolsa Família. No ano passado, a prefeitura cancelou 30% dos cartões concedidos. De acordo com a Secretaria de Assistência Social do município, havia cadastros duplicados. Mesmo assim, 77,3% da população ainda recebe o Bolsa Família.

A economia local está estagnada. A produção agrícola, no ano passado, limitou-se à colheita de feijão, arroz com casca, milho e mamona, o que rendeu R$ 459 mil ao município. Menos da metade do total arrecadado no mesmo período em Manari (PE), cidade com pior Índice de Desenvolvimento Humano do país, que produziu, na agricultura, R$ 991,2 mil.

O comércio formal também não se desenvolveu. Estabelecimentos funcionam dentro de casas, sem registro nem trabalhadores com carteira assinada. O arrimo vem da prefeitura, que emprega cerca de 130 pessoas, incluindo 93 professores.

Abandono
“Se não fossem os velhos e o cartão, isso aqui estava acabado”, constata Ronilio Dias da Rocha, 22 anos. O jovem, que tinha 17 na época do lançamento do Fome Zero, não acredita mais no desenvolvimento da cidade. Com baixa escolarização — ele não chegou a terminar o ensino fundamental — Ronilio decidiu migrar para São Paulo. “Aqui não dá não, não tem meio de vida”, justifica.

As taxas de abandono escolar estão em alta desde 2001. Em todas as séries do ensino fundamental, mantido pela rede municipal, houve aumento da evasão (leia quadro). Apesar dos dados, disponibilizados pelo Ministério da Educação, em Guaribas, ninguém assume que está fora da escola. É o medo de perder a bolsa. A Secretaria Municipal de Educação diz desconhecer os dados do MEC e, sem apresentar documentos, informa que a evasão aumentou 0,5% no ano passado.

Mãe de duas crianças com idades de 5 e 9 anos, Paula Mathias da Silva, 34 anos, garante que os meninos estudam. Mas, no ano passado, teve o cadastro cancelado. “Eu não sei o motivo não. Só sei que os R$ 50 que eu recebia fazem falta. A gente só não passa fome por causa da aposentadoria do meu marido”, conta. A enteada, Rosângela Dias da Rocha, 28, também perdeu o benefício. “Trabalho na roça e neste ano a seca matou toda a produção. Não tenho de onde tirar dinheiro. Eu faço só chorar”, conta a jovem. Ela diz que só não passa fome porque ganha ajuda do pai, Osvaldo Lopes da Rocha, 57, que recebe R$ 380 mensais de aposentadoria.

O Correio tentou entrar em contato várias vezes com o prefeito de Guaribas, Ercílio Matias (PTB). No dia em que a reportagem esteve na cidade, em 19 de setembro, ele havia viajado para Teresina. Nas outras tentativas, por telefone, o celular estava desligado. Funcionários da Prefeitura informaram que Ercílio Matias estava viajando pelo interior do estado, sem acesso a celular.

Falhas admitidas
O secretário de Educação e Cultura do governo do Piauí, Antônio José Medeiros, reconhece que os índices do estado são os piores do país. “Os baixos índices do Piauí são históricos. Nossa esperança era reverter esse quadro nos últimos quatro anos, mas não conseguimos. Avançamos nas condições estruturais, mas não houve avanço na qualidade do ensino, no desenvolvimento dos alunos. Nem na geração de emprego e renda”, diz o secretário. Eleito em 2002, o governador Wellington Dias (PT) ganhou novamente as eleições no ano passado.

Segundo Medeiros, os desafios do segundo mandato serão a melhoria da educação. Entre as medidas previstas, estão o controle da evasão, com visitas às casas dos alunos faltosos, as aulas de reforço escolar aos sábados para os alunos ameaçados de reprovação e a ampliação da carga horária, de cinco para seis horas por dia.

O secretário de Educação lembra que a gestão do ensino fundamental é responsabilidade do município e diz que, em março deste ano, o governo construiu em Guaribas a Unidade Escolar Paulo Freire, voltada ao ensino médio e à educação de jovens e adultos, equipada com biblioteca, laboratório de ciências e antena parabólica. Hoje, a escola atende a 180 alunos. O estado também capacitou seis agentes comunitários, que acompanham a freqüência dos estudantes. A cidade fará parte do programa “Viva o Semi-Árido”, que capacita professores das redes municipal e estadual.

À espera de Lula

Moradores reclamam de problemas e pedem ajuda, mas tratam presidente da República como ídolo
Guaribas (PI) – “Papai Lula veio pra tirar a gente dessa escravidão, desse pé de serra, onde a gente tinha de passar pelo meio das cobras para buscar água com aqueles potes pesados na cabeça. Ele e o Wellington.” É com adoração que Eudália da Rocha, 60 anos, fala sobre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e do governador do Piauí, Wellington Dias (PT). “Mas o governo que não tirava nossa Guaribas da boca, agora não fala mais da gente”, lamenta a agricultora, que se aposentou no ano passado e ganha R$ 380 por mês. Até então, sobrevivia dos R$ 80 do Bolsa Família e da pequena produção agrícola nos fundos do barraco onde mora com mais cinco pessoas, incluindo netos, um filho e a nora.

