A origem do dinheiro ainda é uma dúvida, mas todos os envolvidos na busca da identificação da fonte original compartilham da mesma certeza: foi um trabalho de profissionais, experientes o bastante para deixar o mínimo de rastros e confundir os investigadores.
De 'tabajara', portanto, a operação não teve nada. Disso não têm dúvida o delegado responsável pelas investigações da Polícia Federal, Diógenes Curado Filho, o juiz Jefferson Scheinneder, da 2ª Vara Federal de Cuiabá (MT), e a CPI dos Sanguessugas, cujos integrantes vêm mantendo constante troca de informações com a polícia e a Justiça.
O profissionalismo empregado para dificultar a localização do dinheiro é um argumento que convence parlamentares de oposição de que a demora da PF pode estar mesmo muito mais ligada aos obstáculos reais do que a uma ação deliberada de manipulação eleitoral de forma a postergar os resultados para depois da eleição.
Mesmo assim, a hipótese de interferência 'de cima' ainda integra o campo de trabalho da CPI e do juiz Scheinneder, que receberia ontem um relatório parcial das mãos do delegado Diógenes e estava disposto a reforçar a exigência de que a polícia se apresse nas investigações. Ele quer, no mínimo, receber da PF explicações técnicas 'cabais' a respeito dos indícios até agora coletados e sobre os caminhos percorridos antes de firmar convicção de que as dificuldades alegadas justificam a demora.
Até agora são três as fontes de onde teria saído o R$ 1,75 milhão: doleiros, saques de pequena monta no Bradesco, no Safra e no Citibank, e uma pequena quantia de bicheiros. Nenhuma dessas fontes permite registro adequado à identificação.
Os dólares, quando repassados às operadoras de câmbio (foram 14, no caso), não têm mais suas cédulas anotadas; o dinheiro do jogo do bicho transita à margem de legalidade; os saques de quantias baixas misturam-se a uma infinidade de operações semelhantes nos bancos.
Se ação 'aloprada' houve, foi dos mandantes do crime, que subestimaram o fato de Luiz Antônio Vedoin, em regime de delação premiada, estar sob vigilância policial e judicial. Os executores revelaram 'expertise' no manuseio de recursos ilícitos.
Mas, a despeito de ainda ignorar a identidade dos fornecedores originais, a polícia já sabe de muita coisa. Sabe, por exemplo, que o dinheiro não tem origem em contas do PT e não é fruto de 'sobras de campanha'. Daí o presidente da CPI dos Sanguessugas, deputado Antônio Carlos Biscaia, ter afirmado que a fonte é criminosa sem contestações.
Sabe também que Hamilton Lacerda, o ex-assessor da campanha de Aloizio Mercadante, foi o receptador e encarregado do repasse a Gedimar Passos que, por sua vez, tinha a missão de entregar os dólares e os reais a Valdebran Padilha, que pagaria a Luiz Antonio Vedoin pelo dossiê e pela entrevista à revista IstoÉ, acusando o ex-ministro José Serra de conivência com a máfia das ambulâncias.
Quem acompanha de perto a história tem conhecimento também de um telefonema dado pelo petista Jorge Lorenzetti, responsável pela central de informações e contra-informações do PT, ao secretário particular do presidente Luiz Inácio da Silva, Gilberto Carvalho, relatando que o dossiê estava sendo primeiramente negociado por Vedoin com Abel Pereira - acusado de negociar com a máfia em nome do Ministério da Saúde na gestão de Barjas Negri, sucessor de Serra no governo Fernando Henrique.
E por que Abel Pereira estaria interessado num dossiê inconsistente e teria admitido pagar alto por ele? Suspeita-se de que os dados contidos no material não seriam tão inconsistentes assim no que se refere a ele.
De acordo com a narrativa, os petistas interceptaram a negociação que, naquela altura, girava em torno de uma soma de R$ 20 milhões. Era quanto Vedoin queria pelo dossiê.
Chegaram a um acordo por R$ 2 milhões (R$ 300 mil sumiram não se sabe como) e a promessa de que, havendo reeleição, o empresário não seria perseguido pelo governo. Nessa parte da história não fica claro se tinham autorização de alguém abalizado para fazer esse tipo de acerto. Logo, podem ter blefado, só para fechar o negócio, pois a promessa de proteção era o que mais interessaria a Vedoin.
O uso eleitoral pretendido está devidamente estabelecido nas investigações que, entretanto, dificilmente conseguirão comprovar a 'cadeia causal' entre a ação dos nada aloprados rapazes da estiva do submundo da espionagem política e uma ordem expressa do comando da campanha, com o conhecimento inequívoco do presidente da República.
Dora Kramer
dora.kramer@grupoestado.com.br
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