20.12.05

Aumento do mínimo - análise

Impacto econômico do aumento do mínimo
MONICA BAER
SERGIO VALE
ESPECIAL PARA A FOLHA

A votação do Orçamento no Congresso Nacional trouxe à tona a discussão sobre o aumento do salário mínimo (SM) no ano que vem. Previsto na peça orçamentária para subir dos atuais R$ 300 para R$ 321 mensais, começam os rumores de que o mínimo poderá alcançar patamares mais elevados, alguns chegando a improváveis R$ 400.
Apesar de ser socialmente desejável, um valor muito alto para o SM pode implicar elevações indesejadas no déficit da Previdência Social e nas contas de Estados e de municípios. Nossos cálculos mostram que, para cada R$ 1 de aumento do SM, o déficit da Previdência e dos Estados e dos municípios sobe R$ 185 milhões.
Para analisar o impacto do aumento do mínimo na economia, suporemos quatro patamares diferentes: R$ 321, R$ 340, R$ 350 e R$ 400. Para cada um deles estimamos o impacto em termos de aumento do déficit do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) e das esferas estaduais e municipais e do aumento real da massa de rendimentos até 1 SM.
No caso do INSS, o SM previsto atualmente no Orçamento implicaria déficit de R$ 4,5 bilhões (ver quadro). Desse montante, R$ 3,2 bilhões deve-se aos pagamentos até 1 SM, e R$ 1,3 bilhão aos pagamentos acima de 1 SM.
Nesse caso, o reajuste é feito pelo INPC, que, como deverá ter aumento de apenas 3,6% entre maio de 2005 e abril de 2006, trará impacto relativamente menor na Previdência. Se o mínimo for para R$ 321, o déficit da Previdência Social chegará a 2,1% do PIB (Produto Interno Bruto).
Os Estados e os municípios, principalmente os últimos, têm grandes parcelas de suas aposentadorias e a folha de pagamento atreladas ao SM. Assim, um aumento desse porte pode causar grandes impactos. Com efeito, se o SM for para R$ 321, o impacto no déficit dessas esferas seria de cerca de R$ 800 milhões. No total, incluindo o INSS, o impacto seria de 0,3% do PIB (ver quadro).
Os outros cenários para o SM deixam claro o forte efeito negativo sobre as contas públicas caso o governo tente ser mais ousado. Um SM de R$ 400 significaria aumento no déficit público nominal de 1% do PIB.

Ganho de até R$ 30 bi
O valor que tem sido bastante sugerido, de R$ 350, significaria que o déficit do INSS alcançaria 2,3% do PIB em 2006. Em outros termos, isso poderia significar 0,2% a menos do superávit primário em 2006, pois os R$ 321 já estão considerados no Orçamento. Como o presidente Lula dá sinais de que tentará manter o superávit em 4,25% do PIB, haveria, a principio, espaço para tal aumento.
Além disso, o governo sinaliza que um aumento dessa magnitude poderá levar simultaneamente à não-revisão da tabela do IR e a aumentos não lineares para os servidores públicos, o que é apoiado pela equipe econômica. Ou seja, o déficit seria coberto com mais distorções no gasto público.
Em termos gerais, o ganho real para o conjunto de pessoas que recebe até 1 SM pode variar de R$ 4,6 bilhões, caso o SM seja de R$ 321, a até R$ 30 bilhões, caso seja de R$ 400. Em qualquer situação, metade desse ganho seria dos aposentados do INSS, 43% dos trabalhadores na ativa e aproximadamente 7% dos beneficiados pelos programas de transferência de renda (ver tabela). No caso dos trabalhadores, os maiores beneficiados seriam os empregados domésticos, que representam a maior parcela dos que têm seus pagamentos atrelados ao salário mínimo.
É importante frisar também a redistribuição regional de rendimentos que um aumento real dessa magnitude pode gerar. Como cerca de 50% dos que recebem o salário mínimo moram no Nordeste, o aumento para R$ 350 significaria incremento de renda de R$ 7 bilhões nessa região, além do aumento esperado do "Bolsa-Família", que deve canalizar mais R$ 4 bilhões.
Num ano eleitoral em que o presidente se encontra fraco e dependente de medidas de impacto para angariar os votos perdidos, fica difícil imaginar que o SM não tenha aumento significativo. Mesmo que não seja necessariamente verdade que o aumento do SM e do "Bolsa-Família" são garantidores de votos, fica claro que o governo federal tem um poderoso instrumento político na mão, apesar da certa deterioração fiscal que ocorrerá.
Por último, calculamos o possível efeito do aumento do SM sobre a demanda e, conseqüentemente, o que poderia significar para a inflação (ver tabela). Com o reajuste do SM para R$ 350, estimamos que a massa real de rendimentos seria 1% superior à nossa previsão para 2006 até agora (4,8%). Não nos parece um crescimento de demanda preocupante do ponto de vista da inflação, o que já não seria o caso para um reajuste do SM para R$ 400.



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Monica Baer e Sergio Vale são economistas da MB Associados