Nas áreas de fronteira, lei diz que militares têm poder de polícia.
Num simples telefonema da cidade de Pedro Juan Caballero para uma central telefônica, o integrante do PCC consulta seu "chefe", preso em São Paulo, sempre que necessário. As negociações são feitas sem passar pelas fronteiras. Dessa forma, sistematicamente planejam-se a compra e o tráfico de armas e drogas, a proteção de fugitivos e a lavagem de dinheiro nas casas de câmbio do Paraguai. A grave crise de segurança paulista tem, sim, um pé fincando a quilômetros de distância da capital e muito pouco tem sido feito para coibir essas ações.
A Polícia Federal é a principal responsável pela segurança das fronteiras, diz o artigo 144 da Constituição. Sabe muito sobre a movimentação das facções criminosas no lado paraguaio, age quando possível, mas confirma que só evita uma fração dos crimes transnacionais. "Duvido que se acabe com o crime nas fronteiras", admite o delegado Mauro Sposito, coordenador de Operações Especiais nas Fronteiras da Polícia Federal. "Os Estados Unidos têm 30 mil homens para vigiar 3 mil quilômetros com o México e mesmo assim eles não dão conta do recado."
O Exército poderia ajudar. Sua função essencial é garantir a soberania nacional, reza o artigo 142 da Carta. Qualquer mudança de rota, só sob ordens do presidente. A exceção é o artigo 17A da Lei Complementar 117 de 2004, que dá poderes de polícia aos militares nas áreas de fronteira. "A Lei 117 é autorizativa, está aí para ser usada, não preciso receber ordem de ninguém", diz o general Luiz Cesário da Silveira Filho, comandante Militar do Oeste. "Reúno a força de contingência e posso colaborar com as autoridades constituídas."
Se os militares podem atuar, por que não o fazem mais vezes?, questiona o juiz federal Odilon de Oliveira, com o gabarito de atuar há 15 anos no combate aos narcotraficantes da fronteira e ter condenado 114 deles. "Porque desmobilizaria a missão e descaracterizaria o Exército", explica o general Cesário. Segundo ele, o Comando Militar do Oeste, que protege uma extensão de 2.300 quilômetros de fronteira com o Paraguai e a Bolívia, tem atuado como força policial na medida certa com operações eventuais. O juiz Odilon contesta: "O Exército na fronteira não pode ficar aquartelado. Se houvesse barreiras fixas e volantes com soldados, os traficantes iriam se arriscar a passar?"
Por enquanto, o que ocorre marca a vida de pessoas como Marcos Dias de Barros, de 31 anos. Desempregado, aceitou ser mula para uma carga de 7 quilos de cocaína. Foi pego num posto da Polícia Rodoviária Federal, que não levou mais de 5 minutos para encontrar a droga escondida na lateral do carro. Estava com a mulher, os três filhos e o irmão. Acredita ter sido um "boi de piranha".
Enquanto o flagrante era feito, o que levou mais de duas horas, centenas de carros e caminhões circularam livremente pela rodovia. Iria receber R$ 1.500. Bem menos que os R$ 20 mil de outro caminhoneiro, que foi preso transportando 5,5 toneladas de maconha. Este último decidiu entregar os donos da carga e agora reza para ser transferido para bem longe dali.
Estadão
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