Das empresas que cometeram fraudes ou outras irregularidades e, por isso, foram consideradas inidôneas pelo Tribunal de Contas da União (TCU), nenhuma é conhecida do grande público. Embora tenha trazido ao conhecimento da população esquemas de suborno e de corrupção que envolveram quantias altíssimas, o trabalho das CPIs dos Correios e dos Sanguessugas não resultou em nenhuma punição administrativa por parte do TCU.
Empresas declaradas inidôneas não podem participar de licitações públicas. No que depender do TCU, porém, empresas como as do publicitário Marcos Valério Fernandes de Souza, apontado como um dos principais articuladores do esquema do mensalão, ainda têm esse direito, como mostrou reportagem de Marcelo de Moraes publicada pelo Estado. Também podem participar de licitações as empresas de Luiz Antônio Vedoin, acusado de pagamento de propinas para políticos no esquema de venda de ambulâncias superfaturadas.
O TCU tem sido muito parcimonioso e seletivo no uso de sua competência para punir empresas. Apenas 24 integram a lista das inidôneas e nenhuma é de grande porte. É como se exercesse seu poder e sua competência apenas no caso dos mais fracos.
Duas empresas consideradas inidôneas pelo prazo de cinco anos (Ycal Participações Ltda. e Rota Mármores, Granitos e Construções Ltda.) foram punidas em 2004 por fraudes em licitações promovidas pela prefeitura de Joaquim Nabuco (PE). A primeira delas, como apurou a reportagem do Estado, foi condenada a devolver R$ 50 mil à prefeitura; a segunda, R$ 20 mil.
Qualquer dinheiro desviado dos cofres públicos precisa ser devolvido e os responsáveis pelo desvio, punidos, como fez o TCU nesses casos. O que causa surpresa na lista das punidas é a ausência de empresas de maior porte e de valores mais expressivos.
O TCU argumenta que tem dificuldades para comprovar fraudes e sua ação é limitada pelos recursos judiciais. Seu procurador-geral, Lucas Furtado, diz que o sistema atual é "viciado" e "incentiva as empresas a pagar subornos ou, se quiser usar um eufemismo, doações de campanha". Para mudá-lo, diz ele, o TCU deveria poder quebrar sigilos bancários e fiscais para facilitar a produção de provas. Dentre as funções atribuídas ao TCU não está, porém, a de polícia.
O TCU tem a função de auxiliar o Congresso Nacional na apreciação das contas do presidente da República e da aplicação dos recursos federais. A Constituição atribuiu ao TCU diversas competências privativas, entre as quais, além do exame das contas do presidente da República, o julgamento das contas dos responsáveis pela administração de dinheiro e bens públicos; o exame das contratações de pessoal e das concessões de aposentadorias aos servidores; a apuração de denúncias sobre irregularidades ou ilegalidades na utilização de recursos federais; e a aplicação de sanções e determinação de correção de ilegalidades ou irregularidades em atos e contratos públicos.
É também de sua competência aplicar multas e condenar os responsáveis por irregularidades ao ressarcimento de prejuízos causados ao erário; decretar a indisponibilidade de bens de responsáveis por atos ilegais ou irregulares; inabilitar pessoas para o exercício de cargos de confiança por até oito anos; e declarar a inidoneidade, por até cinco anos, de empresas que tenham cometido fraudes ou ilegalidades nos três níveis da administração pública. Pode também realizar inspeções e auditorias por iniciativa própria ou por solicitação do Congresso.
O TCU não parece ter visto necessidade de agir, "por iniciativa própria", no caso das CPIs citadas. No caso mais recente, o da Operação Navalha, age com rapidez: o procurador-geral solicitou ao Superior Tribunal de Justiça o processo sobre as atividades da Construtora Gautama e de seu proprietário, Zuleido Veras, para a declaração da inidoneidade. É um bom sinal. Mas, mesmo que atue com mais rigor e presteza, sua ação será inócua: a Controladoria-Geral da União já declarou a empresa inidônea, o que a impede de ter negócios com o governo federal.
Editorial Estadão
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