12.12.05

Política da destruição

Fraudes envolvendo madeireiros e petistas são bem maiores do que se pensava

Leonardo Coutinho para a Veja

Em junho, uma reportagem de VEJA revelou que, na cidade paraense de Anapu, às margens da Transamazônica, uma quadrilha que reúne parlamentares petistas e funcionários do Ibama e do Incra liberou a exploração e o trânsito de madeira roubada em troca de 300.000 reais dados por madeireiros para campanhas políticas. Pelo menos 6.000 viagens foram feitas por caminhões marcados com o adesivo-senha inventado para a liberação do transporte, "oPTtante do Plano Safra Legal 2004" – com a sigla do partido em destaque. A denúncia causou uma onda de desmentidos, mas o projeto acabou cancelado pelo Ibama, funcionários foram afastados e uma sindicância foi aberta para a apuração das responsabilidades. O caso foi parar na CPI da Biopirataria, da Câmara dos Deputados, e, depois de dois meses, não só se confirmaram as irregularidades como também se descobriu um sistema organizado de pilhagem da floresta envolvendo o dirigente principal do Ibama no Pará, Marcílio Monteiro, e sua ex-mulher, a senadora Ana Júlia Carepa, ambos do PT. "Essas denúncias são de uma quadrilha que quer me derrubar do Ibama", diz Monteiro.

No primeiro depoimento colhido sobre o caso na CPI, o presidente do Sindicato dos Reflorestadores do Pará, Mário Rubens de Souza Rodrigues, revelou outro esquema de pagamento de propina, sediado no comitê da senadora, na época candidata à prefeitura de Belém. Rodrigues deu aos deputados o número de uma conta bancária da assessora parlamentar Maria Joana da Rocha Pessôa, que foi coordenadora da campanha petista em Belém. Enquanto a tropa de choque do PT na CPI fazia de tudo para evitar a quebra do sigilo bancário de Maria Joana, ela mesma entregou um extrato de uma de suas contas-correntes mostrando movimento de 1,5 milhão de reais no ano passado – 80% disso apenas nos dois meses anteriores ao pleito. "Sou viúva, recebo duas pensões e tenho dois ex-maridos que me ajudam muito", diz Maria Joana, tentando explicar a movimentação mais de dez vezes maior do que seu salário anual. Os nomes dos depositantes só chegarão à CPI nos próximos dias. Na semana passada, o Supremo Tribunal Federal negou aos petistas um pedido de liminar para evitar o acesso dos parlamentares às informações bancárias da assessora petista.

Em Belém, uma história revelada pelo advogado Ismael Antônio de Moraes ajuda a entender de onde vem parte desse dinheiro. Ele conta que quatro de seus clientes foram procurados pelo também advogado Arthur Carepa, que ofereceu facilidades na aprovação de planos de manejo florestal em troca de apoio financeiro para a campanha de sua irmã, a senadora Ana Júlia. "É tudo mentira", defende-se Arthur Carepa. Moraes diz que orientou os madeireiros a não aceitar o achaque, mas os clientes preferiram pagar. Um deles disse ao advogado ter entregado a Maria Joana 150 000 reais. Outros recursos saíram da cidade de Paragominas, a 320 quilômetros de Belém, considerada o principal pólo produtor de madeira da Amazônia. Um grupo de madeireiros da região fez uma caixinha de 500.000 reais. "Fui convidado para fazer parte do consórcio, mas neguei", revela o dono de uma das mais importantes serrarias em operação no Pará. Segundo o relator da CPI, o deputado Sarney Filho, do PV do Maranhão, embora a investigação esteja limitada apenas às doações de madeireiras, ele incluirá a denúncia contra a assessora da senadora em seu relatório e pedirá ao Ministério Público e à Polícia Federal que investiguem o caso. "Isso é perseguição política", jura a senadora.

Casos parecidos pipocam por toda a Amazônia. Na semana passada, outro ex-caixa de campanha do PT, Gustavo Mascarenhas da Paixão, denunciou ao juiz e ao promotor de Justiça de Medicilândia, a 848 quilômetros de Belém, que o deputado federal José Geraldo e sua mulher, Lenir Trevisan, prefeita da cidade, montaram um esquema de financiamento de campanha com base em oferta de garantias para que os madeireiros locais pudessem operar livremente na região. Paixão denuncia, ainda, o desvio de dinheiro da campanha e a compra de votos.

"A Lenir dava madeira da fazenda do casal em troca de votos", afirma. José Geraldo nega que ele ou sua mulher sejam donos de fazenda e que tenham prometido vantagens em troca de apoio financeiro. "Quem faz essa denúncia tem problema mental", ele diz. "Sou um dos maiores defensores do meio ambiente no Pará."

O ex-tesoureiro afirma que só denunciou os ex-patrões depois que passou a ser ameaçado de morte. Garante ter gravados os telefonemas e diz que já entregou cópias das fitas à Justiça. "A Lenir estava com tanta sede de dinheiro que foi pedir apoio até para o Regivaldo Galvão", conta. Galvão é empresário de Altamira e está preso em Belém, acusado de ser um dos mandantes da morte da freira americana Dorothy Stang. Segundo a mulher de Regivaldo, a empresária Rosângela Nunes Galvão, Lenir os procurou pessoalmente para pedir dinheiro. Informado de que, se não contribuísse, sofreria retaliação, Regivaldo pagou a confecção de 1.500 camisetas. Rosângela revela ainda que seu marido entregou 17.000 reais ao tesoureiro da campanha de outro candidato, Chiquinho do PT, ao ser ameaçado de tornar-se alvo de acusações de trabalho escravo em uma fazenda. Ela diz ter participado com o marido de uma reunião coordenada pelos deputados José Geraldo, federal, e Airton Faleiro, estadual, na qual foram definidos os termos para o financiamento de campanha em troca de favores no Ibama e no Incra de Altamira. Faleiro assume ter participado de reuniões que negociaram apoio financeiro para campanha, nega ter oferecido vantagens e considera a hipótese de seu nome ter sido usado sem seu conhecimento. "Tem muita gente mal-intencionada", diz.

http://www2.camara.gov.br/comissoes/temporarias/cpi/cpibiopi/

COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO DESTINADA A "INVESTIGAR O TRÁFICO DE ANIMAIS E PLANTAS SILVESTRES BRASILEIROS, A EXPLORAÇÃO E COMÉRCIO ILEGAL DE MADEIRA E A BIOPIRATARIA NO PAÍS". 52ª Legislatura - 3ª Sessão Legislativa Ordinária
RESULTADO DA REUNIÃO ORDINÁRIAAUDIÊNCIA PÚBLICA EM 07/12/2005
A -
Audiência Pública:
Tema:Depoimentos sobre fatos relacionados com o objeto de investigação desta CPI.Testemunhas:
Sr. PEDRO CERQUEIRA LIMA - Presidente da ONG Fundação Bio-Brasil;
Sr. NELSON SIMPLÍCIO FIGUEIREDO - Motorista; e
Sr. ALFRED MARK RAUBITSCHEK - Comerciante de madeira em São João do Paraíso/BA.
B -
Requerimentos:
1 -
REQUERIMENTO Nº 162/05 - dos Srs. Antonio Carlos Mendes Thame e Comissão Parlamentar de Inquérito destinada a "investigar o tráfico de animais e plantas silvestres brasileiros, a exploração e comércio ilegal de madeira e a biopirataria no País". - que "requer a prorrogação do prazo de funcionamento da CPI, por noventa dias". APROVADO