Sigilo bancário de caseiro foi violado pela própria CEF
Formulário com dados é de uso interno; banco anuncia investigação sobre o caso
A violação do sigilo bancário do caseiro Francenildo dos Santos Costa, que testemunhou contra o ministro Antonio Palocci Filho (Fazenda), partiu da própria Caixa Econômica Federal. O formulário de extração de dados da movimentação bancária de Francenildo é exclusivo do sistema interno da estatal, ao qual nem clientes têm acesso.
Segundo a Folha apurou, a ordem para a violação do sigilo foi dada por um funcionário com cargo de chefia da Caixa, instituição subordinada ao Ministério da Fazenda.
Questionada ontem, a estatal não descartou que as informações tenham vazado de dentro da instituição. "Somente a auditoria vai poder constatar a procedência do documento", afirmou Gabriel Nogueira, assessor de imprensa.
Ontem, a Caixa abriu investigação interna para apurar a violação de sigilo do cliente e "eventuais responsabilidades pela divulgação de informações".
A comissão ainda não tem prazo para terminar o trabalho, mas, segundo a assessoria, funcionará subordinada diretamente ao Conselho de Administração, presidido pelo secretário do Tesouro, Joaquim Levy, e não ao presidente da Caixa, Jorge Mattoso.
Testemunha
Francenildo dos Santos Costa, 24, foi caseiro da casa alugada por ex-assessores de Palocci na Prefeitura de Ribeirão Preto (SP) durante oito meses, até o início de 2004. Nesse período, ele afirma ter presenciado visitas do ministro à casa. A CPI dos Bingos investiga a participação de Palocci em um esquema de lobby coordenado pelos ex-assessores.
De acordo com o caseiro, havia dinheiro em espécie na casa, onde também se realizavam festas com garotas de programa e partidas de tênis. Ele disse ainda, em depoimento à CPI dos Bingos, que Palocci era chamado pelos ex-auxiliares de "chefe". O ministro da Fazenda nega que tenha freqüentado o local.
Francenildo Costa teve seu depoimento à CPI interrompido na quarta-feira da semana passada por uma liminar do Supremo Tribunal Federal concedida a pedido do senador Tião Viana (PT-AC), depois de uma reunião no Palácio do Planalto com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Dois dias depois, dados bancários do caseiro foram divulgados pela imprensa, em meio a comentários reservados de membros do governo de que o depoimento dele teria sido pago pela oposição. Na noite de sexta-feira, a Caixa Econômica Federal informou que, constatado o vazamento ilegal de informações, mandaria investigar o caso, o que aconteceu ontem. A instauração de "procedimento de investigação" foi comunicada por meio de nota de apenas cinco linhas.
A Caixa não informou ontem qual o prazo da investigação porque esse seria um episódio inédito na instituição. A alternativa para o vazamento ilegal do sigilo bancário seria o ataque de hackers ao sistema. No Palácio do Planalto, a hipótese de fragilidade do sistema não é levada a sério.
A suspeita de que a Polícia Federal pudesse ter invadido a conta do caseiro gerou mal-estar entre membros da cúpula do governo. A hipótese foi levantada por conta de uma coincidência: o extrato bancário do caseiro tornado público na sexta-feira foi impresso na noite da véspera, justamente quando Francenildo estava nas dependências da Polícia Federal.
Ao se inscrever no programa de proteção a testemunhas da Polícia Federal, o caseiro entregou seus documentos, inclusive o cartão da conta poupança na qual recebera cerca de R$ 25 mil. O autor dos depósitos é um empresário de ônibus de Teresina (PI), suposto pai biológico do caseiro. O empresário, em entrevista a uma emissora de TV do Piauí, reconheceu ter feito os depósitos, mas não a paternidade.
Segundo a PF, a apresentação do cartão bancário e dos demais documentos faz parte de um procedimento de rotina de testemunhas que pedem proteção ao governo.
Polícia Federal
No início da noite de ontem, o ministro Márcio Thomaz Bastos (Justiça) reuniu-se com o presidente Lula e outros ministros para discutir a divulgação dos dados bancários do caseiro. Ficou decidido que a Polícia Federal abre hoje inquérito para investigar a violação do sigilo.
A abertura de um inquérito sobre o vazamento dos dados foi pedida ontem ao Ministério Público Federal pelo advogado Wlicio Chaveiro Nascimento, que representa o caseiro.
O delegado da Polícia Federal Wilson Damázio disse ontem que soube pelo próprio caseiro da existência de depósitos expressivos na conta bancária dele.
Damázio refuta qualquer envolvimento da PF na violação ilegal do sigilo do caseiro. "A PF vai investigar o caso e vai a fundo", afirmou o delegado.
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