O Globo
BRASÍLIA. A oposição barrou ontem a votação do Orçamento da União de 2006 em protesto contra a decisão do governo de ampliar os recursos para o programa Bolsa Família. Parlamentares de todos os partidos, inclusive da base, protestaram contra a redução de recursos dos orçamentos da Saúde e do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti) que foram transferidos para o Bolsa Família, que teria um acréscimo de R$ 3 bilhões de 2005 para 2006 para beneficiar mais de 11,2 milhões de famílias no ano eleitoral. Para a oposição, o governo está dando prioridade a um programa com fins eleitorais.
Da Saúde foram retirados, na proposta do governo, R$ 2,1 bilhões. E os R$ 900 milhões do programa de bolsas do Peti foram remanejados para o Bolsa Família. Como o Bolsa Família é um programa que tem problemas na fiscalização das contrapartidas e é alvo de denúncias de uso político por prefeitos, os líderes da oposição dizem não aceitar essa concentração de verbas em detrimento de outros projetos.
— O governo está se aparelhando para as eleições ao inflar um programa para buscar votos. É um programa que está sempre sob suspeição de fraudes e prática de assistencialismo político, e está cada vez mais flácido em relação às contrapartidas. Não aceitamos inflar tanto um programa que tem uma malha enorme para falcatruas eleitoreiras — reagiu o líder do PSDB, senador Arthur Virgílio.
— Sendo muito educado e polido, digo que esse aumento significativo dos recursos para o Bolsa Família em ano eleitoral é muito suspeito — protestou o líder da bancada da Saúde, deputado Rafael Guerra (PSDB-MG), avisando que seu partido não vota o Orçamento se não forem devolvidos à área os R$ 2,1 bilhões remanejados para o Bolsa Família.
Aliados defendem remanejamento
Os aliados defenderam o governo.
— É legitimo que o governo aja politicamente no Orçamento para melhorar seu desempenho e conseguir voto. A oposição faz isso também. Estamos aprovando um Orçamento para que o governo tenha capacidade de ação em 2006. O que vai acontecer é o reconhecimento do eleitor a essas ações — defendeu o sub-relator da Agricultura e Desenvolvimento Agrário, Romero Jucá (PMDB-RR).
Segundo a coordenadora da bancada tucana na Comissão de Orçamento, senadora Lúcia Vânia (GO), o programa de bolsas do Peti é que estimulava as crianças a ficarem na escola. Só tinha direito à bolsa, que varia de R$ 10 a R$ 40, o aluno que freqüentasse o programa de jornada ampliada. Para este programa foi mantido um orçamento de R$ 300 milhões para 2006. Mas sem a bolsa, cujos recursos originais eram de R$ 900 milhões, os alunos voltariam para as ruas, acredita a senadora:
— Desde 1996, quando o programa, foi implantado, retiramos das ruas dois milhões de crianças. O governo Lula não ampliou o programa e agora acaba com a essência do Peti. Sem a bolsa, as crianças perdem o objetivo de freqüentar a jornada ampliada e voltam para as ruas.
— Não aceitamos desfalcar um programa meritório, cristão, para reforçar o Bolsa Família. Estaríamos favorecendo uma mera jogada de marketing — completou Virgílio.
Com a rebelião no plenário também contra a redução expressiva de recursos para programas como o Primeiro Emprego e outros de geração de trabalho e renda, a Comissão Mista de Orçamento não conseguiu votar o sub-relatório de Trabalho, Previdência e Assistência Social e o relator, senador João Ribeiro (PL-TO), terá de refazer o texto.
Um dos pontos elogiados do relatório de Ribeiro é o que trata do salário-mínimo, que passará de R$ 300 para R$ 340 em maio de 2006. A redução dos recursos para programas de emprego e renda também foram muito criticados.
— A retiradas de recursos veio do Executivo nesta situação e não tive como mudá-lo, pois ninguém apresentou emendas. Não sei como resolver — lamentou Ribeiro.
Com a confusão, a Comissão de Orçamento só conseguiu concluir ontem a votação do texto base da área de Agricultura e Desenvolvimento Agrário. É o primeiro dos dez relatórios setoriais que precisam ser votados. Jucá também foi acusado de favorecer o governo, ao aceitar emendas das comissões que transferem dos estados para a União a gestão do programa de mecanização agrícola, que pode render muitos votos.
— Venceu o lobby dos ministros. É a emenda denominada rachadona, combina o interesse do ministro com o dos presidentes das comissões — afirmou o senador Romeu Tuma (PFL-SP).
— Isso é palhaçada. Não estou atendendo a ministros. Estou atendendo a políticas públicas. Somos um país continental — rebateu o relator.
As votações só devem ser retomadas em 10 de janeiro.
Um comentário:
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