por ROBERTO JEFFERSON
Escancarei o mensalão. O governo não viu, não sabia, não ouviu. Exatos dois anos depois, o que temos? Manchetes sobre corrupção
O DIA 6 de junho é um marco. De vergonha. Neste dia, há exatos dois anos, em entrevista à Folha de S.Paulo, escancarei ao Brasil o esquema de aluguel de parlamentares pelo PT -o mensalão. O país mergulhou em uma de suas mais graves crises políticas. À frente do processo -e no seu pedestal carcomido de vestal-, o PT.
Fui criticado e cassado. O governo não viu, não sabia, não ouviu. Exatos dois anos depois, estampadas na Folha, o que temos? Manchetes sobre corrupção. O que antes era visto como sujeira dos pequenos partidos, ávidos por migalhas, hoje respinga em todas as siglas, derrubando ministros, ex-governadores, delegados de polícia e procuradores. A Navalha corta a carne de muitos. Saímos das cuecas e malas pretas para esquemas sofisticados de uso de recursos públicos. Novamente, o governo não viu, não sabia, não ouviu.
Na rua, sempre me perguntam por que protegi o Lula. Ainda nesta semana, em Brasília, fui questionado por um senhor: "Por que não acabou com tudo, de uma vez?". Respondi: ative-me ao que presenciei. O que poupei no passado, para minha tristeza, se desmancha no presente.
Lula ganhou a primeira eleição com prática inversa ao discurso. Dizia: "Fora, FMI" e já tinha acertado com a instituição; batia nas altas taxas de juros e estava comprometido com os banqueiros. Tinha discurso socialista, mas fez e faz governo populista (Bolsa Família e muita retórica), com 60% de aprovação do povão. É um operário que perdeu o dedo no torno e conta com o apoio do grande capital. Há candidato melhor?
Lula confundiu o cenário quando migrou para o centro do espectro político e passou a defender teses econômicas que condenou na gestão Fernando Henrique. Imaginávamos uma guinada à esquerda, mas ele optou pelo centro -aquietou o mercado. Foi mais radical que FHC: o impulso reformista se esvaziou no primeiro ano. Não houve nem há ideologia. É toma lá, dá cá.
Se no mensalão o "líder do governo" era o "Carequinha de Belo Horizonte", que gerava os "argumentos reais" para manter a base afinada no Congresso, agora o "líder" é Paulo Lacerda, diretor-geral da Polícia Federal, que constrange aqueles que tentam criar embaraço, exigindo mais do que o governo está disposto a ceder, como vinha fazendo o PMDB.
Resultado: navalhada na carne, os peemedebistas ficaram sem o PAC -52% dos recursos são da esfera do Ministério de Minas e Energia. E tome operações midiáticas. O povão vai ao delírio. O PT não mudou, apenas trocou PTB, PR e PP pelo PMDB. A crise moral de hoje é igualzinha à anterior. O Brasil está doente.
Lula surfa nas crises e todos estão com ele. Até a oposição. O que os une? O desavisado concluiria: um projeto de nação! Não. Lula tem é projeto político. Movimenta-se para fazer o sucessor e voltar -em 2014? Com uma concentração brutal de arrecadação nas mãos do Estado, ele tem a chave do cofre e sabe usá-la. Até o PSDB mudou. Envergonhou-se das privatizações. Geraldo Alckmin usou o uniforme dos Correios, o chapéu do Banco do Brasil e o escudo da Petrobras.
Fez como o adversário. O Brasil precisa de um partido conservador moderno, com coragem de defender as privatizações e acabar com o baronato. Vamos rediscutir o papel do Estado. Sem medo. Da "excelente" política fiscal de Lula o que resultou? Respondem os ex-empregados do setor gaúcho de calçados, da indústria têxtil, de eletrodomésticos etc. Teremos como competir com China, Índia? PAC? Que piada!
Na esteira do casamento de cobras e lagartos, rentistas e socialistas, a renda da classe média, acima de três mínimos, caiu 46% nos últimos seis anos. Há um saldo negativo de 2 milhões de empregos no período.
Os governos supostamente de esquerda na América Latina são uma grande fraude. Empresas e bancos estatais se tornaram aparelhos partidários do poder. Lula suprimiu direitos de aposentados e pensionistas, mas se nega a avançar na privatização das estatais, lugar de negócios e cabide de empregos da esquerda dirigente. Devemos caminhar para o parlamentarismo, fazer a reforma política, ter fidelidade partidária.
Vamos reformar o capital, enfrentando os rentistas. Privatizar as estatais e defender as leis sociais do trabalho e da Previdência. O PTB, que presido, pretende se firmar como um partido de centro-direita. Mas vai seguir esse caminho de forma institucionalizada, lembrando seus compromissos históricos com o trabalho.
O céu de brigadeiro na economia mundial nos poupa de uma crise econômica. O governo Lula é uma bóia ao sabor da correnteza em praia do Caribe. Mas o Triângulo das Bermudas está logo ali. Fiz a minha parte. Agora é a vez de vocês.
ROBERTO JEFFERSON, advogado, é presidente nacional do PTB.
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