23.4.06

Jefferson e os tubarões

Jefferson: procurador deixou os tubarões de fora

Conhecido como o homem-bomba, o ex-deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) gostou do relatório apresentado pelo Ministério Público, que denunciou 40 envolvidos no escândalo do “mensalão”. Mas faz uma dura ressalva: para ele, faltaram os “tubarões” no texto do procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza. “Me admira a pressão para cassar o (Professor) Luizinho (PT-SP) com R$ 20 mil e o José Mentor (PT-SP) com R$ 120 mil, se os ministros levaram 25 vezes mais, 10 vezes mais, que esses que estão sendo acusados”, afirma Jefferson, em entrevista exclusiva a Agência Nordeste. Entre os tubarões estaria o ex-ministro da Integração Nacional, Ciro Gomes, que segundo ele, foi beneficiado pelo caixa dois do empresário Marcos Valério com R$ 500 mil, recebidos pelo então tesoureiro de sua campanha, Márcio Lacerda, que depois virou secretário executivo do ministério da Integração.

Roberto Jefferson não vê hoje mais clima para o impeachment de Lula. No seu entender, a oposição perdeu uma grande oportunidade de abrir um processo de impedimento contra Lula no dia em que o publicitário Duda Mendonça confirmou a CPI dos Correios que recebeu R$ 10,5 milhões em contas no exterior. “Ali era a hora do impeachment, porque até o PT estaria de acordo com isso”, garantiu. Sobre a blindagem de Lula, Roberto Jefferson está convencido de que o presidente Lula (PT) não foi afetado pela crise política do seu governo. “O eleitorado, principalmente as classes mais baixas, tem uma visão que todo político é ladrão. Essa é uma sentença que está na cabeça do povo há muitos anos”, analisa. Ele acredita que Lula pode ser reeleito em cima do discurso da opressão das classes operárias pelas elites. “É nessas divisões de classes que o PT joga em cima: é o operário perseguido pelas elites”, resume.


Agência Nordeste - O Ministério Público produziu o relatório dos “quarenta ladrões” e praticamente confirmou tudo que o que o senhor havia denunciado. Está confirmado o mensalão?


Roberto Jefferson – O relatório da Procurador Geral da República (Antonio Fernando de Souza) retrata 80% daquilo que foi denunciado por mim e apurado pela CPI dos Correios.



AN - Há uma piadinha na oposição de que falta o Ali Babá dos 40 denunciados pelo MP. Seria o presidente Lula?


RJ - O povo está dizendo isso. Eu tenho lido muitas cartas dos leitores aos jornais e sempre a figura que aparece como Ali Babá é a do presidente Lula. Já o José Dirceu é o chefe direto da quadrilha e do bando. Ele é chamado pelo procurador de chefe da quadrilha e bando. É assim mesmo, o que diz o Código Penal.



AN – Se não estivéssemos tão próximos das eleições, um relatório como esse do Ministério Público poderia provocar imediatamente um processo de impeachment?


RJ – Eu penso que o impeachment perdeu o seu momento político. Ele pode pedir o impeachment de maneira judicial ainda, mas seria mais lento. O momento certo, ao meu ver, para o impeachment, foi durante a confissão do publicitário Duda Mendonça, que disse, aos olhos atônicos do País, que recebera todas as contas da campanha do presidente Lula e dos senadores e deputados do PT em Paraíso Fiscal fora do Brasil. De modo que aquela bancada enorme do PT foi em prantos ao plenário dizendo: O PT acabou, o PT acabou. Foi aquele choro enorme. Ali era a hora do impeachment, porque até o PT estaria de acordo com isso. Mas todo mundo quis preservar o presidente Lula, que é um homem pobre, operário que chegou ao Governo e o momento político não veio mais.



AN – Então, naquele momento, a oposição foi incompetente?


