5.2.06

Compadre de Lula transfere bens a filhas

Endividado e convocado para depor na CPI dos Bingos, advogado Roberto Teixeira, amigo do presidente, tenta proteger patrimônio

Respondendo na Justiça por dívidas que superam R$ 650 mil, o advogado Roberto Teixeira -compadre do presidente Luiz Inácio Lula da Silva- lançou mão de artifícios para proteger seu patrimônio dos credores. Em 30 de novembro, cinco dias após aprovada sua convocação pela CPI dos Bingos, Teixeira registrou quatro propriedades rurais, num total de 51,4 mil metros quadrados, como "bem de família".
Graças à figura jurídica, o imóvel - batizado de "Recanto Valeska" - fica isento "de execução de dívidas futuras, inclusive com cláusulas de inalienabilidade e impenhorabilidade". Com valor declarado de R$ 519.202,68, a propriedade, que abriga um rio, fica, assim, imune à penhora para pagamento de dívidas de Teixeira.
Segundo as certidões do Cartório do Registro de Imóveis e Anexos de Amparo, Teixeira e a mulher, Elvira Angelina, residem em Monte Alegre do Sul, no Recanto Valeska. Mas, também de acordo com os registros, o casal morava em São Paulo até outubro do ano passado.
Genro e sócio de Teixeira, o advogado Cristiano Martins reconheceu que os dois ainda vivem na capital, mas diz que a residência não é o critério para a instituição do "bem de família".
O especialista Walter Ceneviva discorda. Para ele, esse instituto é previsto em lei para que a família do proprietário tenha onde morar caso sua atividade econômica naufrague. Mas "o fundamental é que seja destinado ao domicílio familiar".
Sempre falando em tese, o advogado diz que a instituição de uma área muito grande como bem de família, especialmente se realizada depois da execução da dívida, pode configurar fraude, sendo objeto de ação anulatória.

Convocação
Padrinho de um dos filhos de Lula, Teixeira foi convocado pela CPI dos Bingos sob a acusação de operar o caixa dois do PT nas eleições municipais de 1996. Ele não compareceu ao primeiro depoimento. Foi reconvocado no mês passado, em data a ser definida.
O advogado também compõe o quadro societário da Transbrasil, participando de seu conselho administrativo. Com a falência da empresa, poderia ser acionado a arcar, solidariamente, com parte de uma dívida que já foi calculada em R$ 1,5 bilhão. Embora ausente da Lei das S.A., a idéia de "responsabilização solidária" é aplicada, por exemplo, pela Procuradoria do INSS. Alvo de uma cobrança de R$ 460,7 milhões, a Transbrasil é a terceira da lista da dívida ativa da autarquia.
De acordo com ações em curso na Justiça, Teixeira e sua empresa, a Mito Participações, devem do condomínio às instituições bancárias. Apesar das cobranças na Justiça -contra as quais chegou a recorrer ao STJ (Superior Tribunal de Justiça)-, Teixeira e família engrossaram sua propriedade rural no fim do ano passado.
Numa operação registrada no dia 24 de outubro, Teixeira, a mulher e as duas filhas, Larissa e Valeska, compraram dois imóveis no ano passado, pagando R$ 145,5 mil. São duas propriedades, numa área total de 30 mil metros quadrados, à margem de um rio, incluindo uma chácara.
Mas, pelo registro dos imóveis, Teixeira e a mulher compraram apenas o direito de uso da propriedade (usufruto), pelo qual pagaram R$ 48,5 mil.
As filhas, sim, são donas do imóvel propriamente dito, da "nua propriedade". Teoricamente, o imóvel não poderá ser usado para pagamento de dívidas contraídas pelo pai.
Autor do livro "Lei de Registros Públicos Comentada", Ceneviva diz que os credores podem até comprovar se devedor e nu proprietário se uniram para escapar das dívidas. Mas "até provar e que o Judiciário julgue, vão passar o mar e a terra". "Pode prever aí uma briga de dez anos", avalia.
Para Ceneviva, "se Y tinha uma dívida e já estava sendo executado, ele não poderia ter feito isso. Está adotando expediente para proteger o patrimônio."
Segundo ações em curso no Fórum de São Bernardo do Campo (ABC paulista), Teixeira é alvo de cobrança de R$ 143,2 mil, incluindo dívidas a instituições bancárias e R$ 7.593,60 de condomínio.
Em 2003, ele recorreu ao STJ para impedir a penhora de um bem para pagamento de uma dívida com um banco. Como o recurso foi rejeitado e o caso voltou para São Paulo, ainda sem desfecho.
Constituída em 1980, a Mito Participações responde por dívida superior a R$ 500 mil. Para a execução de uma delas -no valor de R$ 54,5 mil- a Justiça tenta, sem sucesso, a intimação da empresa desde agosto passado.
No dia 31 de janeiro, segundo registro na Justiça, houve nova tentativa frustrada. O oficial foi informado que, em vez do endereço da Mito, havia a Teixeira e Martins Advogados. Esse é o escritório de Teixeira.
De acordo com os registros do cartório de Amparo, a Mito é proprietária de três imóveis, com quase 400 mil metros quadrados, em Monte Alegre do Sul. Nelas, há duas casas com piscina, disponíveis para aluguel aos finais de semana. Só uma das propriedades, de 181,4 mil metros quadrados, e obtida em usucapião, é avaliada em R$ 85 mil.
Em julho de 2002, Teixeira fez uma permuta de terras com a sua própria empresa. O advogado ficou com uma propriedade de 9.480 metros quadrados, à margem do Rio. O imóvel foi incorporado ao Recanto Valeska, e tem um valor base de R$ 129.800,67.
Em troca, a Mito obteve um terreno íngreme, de 3.509 metros quadrados. A operação foi registrada por R$ 3,7 mil.
Teixeira foi diretor-presidente da Mito Participações até o dia 7 do mês passado. Ele detém R$ 99.681,00 da sociedade, cujo capital é de R$ 150 mil.
Elvira Angelina conta com R$ 30,3 mil. Em outubro do ano passado, Teixeira diluiu um pouco sua participação, com a redistribuições de parte de suas cotas para as filhas. Recém-admitidas, Larissa Teixeira e Valeska Teixeira Zanin Martins receberam, cada uma, R$ 10 mil em cotas.
FSP

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