14.12.05

As pesquisas comprovam

ANTONIO CARLOS MAGALHÃES para FSP

A sempre constante nos últimos meses e agora vertiginosa queda dos índices de confiabilidade da população no presidente Luiz Inácio Lula da Silva já não surpreende ao mais crédulo dos brasileiros. Não se poderia esperar outra reação dos milhões de eleitores que ele, seu partido e seus aliados traíram. E traíram da forma mais abjeta e cruel, não só descumprindo compromissos solenemente assumidos com o país, mas, pior que isso, mergulhando-o na mais grave e vergonhosa crise moral de que se tem notícia ao longo da nossa história republicana. Ninguém mais duvida de que, até o término de seu mandato, os índices dos que já não confiam no presidente vão aumentar muito mais. Não há retorno.


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Ninguém poderia pensar que uma eleição, cercada de tantas expectativas, terminasse num desastre de tamanha proporção
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Sinceramente, eu não desejava que o fracasso da desastrosa experiência de governo petista se prenunciasse com tanta antecedência e acarretando tantos prejuízos ao país. Não desejava porque, antes de pensar, de sentir e de agir como político de oposição, minha consciência de homem público me obriga a pensar, a sentir e a agir como brasileiro não apenas interessado mas também empenhado de corpo e alma em que o Brasil de tantos desacertos um dia dê certo.
Aliás, não foi senão a esperança de que o país pudesse dar certo com ele que levou milhões de brasileiros a colocar o ex-metalúrgico Lula na Presidência. Forçoso reconhecer que foi um erro histórico de avaliação que nos está custando muito caro, mas ninguém poderia imaginar que uma eleição, cercada de tantas expectativas, terminasse num desastre de tamanha proporção e ferisse tão fortemente o país.
Eu, pessoalmente, estava convencido de que poderia ter dado certo. Mas, lamentavelmente, esse meu convencimento se esvaiu, perdeu força, a partir do momento em que constatei que entre a retórica da campanha e o dia-a-dia do presidente havia uma distância que o passar do tempo só fez aumentar.
Vejam que o presidente foi incapaz até de constituir um ministério que inspirasse confiança e merecesse o respeito e a admiração da população. Com as honrosas exceções de sempre, o presidente fez-se cercar por gente inapta para o trabalho; como se vê hoje, sequer com condições morais para exercer qualquer atividade pública.
No início do governo, eu mesmo cobrei muito, da tribuna do Senado, o fato de Lula ter levado, para compor seu ministério e grande parte da diretoria de bancos e empresas estatais, os derrotados das urnas em todos os Estados. Hoje, vejo que a derrota nas urnas era o menor dos defeitos dessa gente.
As pesquisas, como as crases -e aí me socorro no poeta Ferreira Gullar-, não foram inventadas para humilhar ninguém. Se as pesquisas servem para alguma coisa -e servem-, é para que possamos ouvir a sociedade e dela tirarmos lições.
O presidente finge não perceber que o desencanto com o governo dele, estampado em pesquisas dos mais diversos institutos, nada tem a ver com ideologia. Mas é isso que nos dizem as pesquisas: elas mostram que a sociedade brasileira traz a mais profunda e genuína decepção com um governante que foi incapaz de cumprir quase todas as promessas que fez para se eleger. Pior, foi incapaz de cumprir até mesmo as promessas que fez após ser eleito.
O que dizer, por exemplo, da infinidade de conselhos e grupos de trabalho que o presidente criou e para os quais já não dá a menor importância, a ponto de, dia desses, o presidente ter ouvido, em pleno Planalto, a queixa amarga de uma conselheira do Conselho de Segurança Alimentar, dizendo que falta diálogo entre o conselho e o presidente? Pior, teve que ouvir que os membros do conselho estariam "preocupados e indignados com os níveis alarmantes de pobreza, insegurança alimentar e insustentabilidade ambiental".
E as tão festejadas Parcerias Público-Privadas? Até agora, não se tem notícia do andamento de uma única parceria em nível federal. Os (maus) exemplos de inação, incompetência e desídia são tantos que citá-los todos me tomaria todo este espaço. O fato é que esse governo não conseguiu tirar do papel nem as boas idéias que concebeu.
Os resultados das pesquisas refletem, portanto, o pasmo, a indignação e a frustração dos brasileiros, que não mereciam passar pelo que estão passando.
A experiência é dolorosa. Já perdemos quase três anos de nossa história. Porém nunca é demais recordar que anos e meses na vida de um povo podem ser recuperados. Mas, para isso, diferentemente do que fizeram o PT e seus aliados, metas estabelecidas devem ser cumpridas e, também muito ao contrário do que eles fizeram, é necessário que o governo tenha sempre presente, nos atos do cotidiano, como um mandamento sagrado, a norma de que política e ética devem caminhar ombreadas e que nada deve separá-las. O presidente, o PT e seus aliados as separaram. Estão pagando e vão pagar muito mais por esse erro. O povo jamais os perdoará. As pesquisas estão comprovando isso.



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Antonio Carlos Magalhães, 78, é senador pelo PFL-BA e presidente da Comissão de Constituição e Justiça do Senado. Foi presidente da Casa (97-99 e 99-2001), governador da Bahia (91-94) e ministro das Comunicações (governo Sarney).