RJ – Foi incompetente ou julgou mal o episódio político. Não querendo uma luta aberta, mas radicalizada com o presidente Lula e o PT, a oposição esperou que ele sangrasse. E o presidente do PFL, senador Jorge Bornhausen (SC), disse que ele sangraria e morreria antes de chegar às eleições. Mas parece que o presidente Lula está tendo um público muito forte lhe sustentando, de acordo com os resultados das pesquisas.



AN – A estratégia do sangramento foi errada?


RJ – Erraram naquele momento na estratégia. E pelo que eu entendo bem, o presidente Lula não sofrerá nenhum processo de impeachment.



AN – A Câmara ofereceu mais uma pizza, ao salvar José Mentor. Como é que o senhor avalia?


RJ – O Congresso Nacional não julgou o crime de responsabilidade dos ministros. O (ex-ministro da Integração Nacional) Ciro Gomes (PPS) tirou R$ 500 mil e foi o senhor Márcio Lacerda, seu então secretário executivo, que foi ao Banco Rural e assinou a retirada, e não houve nada contra ele. Não recebeu processo de improbidade administrativa e ficou por isso. Ele apenas demitiu o seu secretário executivo, o Márcio, que foi o seu tesoureiro na campanha presidencial. Essas coisas foram descobertas pela Polícia Federal, pela CPI e o Ciro ficou de fora. Ou seja, deixaram os tubarões de fora. Me admira a pressão para cassar o (Professor) Luizinho (PT-SP) com R$ 20 mil e o José Mentor (PT-SP) com R$ 120 mil, se os ministros levaram 25 vezes mais, 10 vezes mais, que esses que estão sendo acusados. Que há uma pizza há, mas nós já esperávamos isso desde o início.



AN – Então, Jefferson, os tubarões ficaram de fora? É isso?


RJ – Os tubarões ficaram de fora e mais uma vez se preservou a identidade dos doadores do caixa dois. Eles continuam encobertos. Se tem o operador, que é o Marcos Valério, o outro operador, que é o Delúbio (Soares, ex-tesoureiro do PT), e os homens que receberam a transferência desses recursos dos operadores. Mas os homens que fizeram os caixa dois, que depositaram na caixa do Delúbio, do Marcos Valério, continuam no anonimato e eu tenho a preocupação que eles possam fazer caixa dois de novo nas eleições que se avizinham e um outro mensalão, se for (eleito) o presidente Lula, porque ele vai ter muita dificuldade para governar e só fazendo outro mensalão para ele construir uma base parlamentar.



AN – O senhor acha que ficou alguém de fora do relatório do Ministério Público?


RJ – O Ministério Público não faz nenhuma referência aos ministros que estão na listas dos recebedores e dos grandes recebedores. O próprio ex-presidente do PSDB, Eduardo Azeredo (senador - MG), também não foi denunciado.



AN – Neste processo do mensalão só foi cassado o senhor, o José Dirceu (PT-SP) e o Pedro Corrêa (PP-PE). O senhor acredita que mais alguém vai ser cassado?


RJ – Eu acreditava que além de mim e do José Dirceu não ia mais ninguém. Porque nós vimos um grande acordo. E eu disse isso: para que duas cabeças fossem premiadas, a minha e a do José Dirceu para saciar a opinião pública e não aprofundar as investigações. Foi um acordo por baixo do pano entre o PSDB, o PT e o PFL. E a absolvição do Roberto Brant (PFL-MG) deixou claro o acordo do PFL com o PT para preservar o mandato do deputado, que recebeu também do valerioduto. Para mim, me admirou a cassação de Pedro Corrêa (PP-PE). Ele errou em não ter renunciado, mas ele foi cassado muito mais pelos erros passados do que por esse do mensalão. Pedro Corrêa já esteve, em duas ocasiões, à beira de ser cassado naquele processo de adulteração de combustível e depois de contrabando de carros. Ele teve duas vezes para ser cassado, mas foi salvo e agora acabou sendo cassado pelos erros do passado dele.



AN – O José Dirceu pegou um jatinho e foi até Juiz de Fora e convidou o ex-presidente Itamar Franco para ser vice de Lula. O senhor acredita que José Dirceu continua operando em nome do Governo?