Uma das principais reclamações de Eudália é a poeira. Em frente à sua casa, na parte velha da cidade, como é chamada pelos moradores, não há pavimentação. “A gente engole pó o dia todo. Sou nascida e criada em Guaribas. Tem gente que não é daqui e já mora em rua asfaltada”, diz. “Já pavimentamos 3.750 metros quadrados, sendo que 2.250 foram calçados pelo estado. As pessoas vão sempre querer mais e estão certas”, afirma o secretário de Cidades do Piauí, Flávio Nogueira.

Isaías Conrado Alves, 66 anos, é um dos poucos moradores de Guaribas que não fazem questão de ver o presidente Lula de perto. “Não votei nele mesmo. Ele precisa saber que não é só dar dinheiro para o povo, não. Tem que melhorar as coisas, dar emprego para as pessoas”, cobra.

A casa de Isaías é uma das mais pobres do município. De taipa e chão batido, possui apenas um cômodo. O fogão a lenha, construído no quintal, não tem muito o que cozinhar. Isaías, que mora com a mulher, Maria Mendes de Moraes, 61, ainda não conseguiu a aposentadoria rural e sobrevive da pequena roça que, este ano, não vingou por causa da seca. “Só fiz chorar. O sol matou o milho, o feijão”, conta. Também recebe R$ 50 do Bolsa Família. “É pouco, só dá para uma comprinha. Dá para comprar um saco de arroz, um de farinha e três latas de óleo”, diz.

Comida ou telhas
“A ajuda que eu tenho é de Deus”, afirma o agricultor José Arismar Ferreira, 51 anos, mais conhecido como Chico do Lago do Baixio, comunidade onde mora, pertencente a Guaribas. Pai de cinco filhos, um deles com síndrome de Down, ele diz que a vida “é só de sofrimento”. A casa, construída com dificuldades, está com telhado incompleto e não tem porta. “Faço um mês sim, outro não. Ou a gente come ou compra telha”, conta.

O sonho de Chico é ver a água encanada chegar à comunidade, onde existe apenas uma cisterna. E ter acesso a um telefone público. Quando precisa ligar para o filho mais velho, que mora em Santa Luz (PI), ele anda 7km até Guaribas. Vai e volta a pé. O agricultor, que há três anos perdeu uma filha de 18, morta por desnutrição e anemia, segundo ele, conta que uma das poucas alegrias é ver as outras crianças, Daniel e Derlieide, na escola que funciona no vilarejo.

O secretário Flávio Nogueira diz que a infra-estrutura de Guaribas e dos nove povoados do município vai melhorar. “Estamos construindo uma unidade de saúde, construindo mais uma escola e duas lanchonetes, como opção de lazer aos moradores”, diz. A água encanada, garante Nogueira, será ampliada para os vilarejos que dependem exclusivamente de cisternas. Chico do Baixio aguarda pelo encanamento. E pela visita de Luiz Inácio Lula da Silva. “A vontade do Lula é vir aqui. Tenho certeza de que ele tá pensando que aqui tá bom mesmo. Mas não tá.”
Correio Brasiliense

Exaustão


Dora Kramer


A ameaça do senador Almeida Lima de distribuir "sapatadas" aos adversários, feita no Conselho de Ética, na terça-feira, e a intervenção do suplente Wellington Salgado ontem, na Comissão de Constituição e Justiça, acusando o senador Jarbas Vasconcelos de imprimir "mau cheiro" ao Senado, dão a medida da profundidade do poço que Renan Calheiros cava para enterrar a instituição.

O líder do PSDB, Arthur Virgílio, fez um desabafo eloqüente sobre a exaustão da Casa com o processo de desmoralização. Apontou a deformação de os senadores precisarem se afirmar éticos a cada instante - visto ser este um pressuposto básico na vida de qualquer cidadão, notadamente dos detentores de mandato público -, mas seu argumento foi atropelado por um sofisma da líder do PT, Ideli Salvatti, segundo o qual "a ética não pode ser o centro de tudo".

Não era sobre isso que falava Virgílio. Mas a petista, junto com Salgado e Almeida integrante da tropa de choque do presidente do Senado, aproveitou para patrocinar uma espécie de "Cansei" da ética.

O tema, de fato, não deveria tomar os espaços de debate e decisões do Senado.

Só tem tomado exatamente pela carência de ética na conduta do presidente da Casa. Sustentado por ela e tantos outros - inclusive oposicionistas hoje arrependidos - que não tiveram o tirocínio de perceber com quem lidavam e acreditaram que camaradagem substitui venalidade. Não substitui. Daí o Senado hoje pagar o preço de sua falta de percepção.

Santo nome em vão


Dora Kramer


Antes mesmo de o Supremo Tribunal Federal se pronunciar sobre a posse dos mandatos de deputados e vereadores, os parlamentares já se movimentam para providenciar uma dita anistia, com a finalidade de tornar inócua a decisão do STF, se desfavorável a eles.

