27.8.06

Lula e João Paulo

Na periferia, João Paulo exibe um Lula sem medo de ser companheiro

Comício de Osasco mostra filme de campanha em que presidente dá testemunho de admiração pelo deputado

"Eu já falei, vou repetir, é Lula lá, João Paulo aqui", brada a marchinha de campanha de João Paulo Cunha 1325 federal, a todo volume, na noite gelada do Jardim Conceição, periferia sul de Osasco, à beira da Rodovia Raposo Tavares, onde sua gente persegue há duas décadas o sonho dourado que são as escrituras e a posse definitiva dos terrenos e das casas que eles ergueram por essas ruas que sobem o morro.

Daqui a pouco João Paulo vai chegar - são 21 horas, quarta-feira -, para mais um Diálogo Cidadão, que tem jeito e formato de comício dos novos tempos, por ele criado para substituir o showmício agora sob veto da legislação eleitoral. Ao abrigo da tenda de plástico montada na Rua Nossa Senhora Aparecida, 150 militantes e moradores, muitos em roupas carcomidas e com os pés em chinelos de dedo, acomodam-se nas cadeirinhas brancas enfileiradas.

Os santinhos do candidato - João Paulo está bem na foto com Lula - correm de mão em mão enquanto são distribuídas cópias do Prestação de Contas, documento com dados sobre "propostas e realizações de um mandato popular e democrático". Todos cantam ao ritmo das duas caixas de som: "Eu já falei..."

Antes que João apareça, enfim, o jingle dá lugar a um filme e todos pregam os olhos na tela. O filme dura uns 7 ou 8 minutos e é revelador, porque ajuda a esclarecer o enigma do palanque do Pombal Santo Antônio, do outro lado da cidade, onde no domingo passado o presidente Lula fez comício para 6 mil e aparentemente deu as costas a João Paulo, em seus próprios domínios.

Ainda no palanque o presidente alertou sobre a importância de eleger uma bancada petista forte no Congresso, quando foi interrompido pela multidão que muito gritou por João Paulo. Lula esquivou-se e devolveu: "Se eu tivesse tanta gente gritando meu nome, já estaria eleito." Mas nem assim pronunciou o nome do ex-presidente da Câmara, talvez para não ter seu ligado a um personagem do mensalão.

João Paulo foi absolvido por seus pares, mas o Ministério Público Federal o denunciou formalmente à Justiça. Ele teria sacado R$ 50 mil do valerioduto, em setembro de 2003. O processo judicial está no início e o deputado terá oportunidade de se defender. A seus eleitores, explica que o Diretório Nacional do PT disponibilizou aquela quantia para contratar pesquisas de opinião relativas às eleições municipais de 2004.

O filme da campanha de João Paulo desmorona o faz-de-conta de Lula porque mostra que o presidente e o deputado continuam bons parceiros. São imagens da trajetória de João Paulo, desde a infância difícil até virar metalúrgico, ainda na adolescência, e depois vereador, deputado estadual e federal, e presidente da Câmara, em 2003, primeiro ano do governo Lula.

ELOQÜÊNCIA

É uma história comovente, apoiada em depoimentos, e o mais eloqüente deles da boca de quem? "Certamente a história saberá julgar o importante presidente da Câmara dos Deputados que você foi", declara o presidente Lula para, em seguida, cobrir de afagos o parlamentar. "Se tivesse um título de revelação política com certeza você o receberia, por seu comportamento e lisura, liderando a Câmara nos momentos mais difíceis."

A encenação de Lula no palanque do Pombal também cai por terra à medida que a campanha de João Paulo toma as ruas de Osasco e de outras 15 cidades ao redor - uma região que aloja 2 milhões de habitantes -, associando a imagem do presidente e a do deputado como velhos e bons companheiros, fundadores da agremiação, daqueles que não rezam a deslealdade.

É pujante a campanha de João, nas ruas desde julho com a Caminhada do Vermelho, que mobilizou 2 mil pessoas. Lideranças locais manifestaram seu apoio. Também deram o ar da graça Aloizio Mercadante, candidato do PT ao governo do Estado, Eduardo Suplicy, que busca a reeleição para o Senado, e o prefeito da cidade, Emídio de Souza (PT). Uma campanha digna de político com borderô que não sabe o que é o vermelho - a estimativa de valor máximo de gastos com ele chega a R$ 2,5 milhões, segundo declaração do PT ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

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