Disse o ministro das Relações Institucionais, Tarso Genro, que o presidente Lula está preparado para se reeleger tanto no primeiro quanto no segundo turno. Se tivesse maior sensibilidade para captar o recôndito da alma presidencial, certamente o ministro entenderia que Lula, embora não se aborreça se ganhar no primeiro, tem sólidos motivos para preferir muito mais sua reeleição no segundo turno.
Antes de mais nada, Lula bem sabe o quanto representa a necessidade de trabalho e emprego nos dias que correm. E o segundo turno nas eleições presidenciais significa mais um mês de trabalho para milhares de pessoas. Os que têm a função de elaborar os programas do horário gratuito no rádio e na televisão - produtores-executivos, diretores, roteiristas, cenógrafos, cinegrafistas, figurinistas, continuístas, músicos, sonoplastas, locutores, pesquisadores, etc.; os incumbidos dos materiais gráficos e têxteis de propaganda, tais como desenhistas, produtores de cartazes, bandeiras, banners, camisetas, bonés, etc.; os encarregados e operadores de equipamentos de som, de transporte, de telemarketing, de logística, os merendeiros, panfleteiros, seguranças, motoristas, enfim, há batalhões de profissionais que, caso a eleição se definisse já no primeiro turno, perderiam repentinamente uma importante - mesmo que temporária - fonte de rendimento.
O segundo motivo relevante para Lula preferir o segundo turno é o da governabilidade. Confirmando-se as previsões segundo as quais o Partido dos Trabalhadores (por sabidas razões) estará minguado depois das próximas eleições, se Lula se reeleger precisará construir uma sólida base de apoio multipartidário, sob pena de ter de afundar-se, de novo, no sistema de cooptação via mensalão. Ora, que melhor ajuste em prol da governabilidade haveria do que aquele negociado em função dos indispensáveis apoios para o sucesso eleitoral no segundo turno? O aliado do segundo turno vale mais que o do primeiro, porque é uma força nova, agregadora, com a motivação de quem salta da derrota para a parceria na vitória, com base no sábio mandamento do sucesso, que é o if you can't beat him, join him.
O terceiro motivo é o da credibilidade, que Lula precisa conectar à sua popularidade - características essas que não se confundem, visto que a ocorrência de uma não implica a existência da outra, mas ambas são necessárias para o êxito de qualquer político, especialmente um chefe de Estado e de governo. Essa credibilidade só poderá ser recuperada quando o eleitor perceber que aquele que pretende continuar exercendo o mais elevado cargo da República está agora, de fato, mais preparado para a função, sob o ponto de vista dos conhecimentos adquiridos, da experiência acumulada, do comportamento ético adotado e de tudo o mais que exija demonstração direta e ao vivo, perante o eleitorado, sem a ajuda dos textos alheios lidos no teleprompter ou dos truques mirabolantes engendrados pelos marqueteiros. Quer dizer, é a credibilidade que deriva da imagem da sinceridade não representada, da competência não fingida e da capacidade de raciocínio que só se comprova nos momentos inesperados dos debates, na superação das dificuldades causadas pelas perguntas, réplicas e tréplicas dos adversários, dentro da prática essencialmente democrática do debate público-político.
Certamente o presidente Lula não se contentará em ser reeleito apenas em razão do 'puro assistencialismo' do Bolsa-Família, 'que não liberta ninguém da miséria', apesar de significar 'tutti votti garantiti' de dezenas de milhões, como a ele se referiu o companheiro Frei Betto em entrevista recente ao Corriere Della Sera. Um presidente da República 'que agora conhece o mundo e o mundo o conhece', além de votado, tem de ser respeitado. E para voltar a ser respeitado o presidente precisa de mais tempo - pelo menos um mês - para explicar ao País e ao mundo o significado preciso das frases que pronunciou durante seus primeiros quatro anos de gestão, tais como:
'Eu gostaria de ter estudado latim, assim eu poderia me comunicar melhor com o povo da América Latina.'
'A grande maioria de nossas importações vem de fora do País.'
'Se não tivermos sucesso, corremos o risco de fracassarmos.'
'Uma palavra resume provavelmente a responsabilidade de qualquer governante. E essa palavra é 'estar preparado'.'
'O futuro será melhor amanhã.'
'Eu mantenho todas as declarações erradas que fiz.'
'Nós temos um firme compromisso com a Otan. Nós temos um firme compromisso com a Europa. Nós fazemos parte da Europa.'
'Um número baixo de votantes é uma indicação de que menas pessoas estão a votar.'
'Nós estamos preparados para qualquer imprevisto que possa ocorrer ou não.'
'Para a Nasa, o espaço ainda é alta prioridade.'
'Não é a poluição que está prejudicando o meio ambiente. São as impurezas no ar e na água que fazem isso.'
'É tempo para a raça humana entrar no sistema solar.'
Ninguém duvida da sinceridade do presidente quando ele afirma que a maior de todas as suas prioridades é a educação. Mas, como se sabe, um exemplo vale mais do que mil palavras. Ao explicar o sentido das mencionadas frases, o presidente provavelmente estará ilustrando, melhor do que ninguém, o verdadeiro significado do milagre da educação. Por tudo isso, é dever dos que desejam a recuperação do respeito e da governabilidade do presidente Lula votar em outro candidato presidencial, para que por meio do segundo turno se organizem melhor as forças que possam dar efetiva sustentação político-parlamentar ao que comandará os destinos da Nação nos próximos quatro anos.
Mauro Chaves é jornalista, advogado, escritor, administrador de empresas e produtor cultural. E-mail: mauro.chaves@attglobal.net
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