Renan levanta dados sobre despesas de todos os senadores
Gasto com verba indenizatória, às vezes atestado com nota fria, serviria de munição contra adversários do senador
A direção do Senado produziu nos últimos meses um raio X dos gastos oficiais de todos os senadores. O dossiê começou a ser feito após as primeiras denúncias contra o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) no Conselho de Ética. O diretor-geral do Senado, Agaciel da Silva Maia, pediu à Secretaria de Controle Interno uma cópia, em papel, da prestação de contas da verba indenizatória de todos os 81 senadores. Na papelada, estão as despesas feitas pelos parlamentares e as respectivas notas que, pelo menos em tese, comprovam como o dinheiro foi gasto. A verba indenizatória, de R$ 15 mil, é mensal, mas a explicação para os gastos é entregue a cada três meses.
<Veja especial sobre o caso Renan
O movimento do diretor-geral fez parte de uma série de ações organizadas por Renan para intimidar os colegas que ameaçam votar a favor de sua cassação. As informações obtidas por Agaciel serviriam como munição porque, em muitos casos, as notas apresentadas seriam frias, indicariam gastos incompatíveis ou inapropriados. Nas mãos de Renan e de sua tropa de choque, o rol de supostas irregularidades representaria o aumento de poder de barganha e intimidação perante os senadores flagrados em deslizes.
A produção do dossiê foi confirmada ao Estado ontem por três pessoas. Elas contaram que Agaciel teria agido a mando de Renan. Da Espanha, o diretor-geral telefonou ontem para um funcionário da secretaria, que seria amigo do senador Demóstenes Torres (DEM-GO), para saber se o parlamentar havia dito algo especial.
“Sei que você é amigo do Demóstenes. Gostaria de saber se ele te pediu alguma coisa”, teria dito o diretor-geral ao funcionário, segundo relato de pessoas que presenciaram a conversa. O servidor negou: “Sou funcionário do Senado Federal.”
NOTAS
Ainda da Europa, Agaciel enviou uma nota, lida em plenário pelo primeiro vice-presidente da Casa, senador Tião Viana (PT-AC), na qual diz que os funcionários do quadro permanente do Senado “têm seu procedimento administrativo regulado por lei, sendo seu dever acatá-la de forma plena, sem qualquer espaço para ações informais, não previstas no quadro de funções administrativas”. E prossegue: “No que se refere à prestação de contas, destacamos não haver nada a ser investigado, uma vez que todas as despesas do Senado são realizadas dentro da estrita legalidade e auditadas pela Secretaria de Controle Interno e pelo Tribunal de Contas da União (TCU).”
A preocupação de Agaciel de se antecipar na defesa do sigilo das contas não surpreendeu os senadores. Vários confirmaram a suspeita de que havia vazamento da prestação de contas de colegas. O primeiro sinal de que o rastreamento havia sido feito foi emitido por Renan em 12 de setembro, data de sua absolvição no primeiro processo de cassação. Na sessão secreta, ele fez ameaça direta ao senador Pedro Simon (PMDB-RS).
Encarando Simon, Renan disse que, se quisesse misturar o público com o privado, teria contratado a produtora da jornalista Mônica Veloso - com quem teve uma filha e se tornou pivô da primeira denúncia contra ele. Simon teria apresentado notas de produtora para justificar parte de seus gastos referentes à verba indenizatória.
Renan fez outras ameaças. Ao todo, já levantou suspeitas sobre dez colegas. Um parlamentar resumiu assim a estratégia do presidente do Senado: “Ele está utilizando a tática do gambá: espalhando mau cheiro para todo lado na tentativa de igualar todos.” São alvos de Renan: José Agripino Maia (DEM-RN), Tião Viana (PT-AC), Pedro Simon (PMDB-RS), Ideli Salvatti (PT-SC), Jefferson Péres (PDT-AM), Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE), Aloizio Mercadante (PT-SP), Serys Slhessarenko (PT-MT), Demóstenes Torres (DEM-GO) e Marconi Perillo (PSDB-GO).
Como se tivesse um serviço particular de inteligência, Renan recolheu contra cada um deles indícios - verdadeiros ou não - de irregularidades para constrangê-los. No PT, a desconfiança é de que ele esteja sendo orientado e aconselhado pelo deputado Jader Barbalho (PMDB-PA). Jader já foi presidente do Senado e renunciou ao mandato para escapar de cassação.
RENDA
Apesar de buscar dados sobre o uso da verba indenizatória pelos colegas, Renan também se complicou com esse assunto, ao se defender da primeira denúncia - de ter contas pessoais pagas por um lobista. Ele citou a verba para inflar seus vencimentos.
Só que essa verba não é renda e sim ressarcimento de despesas - como aluguel e combustíveis - para o exercício do mandato no Estado de origem. Além disso, é paga mediante a apresentação de notas e não é tributável. A verba indenizatória, em 2006, foi citada pela defesa de Renan como sua segunda maior fonte de renda: R$ 244.632,68.
Estadão
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