O Conselho de Controle das Atividades Financeiras (Coaf) só dança conforme a música e no ritmo que o músico escolheu tocar. Criado para detectar operações criminosas de lavagem de dinheiro, no caso dos saques milionários feitos por Marcos Valério o Coaf não tocou nem dançou por muito tempo. Só foi para o salão dois anos depois - e mesmo assim pressionado pelas denúncias de escancarada omissão. Já no caso do caseiro Francenildo Santos Costa, o Coaf chegou a ensaiar os primeiros passos, mas foi atropelado pela Caixa Econômica Federal, que agiu mais rápido apresentando o próprio extrato bancário do caseiro. Agora, no caso do dossiê falso, tal como no episódio Marcos Valério, o Coaf voltou a não ouvir a música, ficou surdo ou o músico toca num ritmo lento e muito baixinho, justamente para não ser ouvido. É muito provável que assim siga até as eleições ou, quem sabe, até ser produzida uma versão para o dossiê falso que livre do caso o presidente da República. Tarefa nada fácil, visto que os operadores do dossiê eram pessoas que desfrutavam do cotidiano e da intimidade de Lula.
Com o título O Coaf nada fez contra Valério, publiquei neste espaço, em 3/7/2005, artigo denunciando a omissão desse conselho em relação aos milionários saques em dinheiro feitos pelas empresas de Marcos Valério. O Coaf escondeu as informações durante dois anos e não as enviou ao Ministério Público para investigação, como manda a lei. Mais que provado, ficou escancarado o acobertamento do governo no caso e comprovado o uso político de uma instituição pública em favor das atividades criminosas da parceria PT-Valério. Ao tomar conhecimento de que a deputada juíza Denise Frossard (PPS-RJ) encaminhara representação contra o Coaf ao Ministério da Fazenda, o ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, chamou-a a seu gabinete e prometeu que a omissão não se repetiria, o Coaf seria reformulado para funcionar com rapidez e eficiência na identificação de operações financeiras criminosas. A deputada procurou esta articulista, logo depois, dizendo-se feliz por terem o artigo citado e sua representação produzido resultado positivo.
Não completara um ano a primeira decepção: o ex-ministro Antonio Palocci acionou o Coaf para ter acesso à movimentação bancária do caseiro Francenildo Santos Costa. Não se tratava de nenhuma investigação criminosa, mas de bisbilhotagem da vida financeira de alguém que deixara Palocci mal em entrevista concedida ao Estado - uma tentativa de desqualificar as revelações do caseiro. Mas, como o Coaf não chegou a obedecer às ordens de Palocci, restou a dúvida: vai ver o ministro da Justiça fez cumprir a promessa feita à deputada Frossard e o uso político do Coaf é coisa do passado.
O que dizer, agora, no caso do dossiê falso? A Polícia Federal (PF) identificou os bancos e as agências bancárias onde foram feitos os saques em dinheiro, no valor de R$ 1,75 milhão, para dois operadores do PT “comprarem” o dossiê falso. Essa informação é mais do que suficiente para o Coaf identificar os titulares das contas bancárias e os nomes dos sacadores. Mas o conselho não agiu, como no episódio Marcos Valério-PT-mensalão, escondeu as informações alegando não ter tido tempo para verificar os saques. E precisa de tempo?
A desculpa é tão fajuta quanto o dossiê. Simplesmente porque o Coaf possui as informações desde a semana passada, quando o dinheiro foi retirado dos três bancos, e tem condições de identificar os titulares das contas e os sacadores em minutos. Basta querer. Funciona assim: todos os bancos em operação no País são obrigados a comunicar ao sistema de informações do Banco Central (BC) - Sisbacen -, online, todas as operações de saques em dinheiro com valor acima de R$ 10 mil e o BC é obrigado a repassá-las imediatamente ao Coaf. Manda a regra que o Coaf examine os saques e encaminhe os que julgar suspeitos ao Ministério Público para abertura de investigação e inquérito. Se a PF já identificou os bancos e até as agências bancárias por onde circulou o dinheiro sujo do PT, o trabalho do Coaf ficou ainda mais facilitado. Só não revela os nomes dos implicados se não quiser ou recebeu ordens superiores.
O Coaf está subordinado ao Ministério da Fazenda e há uma promessa do ministro da Justiça de não permitir seu uso político. Será que os dois ministros preferem dançar a dança da pizza?
*Suely Caldas é jornalista. E-mail: sucaldas@terra.com.br
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