Entre 1999 e 2001, partido tomou R$ 1 mi emprestado no banco; em 2003, governo tentou barrar investigação sobre operações da instituição
O Diretório Nacional do PT, então sob a presidência de José Dirceu (SP), que teve seu mandato de deputado federal cassado em 2005, obteve R$ 1 milhão em empréstimos do Banestado (Banco do Estado do Paraná) entre 1999 e 2001, segundo revelam os dados bancários das contas do PT, em poder da CPI dos Correios.
O Banestado ficou conhecido por ser o foco de uma das maiores fraudes financeiras já registradas no país: a remessa, entre 1998 e 2002, de pelo menos R$ 120 bilhões para o exterior por meio de contas abertas em nome de laranjas e de empresas "offshore" e operadas por doleiros, usualmente para ocultar dinheiro de caixa dois de empresários e recursos oriundos de corrupção política.
Em 2003, no primeiro ano da gestão de Luiz Inácio Lula da Silva, o Palácio do Planalto trabalhou para impedir a criação da CPI do Banestado, que teria o objetivo de investigar as irregularidades na instituição. A CPI funcionou entre 2003 e 2004.
José Dirceu, então ministro-chefe da Casa Civil, teve papel importante na tentativa de barrar a investigação. Mas, pressionado pela oposição e pela mídia, acabou tendo de ceder. O Planalto indicou para a função de relator, uma das mais importantes da comissão, o deputado federal José Mentor (PT-SP), homem de confiança de Dirceu. A exemplo do ex-ministro, Mentor também foi acusado de envolvimento no escândalo do "mensalão" e corre o risco de ter seu mandato cassado. Ambos negam irregularidades.
Durante entrevista divulgada ontem pela Folha, o empresário paranaense Antônio Celso Garcia, o Tony, mostrou transcrições de gravações em que seu ex-sócio, o advogado Roberto Bertholdo, comenta a influência que supostamente tinha sobre a CPI, por meio do deputado Mentor.
Em 2004, a Folha revelou ter havido um pacto entre o PT e Paulo Maluf, então candidato a prefeito de São Paulo, pelo qual ele apoiaria, no segundo turno, a candidata Marta Suplicy (PT) em troca da exclusão do seu nome no relatório final da CPI. O nome de Maluf não foi incluído no rol dos indiciados no relatório de Mentor.
A CPI foi marcada por uma série de acusações do PSDB sobre a suposta leniência da relatoria em investigar as operações do Banestado e de outros bancos. Até agora, não se sabia que o PT, sediado em São Paulo, mantivera contas e empréstimos com o Banestado, cuja sede fica em Curitiba.
"Fica cada vez mais evidente a razão do papel que o PT desempenhou para tentar enterrar a CPI. Dirceu e o partido foram frontalmente contrários à criação da CPI e à minha indicação [para cargo na comissão]", disse o senador Antero Paes de Barros (PSDB-MT), presidente da CPI do Banestado. "Agora dá para entender melhor muita coisa que aconteceu. Mas parece que é só a ponta do iceberg", disse Antero.
Retiradas rotativas
O PT assinou com o Banestado um "contrato de empréstimo rotativo", pelo qual fazia retiradas de dinheiro segundo suas necessidades. Na época das operações, Luiz Inácio Lula da Silva era presidente de honra do PT, e as decisões administrativas cabiam a Dirceu. Os extratos em poder da CPI revelam que o Diretório Nacional do PT movimentou R$ 4,87 milhões na conta do banco.
De acordo com a assessoria de comunicação do Diretório Nacional da sigla, todas as dívidas com o Banestado foram quitadas até abril de 2001, quando o PT encerrou sua movimentação no banco. O partido adquiriu ainda um título de capitalização do banco e resgatou-o em 2004. O valor do título não foi divulgado.
As operações entre o PT e o Banestado se estenderam de março de 1999 a janeiro de 2001. A conta fora aberta no banco em maio de 1998. Na prestação de contas do partido do ano de 2001 ao Tribunal Superior Eleitoral, o PT declarou ter apenas R$ 3 na conta que ainda mantinha no Banestado.
Pelo menos desde 1999, quando o PT iniciou seus empréstimos, o Banestado é cercado de denúncias sobre irregularidades em seus procedimentos e remessas ilegais para o exterior. Em abril daquele ano, o procurador Celso Três teve acesso à lista de todas as remessas de dinheiro feitas por meio de contas do tipo CC5. Ele revelou que o Paraná era o campeão nesse tipo de operação, e que 54% dos R$ 7,5 bilhões remetidos por pessoas físicas entre 1992 e 1998 correspondiam a laranjas.
Folha
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