RJ – Sim, em nome do PT nitidamente. Eu não tenho dúvida disso.



AN –Como é que o senhor explica a blindagem do presidente Lula?


RJ – Eu não consigo compreender como é que o Lula, com todos os homens de confiança importantes na lama e denunciados do Ministério Público Federal por formação de quadrilha, organização criminosa, como diz o Procurador. Eu não consigo compreender que ele se mantenha ainda em forma e distante do desgaste pela opinião pública e de um processo de responsabilidade criminal contra ele.



AN – Mas será que não é em função do programa Bolsa Família, já que os melhores índices dele são no Nordeste?


RJ – Eu não vejo só por isso não. O eleitorado, principalmente as classes mais baixas, tem uma visão que todo político é ladrão. Essa é uma sentença que está na cabeça do povo há muitos anos. E agora o raciocínio é inteiramente pragmático: um dos nossos, um operário está sendo acusado de corrupção. Nos outros governos sempre houve isso porque vão jogar o nosso no chão agora? É um raciocínio simples, mas é que vem prevalecendo nas camadas mais humildes.



AN – Um raciocínio muito perigoso, não é?


RJ – Mas é o que está prevalecendo. E eu conversei isso com pessoas que são profissionais de marketing. É um raciocínio muito claro. É nessas divisões de classes que o PT joga em cima: é o operário perseguido pelas elites.



AN – O senhor é autor de toda essa denúncia, de toda essa crise, mas como o senhor viu a quebra do sigilo do caseiro. Isso é muito mais grave do que o mensalão?


RJ – É uma espécie de Estado destituído. Foi decretado um estado destituído, foram suspensas as garantias e os direitos individuais feitas a partir da vontade monocrática deste bando que está no poder. Nós estamos vivendo um verdadeiro Estado de Sítio. O bando que está no poder, o bando do PT, que aparelhou o Estado Brasileiro o que é que está fazendo? Está perseguindo pessoas, que são devassadas em sua privacidade, a partir da Receita Federal, por grupos sindicais, ligados ao PT devassando a vida de pessoas, que são suas adversárias políticas no País. E agora o mais grave, um caseiro, um homem do povo, teve sigilo violado, invadido por este Estado de sítio. É uma coisa gravíssima nunca vista na história do País até hoje e que envolveu o ministro de Estado da Fazenda (Antônio Palocci) e o presidente da Caixa Econômica Federal e, mais tarde, com o conhecimento e o consentimento do ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos.



Já quando o ministro Palocci fez a quebra do sigilo, dois homens da maior confiança do ministro da Justiça testemunharam esse delito e depois esses dois homens, juntamente com o ministro da Justiça, se reuniram com o ministro Palocci e com um advogado criminal, o doutor (Antônio) Malheiros, para eles decidirem a forma do ministro Palocci sair fácil desse processo. E o pior: o ministro (Cezar) Peluso, indicado pelo Lula para o Supremo Tribunal Federal (STF) deferiu a cassação (do depoimento) do caseiro (Francenildo dos Santos Costa) dizendo que ele era um homem de pouca cultura e que ele teria pouco a acrescentar ao inquérito. Um absurdo e é até preconceituoso. Além de ter sua conta e sua vida devastada, a sua palavra foi cassada por uma sentença do ministro do Supremo Tribunal Federal.



AN – O senhor acha que ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, participou desse processo?


RJ – O (Antônio) Malheiros confessou isso à Imprensa. Ele foi chamado para ser o advogado do Palocci pelo ministro da Justiça. Você veja o contra-senso disso. A Polícia Federal é subordinada ao Ministério da Justiça. O inquérito, onde a Polícia Federal investiga o crime, é o ministro da Justiça que orienta. Pior: o ministro da Justiça, que é quem dirige a Polícia Federal, indica um advogado criminal a um indiciado pela Polícia Federal. Isso é gravíssimo. O ministro já deveria ter pedido demissão. E ele agiu assim com o (José) Genoino (ex-presidente do PT), ele arranjou um advogado para Genoino num processo que ele responde na Polícia Federal, ele fez o mesmo com o Delúbio (Soares, ex-tesoureiro do PT) num processo que ele responde na Polícia Federal. Ele não é um advogado da sociedade, ele é um advogado a serviço do PT. Ele está errado no papel dele de ministro da Justiça.



