2.2.06

Jefferson e a lista de Furnas

O ex-presidente do PTB e deputado cassado Roberto Jefferson (RJ) afirmou ontem, em depoimento à Polícia Federal, que recebeu uma doação ilegal de R$ 75 mil para sua campanha eleitoral em 2002, oriunda do caixa 2 que seria operado pelo ex-diretor da estatal Furnas Dimas Toledo. A doação a Jefferson consta de um dossiê que relaciona vários políticos, a maioria hoje na oposição, mas cuja autenticidade não foi comprovada até agora pela PF.

O dinheiro, conforme garantiu o ex-deputado, foi entregue em espécie no seu escritório. O depoimento foi considerado "contundente e relevante" pela PF, que abrirá nova linha de investigação para aprofundar os indícios de um antigo esquema de caixa 2 existente na estatal.

De acordo com o dossiê em poder da PF, só na eleição de 2002 o esquema teria beneficiado 156 candidatos a vários cargos de PSDB, PFL, PTB, PL e PP. Está na lista todo o alto comando do PSDB, inclusive o hoje prefeito de São Paulo, José Serra, e o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin.

Juntos, os beneficiários da lista de Furnas teriam recebido cerca de R$ 30 milhões na eleição de 2002. Entre os supridores do fundo ilegal estariam grandes empreiteiras e empresas ligadas ao valerioduto, como o Banco Rural e as agências de publicidade DNA e SMPB.

Jefferson foi intimado a se explicar por ser um dos 156 nomes da lista. "No que me diz respeito, a lista é verdadeira. Quanto aos outros, é problema deles", disse aos jornalistas, logo depois de depor.

A PF busca o original da lista e realiza perícia na cópia que possui para saber se seu conteúdo é verdadeiro. A relação está em papel timbrado de Furnas. Mas os primeiros indícios são de que o documento é forjado. Na base de cada folha há um carimbo com timbre do cartório do 1º ofício de notas de Belo Horizonte. Peritos da PF constataram que o carimbo do cartório é falso e realizam novas análises para verificar outros dados. Ou seja, o fato de Jefferson assumir a doação não significa que os outros citados também tenham recebido ou até mesmo que o esquema tenha existido.

PETISTAS

Só comprovar a autenticidade do documento, a PF convocará os citados para depor. "Quanto a mim, digo que a lista é verdadeira. Quando denunciei o esquema do PT, o Marcos Valério, o Delúbio Soares e o José Genoino também negaram e eu confirmei", disse Jefferson.

O ex-deputado relatou que os policiais quiseram saber, no interrogatório, por que não havia nomes de petistas na lista. Ele disse não ver surpresa no fato porque, na época, o PT não estava no governo. "O PT não era governo e o dr. Dimas não ajudava o partido na ocasião. Não há nada de estranho nisso."

Ele reafirmou sua denúncia sobre o esquema do mensalão pago pelo PT com recursos do empresário Marcos Valério a partidos da base aliada do governo Lula. O depoimento durou cerca de quatro horas, durante as quais Jefferson falou também sobre os R$ 20 milhões que o PT teria se comprometido a pagar ao PTB para serem usados em campanhas eleitorais do partido em 2004.

Desse montante, o ex-deputado disse ter recebido apenas R$ 4 milhões e distribuído a colegas de partido que estavam em campanha. Ele reiterou todas as denúncias que fez em depoimentos anteriores à PF e às CPIs do Congresso.

Para tucanos, caso lembra Cayman


O prefeito José Serra e o governador Geraldo Alckmin, ambos do PSDB paulista, lembraram o chamado dossiê Cayman ao falarem sobre sua inclusão na lista de políticos que teriam sido beneficiados com recursos de caixa 2 doados por empresas. O ministro Hélio Costa (PMDB-MG) disse que renuncia ao mandato de senador se houver documento que prove seu envolvimento. "Isto é mais falso que o dossiê Cayman", afirmou Serra, referindo-se ao conjunto de documentos falsos, divulgados em 1998, que apontavam o próprio prefeito, o então presidente Fernando Henrique Cardoso e o falecido governador Mario Covas como sócios de uma empresa no paraíso fiscal das Ilhas Cayman. Alckmin chamou a lista de "falsificação grosseira" e prometeu tomar medidas judiciais. "É totalmente irresponsável. Isso aí lembra Ilhas Cayman", afirmou. "Vamos agir duro no sentido de coibir esse tipo de coisa. Não tem a menor procedência." "Se alguém tiver qualquer documento que prove que eu recebi qualquer dinheiro de Furnas como caixa 2, eu renuncio a meu mandato", afirmou Costa, em entrevista no Palácio do Planalto. O dossiê Cayman começou a tumultuar as eleições de 1998 em setembro. Serra e Covas receberam bilhetes de um chantagista que ameaçava vender a papelada - cópias de supostos faxes e extratos bancários - a rivais. O dossiê acabou nas mãos de Paulo Maluf, então candidato ao governo, que contatou o candidato a presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Lula consultou o hoje ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, que concluiu que faltavam provas de autenticidade. A Polícia Federal abriu inquérito e a análise de peritos provou que eram papéis forjados. Depois de dois anos de investigações internacionais e ajuda do FBI, em junho de 2001 a PF confirmou que o dossiê era uma falsificação e indiciou oito pessoas.
Estadão

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