26.4.06

Brasil perde

Brasil perde a produção de carros de luxo

Pouco a pouco, a anunciada vocação brasileira para a produção de carros compactos e mais simples começa a tomar forma com a decisão tomada por grandes montadoras de importar modelos mais luxuosos das suas fábricas do México. A Ford já optou por essa estratégia. No segundo semestre será a vez da Volkswagen e General Motors está prestes a aderir.

Como alguns modelos médios já são importados da Argentina, às fábricas instaladas no Brasil caberá, cada vez mais, a missão de cuidar dos projetos dos carros pequenos. O estímulo à importação desses dois países é a isenção do Imposto de Importação, garantida por força dos acordos de intercâmbio comercial entre os governos.

Deixar de produzir modelos de luxo no Brasil não pode ser visto com preconceito para o presidente da Ford no Mercosul, Barry Engle. "A maior parte do crescimento do mercado mundial de automóveis daqui para a frente se dará nos segmentos de carros pequenos", afirma o executivo. "E o Brasil terá a oportunidade de expor essa sua especialidade", afirma.

A Ford apresentou ontem à imprensa o modelo mexicano Fusion, um sedã que será vendido a partir de R$ 80 mil. Isso quer dizer que essa montadora não tem mais a intenção de fabricar no Brasil clássicos como o Del Rey, um dos marcos da indústria automobilística brasileira na década de 80.

No segundo semestre, a Volkswagen começará a vender o Jetta, um mexicano montado sobre a plataforma da última geração européia do Golf e que chegará no Brasil a preços semelhantes ao Fusion. A Volks já traz do México o Bora, carro que custa em torno de R$ 60 mil, outro sedã derivado da geração do Golf ainda feita no Brasil, e também o New Beetle.

As japonesas Honda e Nissan importam do México os modelos sedãs de luxo Accord e Sentra, respectivamente. A GM se prepara para seguir o mesmo caminho. O presidente da montadora no Brasil, Ray Young, diz que está concluindo estudos para importar veículos mexicanos no segundo semestre. No caso, será o modelo Avalanche, uma picape de porte superior às produzidas no Brasil.

O México leva vantagem para atrair os investimentos da indústria automobilística nessas linhas mais sofisticadas pela sua localização, próxima aos Estados Unidos, que consomem esse tipo de veículo. A fábrica mexicana que produz o Fusion, da Ford, também abastece o mercado americano e poderá exportar para a Argentina.

A decisão de abandonar a fabricação de carros mais sofisticados no Brasil surgiu porque o carro popular ocupou a maior parte do espaço do mercado brasileiro. Os pequenos são donos de 80% das vendas no Brasil. Desses, 50% têm motor 1.0. Além desse fator, retrato do baixo poder aquisitivo da maior parte dos consumidores de automóveis no país, os carros mais luxuosos têm equipamentos sofisticados, como airbag e freios ABS, itens que encarecem a produção no Brasil porque são importados.

"Na década de 80, as exigências de qualidade e segurança não eram tão rigorosas, hoje temos que colocar mais valor num carro", diz o presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), Rogelio Golfarb. O dirigente lembra ainda que no passado, o mercado era dividido em menos fatias porque só havia quatro montadoras no Brasil. Isso facilitava a escala de produção de carros de luxo.

Para Golfarb, a possibilidade de importar sem impostos abre caminho para um mercado que não existiria no Brasil, caso as montadoras tivessem de trazer esses carros pagando a alíquota de 35%, válida para carros de regiões como Europa e Ásia.

Quando celebrado, em 2001, o acordo de intercâmbio comercial com o México previu a redução da alíquota do Imposto de Importação dos carros de 35% no Brasil e 23% no México para 8% em ambos. Na segunda fase, a tarifa foi extinta e manteve-se sistema de cotas anuais, que será eliminado neste ano. Portanto, o fim das cotas favorece ainda mais esse intercâmbio.

A indústria não fechou a balança comercial do setor com o México em 2005, segundo a Anfavea. Mas as exportações de veículos e de autopeças, que no ano passado somaram US$ 2,3 bilhões - 13,2% do total - estão bem acima das importações, segundo os executivos do setor.

A nova estratégia prevê incrementar a venda dos modelos mais luxuosos do México para o Brasil e ao mesmo tempo elevar ainda mais as exportações dos carros compactos brasileiros para aquele país. O México é o maior mercado para a Ford, que envia Fiesta, EcoSport e Ka. O Gol, da Volks, está entre os mais vendidos no México.

Esse novo mapa de do setor na América Latina mantém linhas de carros médios na Argentina. A Peugeot fabrica os modelos pequenos 206 no Brasil e a linha 307 na Argentina. A Ford manterá a linha do Focus na Argentina.
Valor

Nenhum comentário: