13.6.06

A "coisinha" do lula

A “coisinha” de Lula e o buraco da razão crítica

Na falta de dados que permitam a um jornalista-porta-voz da Presidência responder objetivamente às críticas feitas ao governo Lula, o ministro Tarso Genro (Relações Institucionais) tem se desdobrado para tentar dar conta do recado. A tarefa é inglória, pois ele mais filosofa do que responde, embora, do ponto de vista do discurso eleitoral, o presidente da República compense com sobras o buraco da razão crítica.

Nesta segunda, por exemplo, o ministro Tarso Genro considerou as críticas feitas pelos tucanos, na convenção de domingo, em Belo Horizonte, “revoltantes”. Acrescentou que “[os tucanos] são pessoas que não querem discutir projetos e idéias”. O xis da questão desdobra-se assim:

1) o presidente elegeu-se, em 2002, a bordo do jeito “Lulinha paz e amor de ser” e sem debate programático de nenhuma natureza; a premência, descrita em um almanaque invisível e seguida à risca na mídia, era apenas política; tratava-se de dar vez ao bom selvagem metalúrgico como prova da eficiência do rodízio democrático tropical;

2) em 2006, o presidente candidato à reeleição mistifica o debate sobre projetos e idéias, e a mídia, que em 2002 integrara naturalmente o estado de espírito pró-bom selvagem, agora se revela absolutamente despreparada para tirar a prova dos noves dos fatos políticos em debate.

Memória fraca
Melhor dizendo, não tem debate nenhum. São poucos os jornalistas com memória mínima sobre a natureza do que Lula e seus ministros e assessores dizem em público. São poucos os que sabem quem criou determinada política pública, quando e em que condições. A maioria das reportagens é uma ata sobre declaratórios: Lula disse isso, o ministro disse aquilo, alguém da oposição respondeu isto e aquilo. Mas os jornalistas quase nunca sabem avaliar o que está sendo dito. E aqui vai um exemplo caricato.

Um jornal de circulação nacional espantou-se, em sua edição de segunda-feira, nas páginas dedicadas à cobertura da convenção tucana, que no programa do candidato Alckmin conste o Bolsa Família e o Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar). Asseverando o espanto, o jornalista acrescentou que o Bolsa Família e o Pronaf estão lá, mas os tucanos dizem “que ambas as iniciativas foram criadas pelo governo FHC”. Como quem diz: eles é que afirmam, mas nós não podemos assegurar nada. Fica no ar a desconfiança de que a atribuição da autoria a FHC deve ser coisa de tucano com dor de cotovelo do governo Lula.

Os tucanos não precisam dizer nada, pois é fato. Menos para a maioria dos jornalistas. Os fatos mostram, mas os jornalistas não se convencem de que quase tudo o que funciona no governo Lula não é novo e o que é novo não funciona.

Bolsa e Pronaf
O Bolsa Família nada mais é do que a Rede de Proteção Social do governo FHC, rebatizada e unificada em cima de quatro programas, tal qual recomendação feita pelo governo FHC, no período de transição, nos meses de novembro e dezembro de 2002.

O governo FHC recomendou também que o pioneiro Cadastro Único fosse mantido, mas tivesse corrigidos os problemas de confiabilidade das informações. Os três ministros do governo Lula que viveram a crise do delirante Fome Zero especializaram-se em cacetar o Cadastro Único, mas, depois, até essa política adotaram. Não há um só dominó de política pública que o governo Lula tenha conseguido botar em pé.

Para saber quem criou o Pronaf, basta fazer uma pesquisa no Google e ler o que os petistas, o MST, Stediles e companhia diziam. Era pau puro em cima do governo FHC. O governo Lula adotou o Pronaf como menina-dos-olhos para financiar não apenas a agricultura familiar, mas também, e acima de tudo, as organizações não-governamentais de fechada dos MSTs e MLSTs. No site do Ministério do Desenvolvimento Agrário, sumiram as referências à origem do Pronaf, mas há uma profusão de manchetes sobre aumento dos recursos orçamentários – bilhões e mais bilhões que, na hora da execução do orçamento, viram milhões.

