Peça central do esquema de fraude de licitações da Petrobras revelado pela Operação Águas Profundas, a Angraporto Offshore tinha tamanha influência na estatal que passou a vender informações privilegiadas a outras empresas que disputavam as concorrências milionárias de reparo de plataformas, além de direcionar editais em proveito próprio.
A Folha teve acesso a trechos da denúncia do Ministério Público Federal que resultou no pedido de prisão de 18 pessoas na Operação Águas Profundas, das quais 14 já foram presas. A denúncia aponta fraudes em cinco licitações da Petrobras para reformas de plataformas marítimas, no valor mínimo de R$ 200 milhões.
Entre os presos estão três executivos da Petrobras, agentes públicos, funcionários de empresas contratadas pela estatal e pessoas que se encarregavam da contabilidade do suposto esquema de fraudes.
A denúncia encaminhada pelo Ministério Público à Justiça sustenta que a Angraporto recebeu dinheiro para, em conluio com funcionários da Petrobras, beneficiar o estaleiro Mauá Jurong e a empresa Iesa Óleo & Gás em licitações. A Angraporto foi a vencedora de 3 das 5 licitações suspeitas. As outras duas foram ganhas pela Mauá e pela Iesa Óleo & Gás.
A venda do know-how da fraude era paga por depósitos nas contas de empresas fantasmas ligadas à Angraporto ou a sócios, sustenta a denúncia.
O estaleiro Mauá Jurong depositou R$ 3,6 milhões na conta da empresa fantasma Intedact, que repassou o dinheiro aos sócios da Angraporto em cinco depósitos entre fevereiro e setembro de 2006, diz a acusação. O estaleiro venceu a licitação para reforma da P-16.
A Iesa Óleo & Gás, de reparos e montagem industrial, teria repassado R$ 3,5 milhões à Vista Linda Participações, também pertencente aos acionistas da Angraporto.
O esquema tinha três interfaces. Começava na estatal, com a elaboração dos editais direcionados e no repasse de informações privilegiadas aos acionistas da Angraporto. Fora da estatal, era encabeçado pela própria Angraporto. A terceira face envolvia uma rede de empresas fantasmas ou que existiam apenas de papel, coordenada por Ruy Castanheira, um dos presos na operação.
A simulação de contratação dos serviços das empresas fantasmas atendia a dois objetivos: dissimular a origem e o destino do dinheiro e gerar despesas para a Angraporto a fim de reduzir seu faturamento e o recolhimento de impostos. A denúncia chama atenção para o fato de a companhia fechar o ano no "vermelho", mesmo com contratos milionários.
Entre as empresas rastreadas pela PF em dois anos de investigação, aparece uma de nome Vento Consultores Portuários, acionista da Vista Linda Participações, pertencente a acionistas da Angraporto.
Segundo especialistas ouvidos pela reportagem (o Ministério Público Federal e a Justiça Federal não permitiram o acesso ao processo), o esquema amarrava todas as pontas necessárias para fraudar uma licitação. Na origem estava o gerente-geral da unidade de serviço e sondagem submersíveis da Petrobras, Carlos Heleno Netto Barbosa, que encomendava os reparos nas plataformas e indicou dois integrantes da comissão de licitação denunciados por corrupção. Sua atuação era qualificada "como discreta" na operação.
A auditoria da Petrobras, que colaborou nas investigações, rastreou e-mails trocados por integrantes da comissão de licitação com farta referência a mudanças em editais para atender interesses da Angraporto. Segundo a denúncia, Rômulo Miguel de Morais, gerente de reparo da P-14, teria recebido um Audi, registrado em nome de sua mulher, e viagens à França e aos EUA, patrocinadas pela Angraporto. Já Carlos Alberto Vieira Feitosa, coordenador da comissão de licitação, teria viajado ao exterior com despesas pagas no cartão de crédito de Mauro Zamprogno, sócio da firma.
Ministro
O ministro da Justiça, Tarso Genro, afirmou ontem que a Operação Águas Profundas foi feita a pedido da própria Petrobras. Anteontem, Carlos Alberto Aguiar, procurador da República que investigou o caso, disse que o inquérito começou a partir de uma denúncia feita diretamente ao Ministério Público.
Folha
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