AN – Que candidato o senhor pretende apoiar na disputa presidencial?


RJ – Eu estou esperando ainda que surja uma terceira via. Estou muito cansado desta polarização paulista entre o PT e o PSDB. A mão direita dos banqueiros e a mão esquerda dos banqueiros. Eu estou fazendo uma ginástica para a gente ter uma candidatura, uma terceira via, que represente as forças de produção, a indústria, o comércio. Quero ver se surge uma candidatura aí, fora desse grupo aí de interesse financeiro dos bancos de São Paulo.



AN – Porque o ex-governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), não decola?


RJ – Porque ainda é muito precoce isso. Ele não se colocou. Ele não teve ainda uma exposição à mídia, em termos de debate, televisão. É muito cedo para dizer que ele não decolou.



AN – O presidente Lula tem condições de se reeleger?


RJ – Totais. Até agora não foi ameaçado.



AN – Mas quando começar a campanha eleitoral isso não muda?


RJ – Com as regras que foram votadas no Senado, que proíbe a divulgação dos episódios nas CPIs, acho muito difícil. Se essas regras permanecerem acho muito difícil a imagem ser afetada.



AN – Mas um segundo mandato do presidente Lula será muito mais grave do que é hoje, já que ele não teria uma base de sustentação sólida?


RJ – Se ele ganhar, acredito que a campanha vai ser muito sangrenta e vai deixar muitas seqüelas e vai fazer com que ele chegue muito machucado no segundo governo e com uma base de sustentação muito frágil. Ele vai tentar repetir, no segundo governo, o que Hugo Chavez faz agora na Venezuela.



AN – Na sua família, a sua filha é candidata?


RJ – Ela é candidata à deputada federal e meu genro, Marcos Vinícius, é candidato a deputado estadual. Cristiane Brasília, vereadora na cidade do Rio de Janeiro. É candidata pelo meu partido, PTB.



AN – E qual é a votação que o senhor espera para ela?


RJ – Não sei, mas eu ando nas ruas e tem um sentimento muito grande para se dar uma resposta ao que foi feito a mim. Porque o eleitor da minha cidade, o leitor do meu estado, o Rio de Janeiro, ele pensa da seguinte forma: o Roberto porque que você foi acusado de mentir sobre o mensalão, foi cassado, e todas as outras instâncias de investigação, a CPI e o próprio procurador da Justiça diz que o mensalão houve e que o mensalão aconteceu? Eu tenho que dar uma resposta à injustiça que você sofreu em relação ao mensalão. Vamos votar na sua filha, vamos votar no seu genro. É o que eu tenho ouvido muito nas ruas do Rio de Janeiro.



AN – Como é que o senhor se sente depois de isso tudo? O senhor se sente uma espécie de herói que passou para o País toda essa roubalheira, toda essa corrupção?


RJ – Não, eu não sou herói. Eu apenas não permiti que tentassem colocar no meu colo o crime que eu não cometi. Eu não sou vilão. Quando eu denunciei ao presidente Lula e disse: presidente Lula o mensalão vai explodir o senhor, é uma bomba embaixo da sua cadeira, houve o processo dos Correios de Maurício Marinho, que foi colocado pela Abin e pela Secretaria de Comunicação do Governo como se fosse um homem meu, de minha confiança, pegando R$ 3 mil na mão de alguns corruptores. Eu, para não virar um vilão nacional por um crime que não pratiquei, o que aconteceu: eu reagi. Não fiz como herói não. Eu fiz em legítima defesa para não sair do Congresso Nacional de cabeça baixa, desmoralizado. Eu fiz em nome da minha honra pessoa, da honra da minha família e em honra da minha cidade, em honra do meu Estado, que é o Rio de Janeiro.

Agência Nordeste