7.1.08

É fácil falar

Ministros se esmeram em anunciar, mas não em efetivar, medidas de efeito, como fez Genro sobre mortes no trânsito

ESTÁ COBERTO de razão o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, ao pontificar que não é possível administrar um país "da praia". Seria ainda mais sábio caso abrangesse em seu ensinamento colegas de Esplanada como os titulares da Justiça, da Defesa e da Fazenda e outros locais públicos, como calçadas e átrios palacianos. Se toda a criatividade que políticos exibem sob a luz do sol e de holofotes fosse aplicada no recesso dos gabinetes a providências razoáveis e factíveis, haveria mais governo no país.
Não se sabe, por exemplo, que fim levou a proposta de um fundo soberano de US$ 10 bilhões. "Anunciado" por Guido Mantega em outubro, ao sair de reunião conjunta do FMI e do Banco Mundial, em Washington, a idéia mirabolante parece ter sumido da pauta governamental.
Nelson Jobim, de seu lado, especializou-se nas declarações bombásticas em torno de aeroportos, a começar pela promessa de "comando" na Pasta assumida em plena crise aérea. Só para defenestrar o presidente da Agência Nacional de Aviação Civil precisou de três meses. Do local para o terceiro aeródromo paulista, ou do plano para aumentar a distância entre poltronas, nunca mais se ouviu falar.
Já se disse que governar é decidir o que fazer e fazer o que se decidiu. A gestão Lula, contudo, tem sido deficiente em ambas as tarefas. Não se pode imaginar outra explicação para os disparates com que Tarso Genro se saiu ao anunciar a escalada de 11% no total de mortos em rodovias federais no ano que passou, com a marca de 6.840 óbitos.
Genro prometeu "medidas draconianas" para conter a carnificina. Pareceu mesmo disposto a rivalizar com as estipulações do legislador ateniense Drácon no século 7º a.C. Redução do limite legal para o teor de álcool no sangue, criminalização do excesso de velocidade, seqüestro de automóveis... até em atrelar multas ao valor do veículo o ministro pensou, para intimidar "delinqüentes do trânsito".
Não há dúvida de que pululam delinqüentes nas deterioradas, mal sinalizadas e mal policiadas rodovias federais. O flagelo não será erradicado, porém, à base de increpações ministeriais. O efeito intimidador de penalidades duras já se comprovou com o novo Código de Trânsito Brasileiro. Desde sua adoção, em 1997, o número de mortos caiu de 8.157, naquele ano, para o patamar de 6.000, entre 2001 e 2006.
É duvidoso que as declarações de Genro produzam conseqüências. Mesmo que novas punições um dia se tornem projeto de lei e terminem aprovadas pelo Congresso, não haveria garantia de que venham a coibir os abusos atuais. Se hoje os motoristas são mais desobedientes, isso não decorre de uma insuficiência repentina do código, mas da perceptível erosão do empenho das autoridades na sua aplicação.
Na praia, na estrada ou nos gabinetes, o país tem mais governo quando ministros se aplicam em fazer cumprir as leis, não em lucubrar no seu endurecimento apenas para ganhar holofotes. Folha

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