5.2.06

Sindicatos disputam R$5 bilhões

Indústria de sindicatos disputa contribuições de R$ 5 bilhões
Entidades fantasmas são criadas para arrecadar taxas que chegam a 20% do salário mensal dos empregados

O dinheiro fácil das contribuições e taxas compulsórias pagas pelos trabalhadores continua fomentando a indústria de sindicatos. A não aprovação da reforma sindical mantém no País estrutura favorável ao surgimento de entidades que não são representativas e, em muitos casos, só servem para arrecadar dinheiro, os chamados sindicatos fantasmas.

Em 2005, só com a contribuição sindical - dinheiro equivalente a um dia de salário descontado de todos os trabalhadores com carteira assinada -, foram arrecadados R$ 916,9 milhões, um aumento de quase 20% em relação ao ano anterior. O montante, recolhido e redistribuído aos organismos sindicais pela Caixa Econômica Federal, é o maior dos últimos quatro anos.

A fatia disputada pelas entidades sindicais vai muito além do imposto sindical. A contribuição, recolhida todo mês de março dos cerca de 33 milhões de trabalhadores com carteira assinada, corresponde a 3,3% do pagamento de um salário mensal do empregado. Somadas as contribuições confederativa e assistencial, o porcentual pode chegar a 20% de um salário mensal, diz o secretário de Relações do Trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego, Osvaldo Bargas. Isso daria uma conta próxima de R$ 5 bilhões.

Sem mecanismos para controlar a distribuição dessa verba, a proliferação dos chamados sindicatos fantasmas, de carimbo ou de fachada, normalmente constituídos em assembléias com poucos participantes, continua no País. A reforma sindical, que acabaria com essa brecha prevista na Constituição, está na lista de projetos atropelados pela crise política.

"Conseguimos eleger um ex-sindicalista para a Presidência, mas não conseguimos mudar o modelo sindical", admite Bargas, companheiro de Lula no movimento sindical da região do ABC. Segundo ele, grande parte dos sindicatos não representa ninguém, mas sobrevive do dinheiro das contribuições.

O País tem hoje aproximadamente 18 mil sindicatos, dos quais 12 mil de trabalhadores e o restante de empregadores, segundo estimativas do Ministério do Trabalho. No ano passado, foram registrados 346 pedidos para novos sindicatos, quase um por dia. O ministério tem uma lista de 8 mil pedidos aguardando avaliação, a maioria de registros de funcionamento e extensão de base territorial.

Em 2005, foram concedidos 254 avais. "Se a documentação está correta, temos de registrar", afirma Bargas. Os critérios para abertura de sindicatos são muito liberais. Com tanta facilidade, diz ele, "criou-se uma máfia que cria sindicatos".

Há casos em que dirigentes do novo sindicato pagam a mensalidade de filiados para manter um quadro associativo, pois o dinheiro da contribuição compensa, afirma o secretário-geral da Força Sindical, João Carlos Gonçalves. Também há proliferação de sindicatos nascidos da divisão de categorias.

Sindicatos antigos, que por vários anos monopolizaram a representatividade de grandes categorias, acabaram subdivididas em várias categorias. No Paraná, o Sindicato dos Empregados no Comércio de Curitiba e Região move ação na Justiça há 12 anos contra duas entidades que retiraram da base 41 mil funcionários de supermercados e shoppings, o equivalente a 34% dos comerciários da região. O Sindicato dos Empregados no Comércio, fundado há 73 anos, tem 42 mil associados de uma base de 119 mil trabalhadores. O presidente da entidade, Ariosvaldo Rocha, calcula que a receita sindical caiu 40%.

O Sindicato dos Empregados de Mercados, Minimercados, Supermercados e Hipermercados de Curitiba e Região Metropolitana obteve registro do Ministério do Trabalho, mas opera com liminares, afirma Rocha. A sede é uma ampla casa em Curitiba. Na sexta-feira, a reportagem do Estado esteve no local, onde havia só uma atendente. Ela forneceu o telefone do presidente do sindicato, Jorge Leonel de Souza, mas ele não foi localizado. Já o Sindicato dos Trabalhadores em Shopping Centers de Curitiba ainda não obteve o registro, segundo Rocha. A sala ocupada numa galeria comercial estava fechada. Na sala ao lado, que também seria do sindicato, não havia ninguém na manhã de sexta-feira.

Entidades patronais enfrentam a mesma situação. Com base na regra da unicidade, o Sindicato das Empresas de Compra, Venda, Locação e Administração de Imóveis de São Paulo (Secovi), fundado há 60 anos, tem seis ações na Justiça contestando o que considera "sindicatos falsos". Em breve, dará entrada no sétimo processo, assim que conseguir a cópia da ata de fundação do Sindicato dos Condomínios e Edifícios Residenciais, Comerciais, Mistos, Horizontais e Verticais do Município de São Paulo e Região.

O advogado do Secovi, Rubens Cabral Rodrigues, conta que a convocação, em dezembro, estabelecia o horário da assembléia para as 17 horas. Um grupo de 31 síndicos compareceu ao local, mas foi impedido de entrar por seguranças. "Por volta de 17h03, umas dez pessoas deixaram o local dizendo que a assembléia tinha acabado." O grupo registrou Boletim de Ocorrência no 5º Distrito Policial do bairro da Aclimação.

Cesar Henrique Del Carlo, secretário-geral do novo sindicato, diz que os condomínios foram deixados de lado pelo Secovi e a categoria decidiu criar uma entidade mais representatividade. Segundo ele, mais de 20 pessoas estavam na assembléia - de uma base de 34 mil condomínios. Ele não informou o endereço da sede do sindicato nem o nome do presidente.
Estadão