24.1.09

Brasil quer dividir R$ 4,7 bi de Dantas com três países

País ficará com R$ 2,35 bi se EUA, Reino Unido e Suíça bloquearem verba em definitivo

Investidores do Opportunity Fund podem recorrer de decisão se provarem origem legal de verba, mas devem "ficar quietos", diz advogado


O governo brasileiro já está negociando com representantes dos Estados Unidos, do Reino Unido e da Suíça a divisão dos cerca de US$ 2 bilhões (R$ 4,7 bilhões) pertencentes ao grupo Opportunity, do banqueiro Daniel Dantas, que foram bloqueados pela Justiça desses três países.
A divisão dos recursos, na proporção de 50% para cada país, está prevista na lei brasileira de combate à lavagem de dinheiro. Se o Judiciário em cada um dos países que bloquearam os valores decidir que eles devem ser sequestrados definitivamente, o governo brasileiro ficará com R$ 2,35 bilhões.
Só para comparar: R$ 2,3 bilhões é praticamente a metade do valor do trecho sul do Rodoanel, uma das maiores obras públicas em execução no Brasil, orçado em R$ 5 bilhões.
Com R$ 2,3 bilhões daria para fazer seis estádios similares ao Engenhão, construído no Rio para os Jogos Panamericanos.
Ontem, o secretário nacional de Justiça, Romeu Tuma Jr., voltou a confirmar o montante bloqueado. O Ministério Público Federal, em São Paulo, divergiu do valor, afirmando que o bloqueio soma US$ 450 milhões. "Não necessariamente os pedidos de cooperação têm de partir do Ministério Público Federal. Pode ter partido da autoridade policial, de outras instituições, desde que com autorização judicial."
O bloqueio de US$ 2 bilhões é o maior valor já sequestrado no exterior a partir de uma investigação da Polícia Federal.
Não é fácil, porém, repatriar esses recursos, como mostram números do DRCI (Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional), o órgão do Ministério da Justiça encarregado de representar o país nesses casos. O Brasil conseguiu até agora o bloqueio de cerca de US$ 2,8 bilhões, mas só voltou para o país US$ 1,5 milhão.
Esses três países só repatriam valores após uma sentença judicial definitiva. Isso não deve ocorrer antes de dez anos, segundo delegados da PF.
Em dezembro, a Folha revelou que representantes do governo desses países vieram ao Brasil para analisar documentação da Operação Satiagraha.
É a terceira vez que o Opportunity tem recursos congelados desde que a PF deflagrou a operação, em julho passado.
Em setembro, a Justiça do Reino Unido bloqueou US$ 46 milhões. No mesmo mês o juiz federal Fausto De Sanctis determinou o sequestro de R$ 535,8 milhões. Foi De Sanctis que pediu o bloqueio dos recursos do Opportunity nos EUA.
Em todos os casos, a Justiça determinou o bloqueio por julgar que há indícios de que o dinheiro tem origem ilícita. Segundo a PF, dos US$ 2 bilhões bloqueados, cerca de US$ 450 milhões pertencem ao Opportunity Fund. Já o Opportunity diz que o dinheiro é do próprio banco, resultado da venda da Brasil Telecom por Dantas.
Apesar de o fundo estar registrado nas ilhas Cayman, um paraíso fiscal no Caribe que garante o anonimato ao investidor, os recursos estão depositados em Nova York, no banco Brown Brothers Harriman.
Um juiz da corte distrital de Washington considerou que os documentos enviados pelo delegado Ricardo Saadi continham indícios de dois tipos de ilícitos: lavagem de dinheiro e crime contra o sistema financeiro. Segundo a PF, boa parte dos recursos saíram do Brasil de forma ilegal, por doleiros.
O fundo era restrito a estrangeiros e brasileiros residentes no exterior, mas recebeu recursos de brasileiros que vivem aqui, de acordo com a PF. Perícia feita pelo Instituto Nacional de Criminalística aponta que parte dos investidores no Brasil não declarou o valor que tem no fundo à Receita.
Os investidores que se sentirem prejudicados pelo congelamento poderão recorrer nos países e obter o desbloqueio, caso comprovem a origem legal do dinheiro, avalia o advogado Otto Steiner Jr., especialista em direito bancário.
"Não tenho muitas dúvidas de que a maioria dos clientes do fundo vai ficar quieta e não vai reclamar o dinheiro para não sofrer um procedimento criminal", diz o advogado.
Se ficar comprovado que houve remessa ilegal, o investidor pode perder o dinheiro, sofrer um processo criminal e receber uma multa da Receita. Ficando quieto, ele só perde o dinheiro. Isso ocorreu com brasileiros que enviaram dólares para o MTB Bank e que tinham aplicações com o americano Bernardo Madoff. Ninguém reclamou.
Folha

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