25.4.06

Telespectador eleitoral

Alckmin exibe excesso de autoconfiança ao pretender derrotar Lula em 45 dias

Geraldo Alckmin é obstinado e autoconfiante, isto ficou provado no desempenho dele na disputa com José Serra pela indicação do candidato do PSDB à Presidência da República.
Surpreendeu pela agressividade e ganhou a parada, despertando na oposição a esperança de que aqueles atributos postos em prática na preliminar se revelassem como a grande vantagem do candidato já na largada da batalha propriamente dita.
Transcorridos 25 dias do lançamento da candidatura, o que se tem em cena é um Alckmin mais parecido com o governador de São Paulo discreto e anódino merecedor do apelido de "picolé de chuchu" do que com o aguerrido combatente que arrebatou a legenda do favorito Serra, na unha.
Sofre críticas por isso, mas responde fleumático, como se a aflição dos companheiros de partido e candidatos a parceiros de aliança fosse fruto de precipitação indevida. "Hoje a eleição só preocupa jornalistas e políticos", diz ele, a título de justificativa para a morna recepção do eleitorado.
Na opinião de Alckmin, "eleição é televisão e, neste momento, o único candidato que aparece no vídeo é o presidente Lula". Os argumentos podem até vir a se revelar corretos, mas não deixam de traduzir excessos, carências e equívocos na análise do quadro eleitoral.
A excessiva autoconfiança de Geraldo Alckmin na sua predestinação à Presidência da República o faz ignorar o motivo pelo qual a oposição queria tanto ter um candidato definido desde já: aproveitar o tempo para "construir" uma candidatura de contraponto a Lula capaz de sustentar a polarização com ele a campanha toda, chegar em agosto ombro a ombro com o presidente e definir a questão no horário eleitoral mediante a exibição diária de uma retrospectiva da crise.
A interpretação de Geraldo Alckmin carece de prudência quanto ao tamanho da dificuldade de se fazer conhecido por todo o País e convencer a maioria do eleitorado de que é ele o homem certo para presidir o Brasil. Na concepção do candidato, isso será perfeitamente possível em 45 dias, período de duração do horário eleitoral gratuito no rádio e na televisão.
A prevalecer mesmo essa idéia de deixar tudo para depois da Copa do Mundo, Alckmin terá um mês e meio para se contrapor a um candidato com quatro campanhas nacionais e um mandato presidencial nas costas.
Ao tempo curto acrescenta-se o fato de que uma candidatura presidencial não é - ou não deveria ser - um produto a ser "vendido" só às massas em propaganda intensa de comunicação. Salvo algum engano de compreensão, é esta a visão do candidato do PSDB a respeito da própria campanha.
Alckmin pelo jeito aposta na repetição de uma fórmula que deu certo em São Paulo. Em 2000 ele cresceu e quase foi ao segundo turno com Marta Suplicy, na televisão, e em 2002 tirou José Genoino do páreo da mesma forma.
Ocorre que as situações são inteiramente diferentes: há o eleitorado de outros 26 Estados a conquistar, um presidente da República a derrotar e principalmente um projeto de país a apresentar.
Alckmin pode até achar que não deve ainda dizer a que virá a partir de janeiro de 2007. Só não pode é querer que o eleitorado funcione no seu ritmo e esteja disposto a esperar para tomar posição quando o candidato considerar conveniente.
Quanto à indiferença que o candidato do PSDB detecta no eleitor, soa um tanto apressada e desrespeitosa sua avaliação, porque há muita gente, além de "políticos e jornalistas", interessada no assunto, querendo ouvir mais que frases de efeito ditas aqui e ali sem expressar um pensamento com começo, meio e fim.
Não fosse assim, seu partido não estaria exclusivamente dedicado ao tema há pelo menos dois anos, desde que ficou perceptível a possibilidade de derrotar Lula, nem teria achado por bem lançar candidato três meses antes do prazo oficial.
Geraldo Alckmin não presta exatamente uma homenagem ao eleitor quando o reduz à condição de mero telespectador ou, pior, de consumidor de propaganda eleitoral. A formação de juízos para a decisão dos votos tem outros componentes e, não por outra razão, os candidatos presidenciais começam a se relacionar com a sociedade com bastante antecedência.
A campanha de 2002 foi um exemplo: o eleitorado tentou Roseana Sarney por volta de abril, ensaiou preferência por Ciro Gomes um pouco depois e, quando começou a campanha na televisão, o terreno estava pronto para Duda Mendonça manipular, com formas exuberantes e conteúdo zero, emoções já firmemente dispostas a embarcar na nave da esperança.
Alckmin, ao que se sabe, não vai repetir a mágica. Pode até pretender se valer mais à frente do mau juízo que o eleitorado porventura fizer do governo Lula e talvez isso baste para ele se eleger. Mas não será suficiente para governar.
Dora Kramer