A inquietação dos deputados se baseia na expectativa de que os ministros do Supremo se manifestem majoritariamente em favor da propriedade dos partidos, na prática tomando posição contra a possibilidade de um candidato se eleger por uma legenda e migrar para outra sem nenhuma justificativa de caráter doutrinário, só para ver atendidos interesses por ele pretendidos depois de conquistado o mandato.

Recorrem ao conceito de anistia, cuja definição é a seguinte: "Ato pelo qual o poder público declara impuníveis, por motivo de utilidade social, todos quantos, até certo dia, perpetraram determinados delitos, em geral políticos, seja fazendo cessar as diligências persecutórias, seja tornando nulas e de nenhum efeito as condenações".

Observa-se, pelo significado, como o santo nome da anistia, um ato de pacificação, é invocado em vão no caso dos trânsfugas.

Pretenderiam ser perdoados lançando mão de um instrumento cujo uso se justifica quando há motivação de "utilidade social", enquanto as razões que os mobilizam são de cunho meramente pessoal.

Eles mesmos reconhecem isso quando alegam que mudaram de partido e não podem ser punidos porque o eleitor deu o voto a cada um deles, pessoalmente.

A intenção de anistia é totalmente contraditória com o conteúdo da discussão, que não trata diretamente sobre fidelidade partidária nem sobre perda de mandato, embora estas sejam as conseqüências contidas na decisão a ser tomada.

O STF fala sobre algo bastante conhecido da sociedade em geral e dos políticos em particular e, nesse assunto, se "utilidade social" há, ela reside justamente na necessidade de imposição de alguma restrição à liberalidade com que os candidatos usam os partidos - ora para se eleger, ora para ter acesso a vantagens oferecidas pelos agentes de cooptação.

Não faz o menor sentido a alegação dos parlamentares de que desconheciam a regra do jogo. A Justiça Eleitoral não criou norma alguma nem o Supremo criará. Não legislam ou usurpam poderes, como se chegou a alegar.

Apenas examinam uma realidade posta desde que esses partidos se entendem por gente e a respeito da qual não podem alegar desconhecimento porque não fazem outra coisa a não ser tentar tirar dela o máximo de vantagens possíveis.

1.10.07

CPI das ONGs quer investigar denúncia que envolve Ideli

A CPI das ONGs deve ser instalada quarta-feira no Senado e a oposição já quer apurar pelo menos um caso concreto que pode dar dor de cabeça ao Planalto, envolvendo a líder do PT na Casa, Ideli Salvatti (SC). São denúncias de fraudes na Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar da Região Sul (Fetraf-Sul).A entidade, que recebeu R$ 5,2 milhões entre 2003 e 2007 da União, é acusada pelo Ministério Público de desviar dinheiro público que deveria ser usado para formar e qualificar mão-de-obra na área rural.Reportagem publicada pela revista "Veja" liga os principais envolvidos na fraude à senadora. Ideli não nega a ligação, mas afirma desconhecer quaisquer irregularidades.Em nota, disse que é "natural" sua ligação com lideranças da agricultura familiar, já que tem pautado sua atuação política em defesa do setor. Por isso, ela destaca que manteve relações com diversas entidades da área e prefeituras. Disse que só apresentou emendas para favorecer a agricultura familiar.Para Ideli, "definitivamente isso não implica que eles tenham qualquer participação em supostas ilegalidades perpetradas para o desvio de recursos públicos".Cotado para assumir a presidência da CPI, o senador Raimundo Colombo (DEM-SC), adversário político da petista em Santa Catarina, diz que casos como esse serão alvo das investigações na comissão. "O que não pode é essas ONGs, financiadas com dinheiro público, não serem fiscalizadas."Comedido, o senador Valter Pereira (PMDB-MS), que deverá assumir a relatoria da CPI, ressalta que "é arriscado fazer juízo de valor antes de se iniciar qualquer investigação". Mas ele admite que a nova CPI "desagradará a muita gente" e que caberá à oposição oferecer as denúncias que serão apuradas.A Polícia Federal investigou 18 convênios firmados entre a federação e os ministérios do Desenvolvimento Agrário, do Trabalho, da Agricultura e da Pesca por meio dos quais a entidade recebeu os recursos.Pelo menos uma parte desse dinheiro teria sido usado para financiar campanhas políticas do PT, segundo a denúncia. Na prestação de contas, a Fetraf teria simulado lista de presença em cursos, maquiado despesas e organizado um caixa dois.Segundo a denúncia, o esquema reúne parlamentares, dirigentes de entidades com influência política para negociar convênios com órgãos públicos, e funcionários em postos-chave nos ministérios.No caso específico da Fetraf-Sul, destaca-se o fato de a entidade ter sido criada em 2001 por petistas ligados à senadora e ganhado importância no governo Lula.Em um dos convênios, assinado em 2003 com o Desenvolvimento Agrário, a Fetraf-Sul teria recebido R$ 1 milhão para treinar trabalhadores rurais em Chapecó. No entanto, a federação forjou lista de presenças com alunos fantasmas.O coordenador da entidade na época em que a maioria dos convênios que aparecem com irregulares era Dirceu Dresch, hoje deputado estadual pelo PT e ex-coordenador de campanhas de Ideli.
Folha