Proposta do governo para 2007 tem incompatibilidades com promessa de cortar impostos e ampliar investimentos
A proposta do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para o orçamento do próximo ano desmente as promessas do candidato Lula. Dependendo da platéia, o Lula candidato promete cortar impostos, gastar menos com a gestão do governo, reduzir o déficit da Previdência, aumentar verbas para os programas sociais e ampliar investimentos para melhoria das estradas e portos.
Nenhuma dessas promessas, no entanto, está espelhada na proposta orçamentária para o próximo ano - nunca o orçamento foi tão peça de ficção. Lula promete, mas o orçamento não prevê recursos para sustentar tantas iniciativas para o primeiro ano de um segundo mandato, caso seja reeleito.
No caso dos impostos, embora o desejo do candidato Lula seja o de reduzir o peso dos tributos, o projeto do orçamento, enviado para o Congresso, explicita aumento da chamada carga tributária. Em 2006, tudo o que a Receita recolheu atingiu valor equivalente a 17,24% do Produto Interno Bruto (PIB). No ano que vem, segundo o orçamento de Lula presidente, a carga subirá para 17,41% do PIB, crescimento de 0,17% do PIB.
Quando Lula assumiu o governo, em 2003, os impostos arrecadados pela Receita (considerando-se, apenas, impostos e contribuições federais) correspondiam a 16,3% do PIB (algo em torno de R$ 24 bilhões à época). Ou seja, houve aumento de um ponto porcentual do PIB, a despeito da garantia do presidente de que, em seu governo, não haveria aumento de impostos federais (com novas alíquotas) ou da carga tributária. O parâmetro de comparação sempre foi o último ano do governo Fernando Henrique Cardoso, em 2002. O compromisso de Lula era tal que a equipe econômica chegou a estabelecer como meta que a carga federal não passaria de 16% do PIB em 2006. Ou seja, cairia em relação ao patamar deixado por FHC.
No governo Lula houve o aumento da carga federal e também da que mede o total dos impostos pagos no País, seja para União, para Estados e para municípios. Essa carga total passou de 35,5% do PIB no último ano do governo Fernando Henrique para 37,37% do PIB, em 2005. O maior aumento foi responsabilidade da União. Este ano, ela deverá bater novo recorde e a proposta orçamentária indica que ela também subirá no próximo ano.
O candidato Lula também garante aos eleitores que é preciso reduzir o déficit da Previdência nos próximos anos. A proposta de orçamento para 2007 do Lula presidente, no entanto, prevê novo aumento desse déficit, que passará de 1,95% do PIB este ano para 2,02% do PIB. Dificilmente essa promessa poderá ser cumprida por Lula, se ganhar o direito de mais quatro anos de mandato.
O programa de governo do candidato, apresentado pelo PT, prevê que o salário mínimo terá aumentos acima da inflação nos próximos quatro anos. A concessão desses aumentos vai agravar ainda mais o rombo das contas da Previdência, caso o governo não seja bem-sucedido em ampliar a arrecadação da contribuição previdenciária. Isto porque a maioria dos aposentados ganha o correspondente a um salário mínimo.
A redução das despesas de custeio da máquina administrativa, outra promessa do candidato Lula, terá que ser adiada. Mais uma vez, a proposta orçamentária desmente a boa intenção e prevê elevação desses gastos, provocada, principalmente, pelos aumentos de salários dados aos servidores pelo presidente Lula às vésperas das eleições. Os gastos com salários do funcionalismo da União crescerão R$ 11,7 bilhões em 2007, em comparação com 2006. Essa despesa extra é muito superior ao gasto previsto com o programa Bolsa-Família este ano, que é de R$ 8,6 bilhões.
Da mesma forma, a ampliação dos investimentos em infra-estrutura, prometida pelo candidato, está ameaçada pela falta de dinheiro. A promessa de investir R$ 17,6 bilhões em 2007 só poderá ser cumprida se a economia, de fato, crescer os 4,75% estimados pelo governo na proposta orçamentária. Se o crescimento for menor, como acredita a maioria dos analistas do mercado, a arrecadação também será menor e o governo será obrigado a cortar parte dos investimentos. Com os cortes, o total investido poderá ficar abaixo do executado este ano.
Nem o carro-chefe da campanha eleitoral, o Bolsa-Família, que foi turbinado nos meses pré-eleição, vai escapar de um regime. O governo não terá alternativa a não ser reduzir as despesas. Em 2006 serão aplicados R$ 8,3 bilhões, 0,40% do PIB. Para o próximo ano a estimativa é limitar o gasto a 0,36% do PIB, cerca de R$ 8,6 bilhões. Em reais, o valor para 2007 é maior, mas o acréscimo não repõe sequer a inflação de 4,5 % estimada para o próximo ano.
Estadão
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