12.6.07

Ditadura empregou guerrilheiros

Um dos expoentes do primeiro escalão do regime militar, o ex-ministro e ex-senador Jarbas Passarinho joga luzes num dos maiores mistérios envolvendo esquerda e direita nos chamados anos de chumbo.
Em entrevista ao Jornal do Brasil, Passarinho revela detalhes que reforçam a suspeita de que ainda estão vivos alguns guerrilheiros do Araguaia que hoje - 32 anos depois do fim do conflito - freqüentam todas as listas de desaparecidos políticos.

-Recebi, em 1973, um pedido do Bandeira (general Antônio Bandeira, ex-chefe do Comando Militar do Planalto, já falecido) para dar emprego a cinco guerrilheiros arrependidos - lembra Passarinho.
- Eram todos jovens e foram empregados no Setor de Comunicação do Ministério da Educação e Cultura quando eu era o titular da pasta.

O assunto foi tratado à época como segredo militar, para proteger a decisão de Bandeira, e, ao mesmo tempo, garantir a privacidade dos ex-guerrilheiros. A possibilidade de ex-guerrilheiros estarem vivos alimenta boa parte dos pesquisadores que se dedicam às investigações sobre o período da luta armada. O mistério encontra respaldo na falta de informações sobre o paradeiro de 154 guerrilheiros que desapareceram entre 1968 a 1975 - 58 deles ativistas recrutados pelo PCdoB que desapareceram na Guerrilha do Araguaia.

Passarinho tem três certezas sobre o pedido de Bandeira: eram cinco homens, estavam arrependido e tinham sido presos no Araguaia.

- Lembro que o Bandeira estava convencido de que os jovens haviam se arrependido mesmo e que queriam, sinceramente, mudar de vida - relata o ex-ministro.

O episódio teria ocorrido em 1973, uma época em que o grupo de oficiais que Passarinho diz ter formado um comando paralelo no Araguaia não fazia mais prisioneiros - era o começo do massacre dos militantes do PCdoB. Passarinho diz que nunca soube os nomes dos guerrilheiros. Lembra que, depois de terem sido apanhados na área da guerrilha, foram transferidos para o Pelotão de Investigações Crimi nais (PIC), em Brasília, onde passaram por sessões de interrogatório até serem ouvidos pelo general Bandeira.

Anticomunista radical, o general tinha predileção por longas conversas pessoais com guerrilheiros presos, mesmo aqueles de quem nunca mais se ouviria falar. Passarinho afirma que encaminhou os nomes a uma servidora responsável pelas revistas que o MEC editava e esta providenciou a lotação dos novos funcionários do governo militar. Segundo Passarinho, mais tarde um deles foi encaminhado para um jornal de Brasília, onde teria trabalhado como jornalista.

Passarinho diz que foi ele mesmo quem pediu a um dos diretores do jornal o emprego para o rapaz.

- Desde que deixei o MEC nunca mais soube o que aconteceu com eles. Devem estar por aí - diz o ex-ministro.

A jornalista Myrian Alves - que há anos pesquisa o tema e recolhe dados para uma biografia do italiano Líbero Giancarlo Castiglia, o Joca, único estrangeiro entre os militantes do PCdoB a combater na guerrilha - diz que as dúvidas sobre a existência ou não de sobreviventes são reforçadas pela falta de informações sobre o destino de guerrilheiros que foram vistos vivos pela população e sobre os quais não há, nos relatórios da esquerda ou em documentos militares pesquisados, qualquer tipo de informação sobre o destino que tiveram.

- De fato, suspeita-se que alguns possam estar vivos - diz ela. Quem se debruça sobre o assunto evita citar nomes para não causar expectativa entre familiares de desaparecidos políticos. Em conversas reservadas com oficiais que participaram de recentes discussões sobre desaparecidos, os pesquisadores sempre ouvem o velho bordão "nada a declarar" quando pedem informações sobre nomes de guerrilheiros que podem estar vivos.

Jornal do Brasil

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