24.7.06

Culpa do sistema

Lula diz que, sem reforma, novos escândalos surgirão
"Precisamos mexer nessa ferida chamada política brasileira", diz petista no Nordeste
Presidente atribui casos de corrupção à deformação do sistema, mas não detalha que medidas efetivas iria tomar em um 2º mandato


A poucos meses do final de seu governo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, candidato à reeleição, defendeu ontem em Olinda (PE) uma reforma política como o único meio de acabar com os escândalos de corrupção no Brasil.
O petista disse que, se nada for feito, os casos vão se repetir. "Nós precisamos mexer nessa ferida chamada política brasileira", afirmou. Foi no mandato de Lula que vieram à tona os escândalos do mensalão e dos sanguessugas. Ontem, o presidente atribuiu essas crises basicamente aos problemas do sistema político.
"Não pensem que o erro de cada um é individual ou partidário. O que acontece são os acúmulos de deformações que vêm da estrutura política do nosso país", afirmou a uma platéia de cerca de 300 pessoas, entre políticos e intelectuais, que estavam reunidos para discutir propostas de sua candidatura para o Nordeste.
"Ou nós temos a coragem de mudar isso com uma certa profundidade ou nós, daqui a 20 anos, estaremos amargando as mesmas coisas que estamos lamentando hoje", concluiu.
O presidente não aprofundou sua proposta, mas disse que a reforma que pretende fazer caso reeleito "passa pelas organizações das estruturas partidárias deste país", o que incluiria "desde a mudança no regimento interno" do Congresso "até a discussão de mandato de pessoas, até a existência ou não de partidos-laranja e partidos de verdade".
Os escândalos de corrupção e seu uso político pela oposição têm surgido com freqüência nas falas de Lula. Anteontem, em seu primeiro comício na campanha pela reeleição, ele disse aos adversários que "meçam suas línguas", porque vai responder no mesmo tom.
Lula aproveitou para criticar o Legislativo. "Não podemos permitir que se repita no Congresso Nacional o que aconteceu com o Orçamento do ano passado, quando ficou demonstrada pouca seriedade com o Brasil e muita vocação para prejudicar o governo, sem saber que por trás do governo estavam prejudicando o povo", afirmou, sobre o atraso para aprovar a proposta de Orçamento da União.

"Buchinhos dos pobres"
Lula passou a maior parte do tempo falando sobre o Nordeste e defendeu altivez como primeiro passo para o fim das desigualdades. Na região, o presidente tem ampla vantagem sobre seus adversários, segundo pesquisa Datafolha (63% para o petista, contra 13% para o tucano Geraldo Alckmin). "O Nordeste precisa parar de ser vítima. Não dará o salto de qualidade que tem de dar se o nordestino se apresentar para o resto do país como se fosse vítima."
Ele voltou a vestir o figurino de "pai dos pobres" e afirmou que não importa se o Bolsa-Família é ou não assistencialista, mas sim que ele alimenta quem precisa. "O Bolsa-Família está levando calorias e proteínas para os buchinhos dos nossos meninos mais pobres."
Disse ainda que uma pequena parcela deseja manter a população sem estudo para não ser contestada. "A ignorância é uma forma de tornar o povo vítima. A sabedoria não interessa a uma parte dos que governaram este país, historicamente."
O ataque às elites já havia começado na noite anterior. "A mesma elite que levou Getúlio [Vargas] à morte, que levou Juscelino [Kubitschek] ao maior processo de acusação e de mentiras, que tirou João Goulart, essa mesma elite tentou me tirar. Só que a diferença básica no meu caso não é que eu fosse melhor. É que tinha um componente que eles não contavam e descobriram que existia, chamado povo brasileiro."
Lula também defendeu uma mudança nas rotas aéreas do Brasil, hoje concentradas em São Paulo, disse que o problema da Varig está "quase resolvido" e criticou as empresas aéreas por não comprar aviões da Embraer -apesar de ele próprio ter comprado um Airbus, europeu, para a Presidência.
Folha