Otávio Cabral para Veja
Numa realidade apenas virtual, o PT quer reestatizar empresas privadas, acabar com o Senado e implantar o "socialismo sustentável". Na real, o objetivo é ter mais poder
O Partido dos Trabalhadores está vivendo um momento, digamos, Second Life, aquela brincadeira da internet em que as pessoas criam para si mesmas avatares com as qualidades que elas não possuem na vida real. Em sua Second Life, o PT é um partido ético, suas lideranças estão acima de qualquer suspeita e suas propostas têm legitimidade para resolver os grandes problemas do país. O avatar José Dirceu é saudado como o herói que volta de renhida batalha e os deputados acusados de corrupção são vítimas de uma grande conspiração, um certo "mensalão", que nunca existiu. O PT virtual pensa no futuro com magnanimidade, admitindo até apoiar um candidato de outro partido para a sucessão presidencial. No 3º Congresso Nacional do partido, encerrado na semana passada, em São Paulo, a vida vicária dos petistas atingiu seu delírio máximo. Criou-se ali um ambiente imaginário em que se aclamam virtudes que não existem e se aniquilam problemas que podem trazer algum tipo de constrangimento. No avatar petista, o passado recente foi expurgado e as perspectivas de futuro construídas em cima de teses delirantes, como a reestatização de empresas, a convocação de uma assembléia constituinte para fazer a reforma política e a extinção do Senado. Foram três dias de debates em que o petismo tentou recriar a realidade. Parecia a tela de um computador.
O congresso do PT aconteceu na mesma semana em que o Supremo Tribunal Federal decidiu aceitar a denúncia contra os quarenta acusados de integrar a maior e a mais bem organizada quadrilha já descoberta agindo na estrutura de governo. Como se sabe, entre os acusados, nove tinham posição de destaque no PT. O deputado José Genoíno, processado por corrupção ativa e formação de quadrilha, era o presidente do partido. Além dele, foram denunciados o ex-tesoureiro Delúbio Soares, o ex-secretário Silvio Pereira, o ex-ministro Luiz Gushiken, o ex-deputado José Dirceu, Professor Luizinho e João Magno e os deputados João Paulo Cunha e Paulo Rocha.
Enquanto isso, na vida real...
Na semana passada, ao comentar algumas das decisões do congresso do partido, Lula, desta vez no mundo real, admitiu que o PT jogou para a platéia. Segundo o presidente, o plebiscito para a reestatização da Vale do Rio Doce era uma maneira de fazer média com os movimentos sociais historicamente ligados ao partido. Ele garantiu que o governo não quer a reestatização nem pretende discutir a idéia. Para quem ainda não compreendeu, no mundo ideal o PT se diz um partido de esquerda, preocupado com as injustiças sociais, cioso da ética e empenhado em implantar o "socialismo sustentável", seja lá o que isso queira dizer. No mundo real, o PT tornou-se uma agremiação política como outra qualquer, estrelado por deputados acusados de corrupção e ocupados apenas com um objetivo: conquistar e manter o poder, se preciso à custa de reinventar a realidade.
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