11.12.05

Bancos cobiçam servidores

Geralda Doca para O Globo

A recente licitação para que um banco gerenciasse a folha de pagamento da prefeitura de São Paulo, a maior da América Latina, trouxe à tona uma disputa intensa entre os gigantes do sistema financeiro, que tem como pano de fundo a ampliação da base de clientes e, de quebra, a possibilidade de novos ganhos em cima de produtos como o crédito consignado. A modalidade vem despertando a cobiça dos maiores bancos do país pelas finanças de estados e prefeituras, e suas respectivas contas de salário, um negócio de quase R$ 100 bilhões.

O pagamento dos funcionários das capitais gira por mês cerca de R$ 1,2 bilhão, quase R$ 17 bilhões por ano, e os governos estaduais outros R$ 5,7 bilhões, ou R$ 76 bilhões anuais, somando o décimo terceiro salário. A negociação é pesada e se oferece de tudo: de tarifas menores para correntistas a patrocínios de feiras, exposições e eventos esportivos e culturais, passando pela ajuda financeira para compra de computadores e reforma e construção de imóveis. Isso sem contar os milhões que os bancos privados desembolsam para comprar a folha de pessoal em licitações.

Mesmo quem tinha o monopólio da folha, garantido no processo de privatização dos bancos estaduais, está na batalha. O Itaú, que comprou o Banestado e controlava a folha e o recebimento de tributos do Paraná, perdeu a briga para uma aliança entre o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal em novembro. A conta dos servidores movimenta em torno de R$ 300 milhões por mês. São 117 mil trabalhadores da ativa, com salário médio de R$ 1.500.

Em Caxias, ajuda para construir escola

Não houve licitação, mas o BB fez a promessa de investir no estado cerca de R$ 120 milhões por ano em diversos projetos, disse o procurador-geral do estado, Sérgio Botto de Lacerda, um dos responsáveis pela troca da gestão da folha. Entraram na negociação patrocínio de feiras e exposições, além de ajuda financeira para a compra de equipamentos de informática.

— O banco usa isso de forma inteligente. Não somos instituição de caridade e o nosso objetivo é comercial — afirma o diretor de Varejo do BB, Paulo Euclides Bonzanini.

O Santander, que dividia com o BB a conta dos salários da prefeitura de São Paulo, perdeu o filão para o Itaú, que pagou R$ 510 milhões ao município para ficar com uma folha de 220 mil pessoas e outro R$ 1,5 milhão para tomar conta das disponibilidades de caixa e aplicações. Mas a briga continua: o BB e o Santander estão atuando para segurar os clientes e um dos trunfos do banco federal são os empréstimos com desconto no contracheque concedidos aos servidores, que somam hoje R$ 80 milhões.

O BB também ficou com a folha de salários da prefeitura de Belo Horizonte, em torno de R$ 60 milhões, que era do Itaú. Com o controle da folha de 1.310 prefeituras, a Caixa oferece contrapartidas, que, além do apoio à compra de máquinas e a eventos, inclui pagamento de aluguéis, cessão de uso de imóveis, reformas e construção.

Numa briga com o Unibanco, o HSBC venceu uma licitação e paga para a prefeitura do Rio R$ 102,9 mil por mês para manter uma agência na sede da administração municipal, numa estratégia para fisgar mais clientes. Dono também da conta da prefeitura de Duque de Caxias, o HSBC ofereceu como uma das moedas de troca ajuda financeira para construir uma escola para alunos carentes.

Negócio lucrativo para as empresas

Outra folha em poder da instituição é a da prefeitura de Nova Iguaçu. Ao todo, o HSBC controla 30 folhas municipais, com maior concentração no interior de São Paulo.

— O banco é voltado para o varejo, pessoas físicas, que dão ganho de escala, e o controle da folha é um facilitador — diz o diretor de Cartões e Financiamento ao Consumidor do HSBC, Henrique Frayha.

— Com 100% dos clientes de uma prefeitura, você inicia todo um processo de relacionamento, como crédito consignado, aplicações e previdência privada — reforça o diretor de Poder Público do Unibanco, Antonio Carlos Azevedo.

O Unibanco gerencia contas-salário de 13 prefeituras, com participação também nas Forças Armadas e órgãos públicos federais. Entre suas moedas de troca no processo de licitação está um pacote de ofertas aos servidores, como 13 dias de uso do cheque especial sem cobrar tarifa e cartão de crédito sem anuidade.

Para Carlos Coradi, da Engenheiros Financeiros & Consultores, a folha de pagamento de servidores é um produto muito interessante para os bancos porque permite ampliar a base de clientes e, com isso, a venda de produtos, como empréstimos, e os ganhos com tarifas. Os bancos mantêm sob sigilo os lucros obtidos com o setor público. Especialistas atribuem o acirramento da disputa ao fim da safra de venda de bancos pequenos, que foi uma forma de angariar clientes em massa.

— Comprar uma folha é quase como comprar um banco — compara o diretor de Produtos de Financiamento da Federação Brasileira das Associações de Bancos (Febraban), Osmar Roncolato Pinho.

Um comentário:

Anônimo disse...

best regards, nice info » »