4.2.06

Hipocrisia

O caso da eventual reentrada oficial na política do presidente do Supremo Tribunal Federal, Nelson Jobim, é exemplar para demonstrar o atraso institucional do Brasil. Envolve hipocrisia, falta de vergonha e nenhuma vontade de resolver de uma vez um problema grave: a porta giratória entre o Poder Judiciário e outros setores da sociedade.
Jobim é advogado de formação, mas foi político por largo período de sua vida. Nomeado para o STF por Fernando Henrique Cardoso, agora cogita ser candidato na eleição de outubro. A lei permite a juízes tomarem essa decisão até seis meses antes do pleito. Aí está a deformidade.
Se a lei permite, por que alguns não poderiam concorrer? Não faz sentido. Se a idéia é proibir juízes de concorrer em eleições, é necessário modificar a legislação. A possibilidade de essa idéia prosperar dentro do Congresso é semelhante à chance da seleção de futebol do Japão sagrar-se campeã mundial na Alemanha.
É claro que Jobim poderia ter um pensamento mais alto. Abdicaria ele próprio de concorrer na próxima eleição. Nos Estados Unidos, não há notícia de um juiz da Suprema Corte ter desejado tomar tal tipo de caminho recentemente. Esperar atitude assim no Brasil beira a hipocrisia.
Um caso não tão antigo é ainda pior do que o de Jobim. Foi o de Francisco Rezek. Foi ministro do Supremo na eleição de 1989, tendo também presidido o TSE durante a eleição de Fernando Collor.
Collor eleito, Rezek virou ministro das Relações Exteriores. Com o governo Collor no buraco, acabou sendo novamente nomeado para o Supremo. Uma indecência.
Agora, o caso de Jobim é uma variação sobre o mesmo tema. Para evitar essa porta giratória, só uma nova lei. O país fica, portanto, na dependência da improvável coragem e valentia dos congressistas, que teriam de se indispor com o Poder Judiciário.
Fernando Rodrigues para FSP

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