21.3.06

Planalto aposta no esfriamento do caso

A situação do ministro da Fazenda, Antonio Palocci, será monitorada dia-a-dia pelo Palácio do Planalto, na expectativa de que a nova onda de denúncias e suspeitas se dissolva com o passar do tempo. Essa é a avaliação de importantes interlocutores do presidente Lula e foi, também, a decisão da coordenação política, que na reunião de ontem concluiu que é possível enfrentar a oposição, no entendimento de que os ataques a Palocci são de natureza política e não de ordem ética e moral.

Nada disso, porém, garante que o quadro se estabilize e há, mesmo no governo, quem acredite que a situação de Palocci é "insustentável" e que, portanto, ele pode deixar o cargo a qualquer momento. Seus sinais vitais estão comprometidos para ocupar uma das pastas mais importantes do governo e sua permanência a qualquer custo pode acabar sendo prejudicial para o presidente da República.

A avaliação da situação vem mudando de forma muito rápida. No domingo, após a divulgação de informações bancárias de Francenildo dos Santos Costa, o caseiro que testemunhou contra Palocci na CPI dos Bingos, integrantes do governo estavam mais tranqüilos em relação ao futuro do ministro. Ontem, o clima mudou diante da forte reação da oposição e de rumores de que a imprensa havia descoberto como o sigilo bancário do caseiro foi quebrado.

Em vez da defesa, o governo optou novamente pelo ataque. Principal defensor de Palocci no Congresso, o senador Tião Viana (PT-AC) entrou com requerimento no Senado, solicitando a quebra do sigilo bancário de Francenildo. Viana quer informações sobre a movimentação financeira do caseiro, desde 1º de janeiro deste ano, em sua conta corrente, na caderneta de poupança e no cartão de crédito. O pedido será encaminhado pela Mesa do Senado à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), que analisará o mérito e submeterá a decisão ao plenário.

"O coitado do caseiro precisa que apareça a verdade para mostrar que ele é inocente", ironizou Tião Viana. "São dois pesos, duas medidas. O sigilo fiscal e telefônico de Paulo Okamotto (responsável pelo pagamento, em 2003, de dívida de R$ 30 mil do presidente Lula com o PT) foi divulgado. A oposição é assim: aos amigos, a proteção; aos inimigos, a desordem."

A reação da oposição foi imediata. Tão logo o senador petista apresentou seu requerimento, o senador Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA), apoiado pelo líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio (AM), avisou que pedirá à Mesa do Senado a quebra do sigilo bancário de Paulo Okamotto, que hoje preside o Sebrae, nomeado por Lula. Uma hora depois foi a vez de o senador Antero Paes de Barros (PSDB-MT) solicitar a quebra do sigilo bancário de Fábio Luís Lula da Silva, filho do presidente e dono da Gamecorp, empresa que teria recebido R$ 15 milhões de uma concessionária de serviço público - a Telemar.

"Temos um Estado policial em marcha no país", discursou Virgílio, referindo-se à quebra ilegal do sigilo bancário do caseiro. "Hitler parecia uma figura ridícula no começo", comparou. Outro senador da oposição - Álvaro Dias (PSDB-PR) - informou que recebeu no início da noite telefonema de Francenildo, revelando que está disposto a franquear o acesso dos senadores ao seu sigilo bancário.

Em São Paulo, o ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, afirmou que a quebra ilegal do sigilo bancário é "grave" e será investigada pela Polícia Federal. "Essa quebra de sigilo é séria, precisa ser apurada e vai ser apurada. É uma coisa terrível que precisa ser combatida e coibida e vamos combater isso. Ninguém está acima da lei", declarou o ministro.

O presidente do PPS, deputado Roberto Freire (PE), informou que entregará hoje à Procuradoria da República, em Brasília, representação pedindo investigação da violação do sigilo bancário de Francenildo. Já a Caixa Econômica Federal anunciou que abriu sindicância para investigar se o vazamento das informações foi feito por um de seus funcionários.

Na Câmara, o líder do PSDB, Jutahy Magalhães Júnior (BA), a exemplo do que fez semana passada seu partido no Senado, defendeu a demissão de Palocci e questionou o papel da PF no escândalo, uma vez que há a desconfiança de que o sigilo de Francenildo pode ter vazado enquanto ele estava nas dependências da instituição, em Brasília. "A pessoa procura o programa de proteção à testemunha e vira vítima?", indagou o deputado. "Se a PF atuou nesse caso, é preciso averiguar. Já estou cansado de ver Thomaz Bastos agindo mais como advogado de defesa do governo do que como ministro da Justiça do Brasil."

No governo, prevalece a versão de que o depoimento de Francenildo à CPI dos Bingos, afirmando que Palocci freqüentava a mansão alugada por seus ex-assessores para fazer lobby em Brasília, é parte de uma farsa montada pela oposição. Desconfia-se da participação do senador Heráclito Fortes (PFL-PI), que seria ligado ao empresário Eurípedes Silva, pai de Francenildo e responsável por depósitos na conta do caseiro nos últimos três meses. Ontem , Heráclito disse na tribuna do Senado que não conhece Francenildo nem seus familiares. "Abro meu sigilo bancário e telefônico para saber se houve contato meu com Francenildo", ofereceu o senador, que até a semana passada era um dos principais defensores de Palocci no Senado.

Ao participar de cerimônia no Palácio do Planalto, o ministro do Trabalho, Luiz Marinho, afirmou que o caseiro foi "treinado" pela oposição. "Esse assunto (a quebra de sigilo do caseiro) é grave, tem que ser investigado. Mas também é grave e estranho surgir um caseiro inventado, tão bem treinado pela oposição", disse ele.
Valor