20.12.05

Que pena!

BENJAMIN STEINBRUCH

Domingo já é Natal. Lá se vai 2005. Se fosse possível fotografar o ano vivido pelo Brasil, o país teria dois retratos distintos.
O primeiro retrato, positivo, mostraria um país que vai terminar o ano com o maior superávit comercial da história, superior a US$ 40 bilhões. Apesar do real valorizado, as exportações ficarão perto de US$ 120 bilhões, um recorde, e a conta corrente externa terá saldo positivo em torno de US$ 15 bilhões. A dívida externa mostrará declínio e ficará no menor valor desde 1996 -era de US$ 183 bilhões em setembro passado. Sob aplauso internacional, o governo vai liquidar, até 31 de dezembro, toda a sua dívida com o FMI (Fundo Monetário Internacional), de US$ 15,5 bilhões. Pela primeira vez em oito anos, o país está dizendo ao mundo que pode caminhar com as próprias pernas em matéria de balanço de pagamentos. Não precisa mais da ajuda de ninguém para pagar suas dívidas para os credores externos.
O segundo retrato, negativo, revelaria um país encabulado com a crise política, que fulminou algumas das suas maiores lideranças, e, na área econômica, indignado com a mesquinhez de políticas inexplicavelmente ortodoxas.
Entre os quatro grandes países emergentes, que têm as maiores condições de ascender ao Primeiro Mundo até meados do século 21, o Brasil será a maior decepção do ano, com crescimento de apenas 2,5% no PIB (Produto Interno Bruto). A China deve crescer mais de 9%. A Índia, 8%. A Rússia, pelo menos 6%. Na relação semanalmente publicada pela revista "The Economist", que inclui 32 países considerados emergentes, o Brasil é o último colocado em matéria de crescimento econômico no terceiro trimestre de 2005.
Que pena! Não dá para achar que todos os outros países estão errados e que o Brasil está certo. É óbvio que a política monetária equivocada, que manteve a taxa de juros em níveis absurdamente altos durante todo o ano, foi a principal responsável por esse desastre. Ainda na semana passada, quando todo o mercado já estava preparado para uma redução de pelo menos 0,75 ponto na taxa básica de juros, o Banco Central insistiu na condução conservadora e cortou apenas 0,5 ponto.
Não há nenhuma ameaça no horizonte previsível para justificar esse conservadorismo. A inflação está comportada e declinante. A economia norte-americana cresce a todo o vapor. O Banco Central dos Estados Unidos já sinalizou com o fim do ciclo de elevação das taxas de juros. Os preços do petróleo estão em baixa. Não há ameaças de guerras que possam traumatizar a economia. Para decepção de todos, nem a iminência do período eleitoral de 2006, em que o crescimento poderia ser bandeira de campanha, tirou a autoridade monetária de sua posição medrosa.
Que pena! Falta aos condutores da política econômica a sensibilidade para perceber o óbvio: que o crescimento da economia é a única maneira para promover a ascensão de uma vasta camada da população brasileira ainda vitimada pela pobreza.
Li, em novembro, uma reportagem sobre o Vietnã, país dizimado por décadas de guerras até os anos 70 e que vive sob um regime socialista e fechado, fora do contesto do capitalismo ocidental. Mesmo assim, a economia desse sofrido país asiático vem crescendo a taxas médias de 7% ao ano nos últimos 12 anos. Resultado: a população que vive abaixo da linha da miséria caiu de 58% do total em 1993 para 20% no ano passado. Ou seja, cerca de 32 milhões de seus 84 milhões de habitantes saíram da miséria em pouco mais de uma década.
É uma lástima terminar o ano na lanterna do ranking do crescimento entre os países emergentes e constatar que as oportunidades abertas pela economia mundial em 2005 foram perdidas. Mas é preciso olhar para o futuro. Quem sabe o clima de fim de ano traga coragem e mudanças. Feliz Natal a todos.



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Benjamin Steinbruch, 52, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).
E-mail - bvictoria@psi.com.br