9.6.07

A volta do irmão-problema

Juliana Linhares para Veja

Está difícil acompanhar o ritmo que a Polícia Federal imprimiu nos últimos tempos. A cada quinze dias, é deflagrada uma nova operação, sempre de nome pitoresco. A da semana passada, intitulada Xeque-Mate, que colocou no xadrez oitenta integrantes de uma quadrilha que explorava e vendia ilegalmente máquinas caça-níqueis, criou um constrangimento para o presidente da República. Genival Inácio da Silva, o Vavá, irmão mais velho de Lula, teve a casa vasculhada por agentes da PF e foi indiciado por "tráfico de influência no Executivo" e "exploração de prestígio no Judiciário". Em reportagens publicadas em outubro de 2005, VEJA contou a seus leitores como Vavá, usando de seu parentesco com Lula, tentava intermediar negócios entre empresários e órgãos do governo federal. A reportagem foi rechaçada com as condenações habituais, entre elas a de ser mostra do "preconceito das elites" contra os petistas. Agora, a operação da PF não só confirma o que VEJA havia apurado com rigor como levanta a suspeita de que os negócios de Vavá ultrapassaram a fronteira da falta de ética para adentrar o território da criminalidade.

Outro embaraço para Lula é que, entre os detidos, há um compadre seu, o petista Dario Morelli. Assessor da prefeitura de Diadema até ser preso, ele faz parte do círculo mais íntimo do presidente. É um dos "faz-tudo" que servem à família de Lula, assim como Freud Godoy, aquele do caso do dossiê contra os tucanos. Morelli é ligado ao ex-deputado José Dirceu, de quem foi segurança na campanha de 1994. A amizade com Lula e Marisa data de vinte anos, aproximadamente. Numa ocasião, Morelli chegou a registrar um boletim de ocorrência sobre o roubo de um celular de Marisa. Em retribuição à sua dedicação, Lula tornou-se padrinho de um dos filhos do "faz-tudo" e o ajudou a conseguir empregos em administrações do PT.

As investigações da Polícia Federal indicam que Vavá e Morelli têm relações estreitas com integrantes da quadrilha dos caça-níqueis. O empresário Nilton Cezar Servo, apontado como chefe da máfia, é amigo dos dois. Em um depoimento à PF, um ex-funcionário de Servo diz que o empresário repassava a Vavá quantias que chegavam a 3.000 reais. A polícia trabalha com a hipótese de que o irmão do presidente fazia a aproximação com autoridades do Executivo e do Judiciário capazes de garantir a impunidade desse pessoal. Nos últimos anos, sem regulamentação, o negócio dos caça-níqueis transitou pela zona cinzenta da ilegalidade e sobreviveu à custa de liminares. A PF pediu a prisão de Vavá, mas a Justiça negou o pedido, por entender que o tráfico de influência não chegou a beneficiar a quadrilha.

Lula, que estava em visita à Índia, concedeu o benefício da dúvida ao irmão. Para o presidente, Vavá "não tem cabeça para fazer lobby". Diz um deputado petista de São Paulo: "Convivi com ele. Trata-se de um bronco, não tem estofo nem contatos suficientes em Brasília. Na verdade, conseguiu enrolar alguns empresários dizendo que, por ser irmão de Lula, abria portas no governo". De fato, chamar o irmão do presidente de lobista pode ser exagero – o que não afasta a possibilidade, ainda pendente de maiores investigações, de que Vavá tenha efetivamente cometido algum tipo de crime.

Em 2005, VEJA noticiou que ele havia aberto um escritório em São Bernardo do Campo para intermediar demandas de empresários junto ao poder público. Tudo o que se sabe desse período é que conseguiu fazer com que César Alvarez, assessor especial da Presidência, se reunisse com representantes da Federação Brasileira de Hospitais, então credora de uma dívida de 580 milhões de reais com a União. E que, também por intervenção de Vavá, o chefe-de-gabinete de Lula, Gilberto Carvalho, recebeu o empresário português Emídio Mendes, cujo interesse era fazer parcerias com a Petrobras. Dias após a publicação das reportagens de VEJA, Vavá abandonou o escritório. Um mês depois, as chaves do imóvel, que era alugado, foram devolvidas ao proprietário. Mas, pelo visto, ele continuou a atuar, só que em zonas de mais penumbra. A partir de escutas telefônicas, a polícia descobriu que Vavá, Morelli e Servo se falavam freqüentemente. Suspeita-se de que os dois primeiros, além de prestar serviços a Servo, tinham sociedade em casas de jogo na região do ABC paulista. "Aqui, todo mundo sabe que Vavá e Dario são sócios", disse a VEJA um vereador de Diadema. O irmão do presidente Lula é mesmo um problema tamanho-família.

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