O total de títulos públicos em circulação no país ultrapassou a casa de R$ 1 trilhão no mês passado, segundo dados calculados pelo Tesouro Nacional. Em fevereiro, a chamada dívida mobiliária do governo federal somava R$ 1,01 trilhão.
Para ter uma idéia, o valor equivale a pouco mais da metade de todas as riquezas produzidas pelo país no ano passado. Em 2005, de acordo com estimativas do Banco Central, o PIB (Produto Interno Bruto) brasileiro foi de R$ 1,9 trilhão.
Só entre janeiro e fevereiro, a dívida mobiliária cresceu R$ 25 bilhões, graças à emissão de novos títulos e à incidência de juros sobre os papéis já existentes. Pelos dados do mês passado, 51% dos títulos públicos negociados no país são corrigidos pela taxa Selic, que hoje é de 16,5% ao ano.
Ao divulgar os dados, o coordenador-geral da Dívida Pública do Tesouro, Paulo Valle, procurou minimizar o significado do endividamento trilionário do governo federal. "Isso [o aumento da dívida] já estava previsto. Essa é a manchete favorita dos jornais, mas eu acho equivocado. Nominalmente, a dívida sempre cresce. Alertar só para esse número pode passar uma mensagem equivocada", afirmou.
Valle disse que a dívida, medida em reais, vai continuar a crescer enquanto ainda existir déficit público no Brasil -ou seja, o governo gasta mais do que arrecada e precisa financiar esse desequilíbrio contraindo mais empréstimos. Para ele, a relação entre dívida pública e PIB -que tem se mantido estável nos últimos anos- é um indicador melhor para avaliar a situação fiscal do país.
De fato, boa parte dos analistas prefere acompanhar mais de perto a dívida líquida do setor público, que, além dos títulos emitidos pelo governo, inclui também a dívida externa e os compromissos assumidos por Estados e municípios. Em janeiro, dado mais recente publicado pelo BC, a dívida líquida estava em R$ 1,014 trilhão, o equivalente a 51,6% do PIB.
Mas a dívida mobiliária também tem a sua importância. O economista Francisco Lopreato, professor da Unicamp, ressalta que é nos títulos públicos que se observa o efeito da alta taxa de juros praticada no país.
De acordo com dados do mês passado, 51% dos papéis em circulação no país são corrigidos pela taxa Selic, que hoje está em 16,5% ao ano. Dessa forma, ainda que o Tesouro parasse de lançar novos títulos públicos, a dívida do governo cresceria cerca de R$ 10 bilhões por mês apenas pelo efeito dos juros.
"Quando tivermos uma política monetária civilizada, teremos mais espaço para melhorar a relação entre dívida e PIB", disse Lopreato. Segundo o economista, a dívida mobiliária do governo também apresenta pontos vulneráveis no seu perfil.
Um dos objetivos perseguidos pelo Tesouro é o de, justamente, reduzir a parcela da sua dívida atrelada à taxa Selic, que é fixada periodicamente pelo BC. Nos últimos meses, a participação dos títulos prefixados (com rendimento definido antecipadamente) no endividamento total tem subido: chegou a 27% no mês passado, contra 19% no final de 2004.
O economista-chefe do Unibanco, Marcelo Salomon, lembra que, quanto menor a exposição da dívida a variações da taxa Selic e do câmbio, melhor para a política monetária. Isso porque, numa situação dessas, o BC poderia aumentar os juros sem que houvesse um impacto significativo sobre as contas públicas.
A maneira como essa mudança no perfil da dívida está sendo feita, porém, recebe críticas do professor da Unicamp. Para Lopreato, a maior participação de títulos prefixados não é necessariamente positiva, pois esses papéis vencem num prazo relativamente curto -menos de um ano, em média. Por isso, seria muito fácil para os investidores, num momento de alta dos juros, voltar aos papéis atrelados à Selic num pequeno espaço de tempo.
"A participação dos prefixados na dívida aumentou nos últimos meses. Isso foi um ganho para o Tesouro? Não, foi uma perda. O custo [da dívida para o governo] teria sido menor se fossem mantidos os títulos corrigidos pela Selic", disse -a taxa Selic tem sido reduzida nos últimos meses.
Folha
Nenhum comentário:
Postar um comentário