8.9.07

O núcleo duro da consultoria

Três estrelas do primeiro governo Lula - Antônio Palocci, José Dirceu e Luiz Gushiken - hoje ajudam empresas. Discretamente

No primeiro mandato do presidente Lula, eles foram os personagens mais poderosos da República. Juntos, formaram o núcleo duro do Palácio do Planalto, numa versão petista da expressão noyau dur, usada nos meios acadêmicos franceses. Hoje, os ex-ministros José Dirceu, Antônio Palocci e Luiz Gushiken mudaram de cenário. Afastados do governo, atuam em outro palco. Dão conselhos e prestam serviços a grandes grupos empresariais. Ganharam tanto destaque que são apontados como o núcleo duro da consultoria brasileira. José Dirceu desistiu de desmentir que é consultor do bilionário mexicano Carlos Slim, dono da Embratel e homem mais rico do mundo. Gushiken, atuante entre os fundos de pensão, mantém os clientes em sigilo absoluto. Admite que faz consultoria e ponto final. Antônio Palocci, cada dia mais discreto, torce o nariz para os comentários sobre seus movimentos a favor de interesses empresariais. Mas, no início do ano, consultou a Comissão de Ética Pública e se considerou liberado para acumular a função de parlamentar com a de consultor financeiro. Como nada impede que faça pontes, o deputado foi à luta.

O trabalho do ex-chefe da Casa Civil é basicamente voltado para o Exterior. Ao longo da vida política e no comando da Casa Civil, ele criou laços de amizade com diversos políticos latino-americanos e até mesmo com quadros republicanos dos Estados Unidos. Dirceu tem um bom relacionamento com o presidente da Nicarágua, Daniel Ortega, é amigo de Alan Garcia, do Peru, e mantém contato com Néstor Kirchner, da Argentina, sem falar das boas relações com Hugo Chávez, da Venezuela, e Fidel Castro, de Cuba. Seus tentáculos atravessam o Atlântico e chegam a Portugal. Nos países que constam de sua agenda, Dirceu consegue abrir portas para seus clientes sem maiores dificuldades. Em junho, por exemplo, quando o presidente da República Dominicana, Leonel Fernandez, visitou o Brasil, fez questão que Dirceu participasse da reunião com a Fiesp. No momento, a República Dominicana está investindo pesado na modernização de seus portos. E, com a ajuda de Dirceu, está atrás de empreiteiros experientes.

De todas as ligações de Dirceu, uma lhe rende excelentes frutos: a do bilionário Carlos Slim. Numa roda de amigos, José Dirceu contou que Slim, recentemente, lhe deu um conselho: “Zé, vem para o México e abre um escritório aqui. No dia seguinte mais de 30 empresários vão bater na sua porta. Todos pensam que você é meu conselheiro.” O exministro reconhece que a amizade com Slim é preciosa. E, pelo mesmo motivo, também parou de negar que o empresário Eike Batista integre sua clientela. Dirceu também é procurado por empresas estrangeiras sediadas no Brasil, que sabem que ele tem informações de cocheira sobre o governo Lula. Não só porque foi o todo-poderoso da Casa Civil, mas porque mantém vínculos com todos os escalões do poder.

As atividades de Palocci e Gushiken têm menos visibilidade. O ex-ministro da Fazenda especializou-se em assessorar empresas com problemas financeiros e em dificuldades com o Fisco. Com a experiência que acumulou no comando da economia, Palocci ensina o caminho das pedras para os empresários que precisam reduzir os níveis de endividamento e soerguer seus empreendimentos. Palocci também tornou- se próximo de grandes grupos financeiros, que sempre aplaudiram o êxito de sua gestão no fortalecimento dos fundamentos da economia. No momento, o ex-ministro tenta ajudar o Bradesco a se manter como correspondente do Banco Postal. Faz o possível para quebrar as resistências do ministro das Comunicações, Hélio Costa.

Quanto a Luiz Gushiken, sua tendência natural seria prestar consultoria na área de telefonia, pois, quando secretário de Comunicação, envolveu-se de corpo e alma na tumultuada – e até mesmo desleal – competição entre grupos nacionais e estrangeiros. Tornou-se inimigo mortal do empresário Daniel Dantas. E dá-se como certo, ainda hoje, que Gushiken tem forte influência no setor. O exemplo mais citado é o da Brasil Telecom, cuja direção, no entanto, nega vínculos com o ex-ministro. Em sua passagem pelo governo Lula, Gushiken também teve em sua órbita os fundos de pensão. Há quem diga que, agora, como conseqüência dessa experiência, ele está prestando serviços a empresas que pretendem criar mecanismos de previdência complementar para seus funcionários. Seu escritório não só dá recomendações sobre o desenho dos fundos de pensão como se responsabiliza pelo cálculo atuarial, vital nesse tipo de investimento. Gushiken também seria consultor da companhia aérea BRA, que, em junho, encomendou 40 jatos à Embraer, controlada por fundos de pensão. Procurado, ele se fechou em copas:

“Eu não quero dar entrevista. Hoje, estou parado para jornalistas.” Há que respeitar o mau humor do ex-ministro. Mas, certamente, em suas relações com clientes, ele é mais cordato. Afinal, o núcleo duro do Palácio do Planalto virou coisa do passado e é preciso sobreviver longe do poder. O que não tem sido difícil para Dirceu, Gushiken e Palocci.

OCTÁVIO COSTA E ADRIANA NICACIO para IstoÉ Dinheiro

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