O fortalecimento da agricultura familiar começou no governo Itamar, quando foi criado o Programa de Valorização da Pequena Produção Rural (Provap). Objetivo da equipe econômica, então dirigida por um tal ministro FHC (Fazenda): destinar um volume de crédito com taxas de juros mais acessíveis aos agricultores familiares. Em 1995, primeiro ano do governo do mesmo FHC, eleito presidente, o Provap foi reestruturado para dar origem, em 1996, ao Pronaf. De programa de crédito apenas agrícola, o Pronaf passou a financiar também projetos de infra-estrutura rural em todo o país. Mas o PT dizia que era tudo truque para não assentar os sem-terra. Era truque o Pronaf, era truque o Banco da Terra...

Outro exemplo caricato
Uma boa régua para medir, como quer o ministro Tarso Genro, a consistência e as idéias do lulismo militante, foi oferecida ao país, nesta segunda-feira, por ninguém menos que o próprio presidente e seu ministro da Educação, Fernando Haddad. Os dois estrelaram o programa de rádio Café com o Presidente. A justificativa: “A última quinta-feira, dia 8, foi um dia histórico para a educação brasileira”.

Seguiu-se um trololó em que o leitor-ouvinte se deparou com uma conversa sobre merenda, livros didáticos, creches e outras obviedades, mas de onde é impossível tirar três medidas efetivas do governo Lula para a apregoada revolução educacional. A política pública da qualidade do ensino está por implantar.

O governo federal comanda o ensino público universitário e pode ser o grande indutor da universalização do ensino fundamental e médio com qualidade. A reforma do ensino universitário está por fazer, pois seguiu na semana passada, a tal quinta-feira, para o Congresso. Como não vai tramitar em regime de urgência, é certo que o governo Lula começou e terminará sem fazer reforma alguma. Nas universidades públicas, caiu a quantidade de alunos nos cursos noturnos, dirigidos aos mais pobres, aqueles alunos que trabalham de manhã e à tarde e estudam à noite. Mas o ProUni virou uma festa de bolsas para colocar alunos de menor renda nas parafusetas privadas financiadas com dinheiro público.

Com a quase universalização do ensino fundamental herdada do governo FHC, viabilizada pelo Fundef, o governo Lula, naturalmente, propôs a sustentabilidade da universalização do ensino médio por meio do Fundeb. Pois bem: não fez a política pública que induzisse à revolução de qualidade do ensino fundamental e médio e não aprontou a sustentação da expansão do ensino médio porque o Fundeb, ao fim de três e anos e meio de Planalto, está por aprovar no Congresso. Mesmo que venha a ser aprovado no final deste 2006, o governo Lula terá passado quatro anos de um mandato inteiro fazendo pelo ensino médio... muitos discursos.

E como é que o presidente da República tratou a ausência do principal diante do “dia histórico para a educação brasileira”? No Café com o Presidente, simplesmente disse que fechou com “chave de ouro todo o programa de educação” proposto ao país, mas que ficou faltando “uma coisinha”. A “coisinha” é o Fundeb.

Lula está certo de que a maioria dos jornalistas também acha o Fundeb uma “coisinha”. Assim como a maioria também não sabe que o Fundef termina ao fim deste ano e que, se a “coisinha” do Fundeb não estiver aprovada, não haverá política de financiamento da universalização nem para o ensino médio nem para o fundamental. Mas o que esse Lula investiu na educação, em vez de construir presídios, é de uma grandeza salivar ímpar!

São “revoltantes” as críticas, não é mesmo ministro Tarso Genro? Mas podemos discutir umas quantas “coisinhas”, em vez de idéias e projetos. Nesta terça-feira, volto ao assunto com a ajuda objetiva de ninguém menos que o ex-ministro e embaixador Rubens Ricupero e de um alto funcionário do Ministério da Saúde com quem passei o sábado passado inteirinho. Ouvindo o funcionário da Saúde e lendo Ricupero não tenho dúvida sobre o que vem a ser este governo: uma bolha na história da democracia brasileira.
Rui Nogueira [ruinogueira@primeiraleitura.com.br]

Um comentário:

Anônimo disse...

Wonderful and informative web site. I used information from that site its great. Custom cradle mattresses 800mg acyclovir spravochnik stolic com Decoration home medieval lesbians North antispam