É notória a obsessão do presidente Lula em comparar dados do período de sua gestão com os dos anos FHC, seguido por seus partidários, como o senador Mercadante, que na disputa pelo governo paulista, e sem ter o que mostrar como executivo, até publicou livro sobre esse assunto nacional. No modo de dizer do atual presidente, eu duvido que neste país tenha havido obsessão semelhante no período republicano!
Assim, na recente convenção da qual saiu candidato - que novidade! -, gastou boa parte de seu pronunciamento nessa mesma linha. Como de praxe, revelou despreparo, ao confundir o valor do superávit comercial com o das exportações, errando em quase US$ 75 bilhões. Mostrou também que essa obsessão serve para esconder que não cumpriu suas próprias metas, como fez ao enfatizar os números do salário mínimo e dos empregos com carteira assinada no seu governo, mas omitindo que deixou de cumprir sua promessa de dobrar o valor real desse salário e a de gerar 10 milhões de empregos.
Assim, é obcecado com o passado naquilo que lhe interessa, e sem credibilidade para dar garantias quanto ao futuro, pois prometeu o que não pôde cumprir. Além disso, vem plantando as sementes de um futuro ainda mais difícil, conforme argumentarei mais à frente.
Obviamente a preocupação que aflige todos é com o futuro. Ademais, cabe lembrar que FHC não é candidato e que, se Lula acha que tudo vem da força pessoal de cada postulante, a comparação relevante seria com seu principal adversário eleitoral, Geraldo Alckmin. Entretanto, essa comparação não lhe interessa, pois perderia em quesitos relevantes como responsabilidade fiscal, gestão eficaz e eficiente, e até mesmo em matéria de crescimento econômico, apesar da camisa-de-força que de Brasília aperta São Paulo com os incômodos laços de câmbio baixo e juros altos, os quais lembram dois dos piores traços do período FHC, e que Lula se esmerou em copiar.
Aliás, nas melhores escolas os alunos que só repetem o que foi dado em aula não ganham as maiores notas, atribuídas aos que vão além, revelando saber mais e inovando nas suas respostas, às vezes até apontando erros dos próprios professores. Mas a grande ação inovadora do governo Lula na arte de governar, o escândalo do "mensalão", também o credencia à reprovação.
A comparação intertemporal que faz de dados econômicos também é falha na sua lógica, a da boa coisa é só com a gente, pois ignora que na economia o presente não se constrói de um momento para o outro, mas para o bem ou para o mal se assenta em fatos precedentes. Assim, entre outros aspectos, a recuperação das exportações decorreu de um movimento iniciado no segundo mandato de FHC, permitido por um cenário externo favorável e pela desvalorização do real, que estimularam os exportadores. Já o crescimento dos empregos formais não pode ser dissociado da simplificação e redução de impostos trazida pelo Simples, também da gestão anterior. E o Bolsa-Família, de que tanto Lula se utiliza politicamente, nada mais é que um refogado de vários programas sociais que já existiam, engrossado com mais temperos e rotulado com novo nome. No que o governo atual de fato inovou, o Fome Zero, sobreveio um grande fiasco.
Sobre o crescimento da economia, a lição relevante é que pelas forças internas ele está há muito tempo estacionado em taxas baixas, travado pelos fracos investimentos produtivos, em particular os do governo, enquanto os privados são prejudicados pela alta taxa de juros, pelo câmbio valorizado e pela elevadíssima carga tributária. Assim, o crescimento tem oscilado ao sabor do estímulo que vem de fora - o crescimento da economia mundial -, no que abre de espaço para nossas exportações. Ora, neste governo, em média anual, esse crescimento trouxe ano a ano muito maior estímulo à economia brasileira que nos oito anos de FHC. Nestes, segundo organismos internacionais, o crescimento do comércio mundial (exportações mais importações) foi de 51,2%; no governo atual, só nos seus três primeiros anos o aumento foi de 34,6% e se estima uma taxa de 46% de 2002 a 2006.
Esse enorme estímulo mais recente, contudo, foi mal aproveitado, pois, se levado em conta, a economia brasileira deveria ter crescido a taxas bem maiores que as do governo anterior. Mas o que se viu foi o Brasil ficar na rabeira de seus próprios pares, os países emergentes, e passar a ser até desprezado como integrante do grupo conhecido como BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China), pois já surgem referências apenas ao RIC, dos que crescem muito mais.
Nessa perspectiva do futuro que se assenta no presente, a oferecida pelo governo Lula também assusta, pois optou por outra má lição de governos anteriores, a da expansão da carga tributária, e inovou na direção errada, ao reduzir ainda mais a proporção dos gastos de investimentos, ao expandir fortemente o número de funcionários públicos federais, inclusive os admitidos sem concursos, e aumentar seus salários sem critérios. Também inovou negativamente ao emperrar ainda mais a administração, centralizando-a e desfigurando uma importante inovação modernizadora do governo anterior, as agências reguladoras, ao lado de optar pelo voluntarismo e pelo favoritismo num setor crucial para o futuro, o das Comunicações.
A propósito, dois artigos publicados por este jornal no domingo são ilustrativos do desgoverno Lula. São balanços, de leitura indispensável, da situação atual dessas agências e desse setor (Lula quer acabar com as agências, de Suely Caldas, B2, e O desastre do governo Lula nas Comunicações, de Ethevaldo Siqueira, B14).
Enfim, com Lula, é o Brasil sem futuro. Que venha o futuro sem Lula.
Roberto Macedo, economista (USP), com doutorado pela Universidade Harvard (EUA), pesquisador da Fipe-USP e professor associado à Faap, foi secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda
Um comentário:
I have been looking for sites like this for a long time. Thank you! » »
Postar um comentário