13.2.09

Campanha biônica

Editorial da Folha
Lula se prevalece da legislação eleitoral e antecipa corrida sucessória com ministra que tirou do anonimato

DO POWER Point ao pagode, vai de vento em popa o mutirão que tenta popularizar a imagem da chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff. Sairá candidata à sucessão de Lula? "Deixa a vida me levar", cantarolou a ministra na saída de mais um evento preparado para alçá-la ao estrelato.
As aulas de lulismo produzem outros efeitos. Rousseff conseguiu deixar de lado o soporífero slide show do PAC e falou de improviso a milhares de prefeitos especialmente reunidos em Brasília. O programa federal de obras ganhou até alegoria pecuária. O PAC é "uma vaquinha" que "está ficando bem gordinha", metaforizou a petista.
Como traquejo e manemolência não se assimilam com facilidade, o resultado parcial soa bizarro. Afinal, nesse projeto sucessório acalentado pelo presidente Lula, o estranhamento não transparece apenas no contraste entre a sisudez tecnocrática da ministra e o figurino macunaímico que tenta vestir.
Não é comum que um presidente da República se ponha a inventar um candidato para sucedê-lo. Se "política tem fila", como diz o clichê, Lula deu a famosa carteirada e de uma só tacada arrancou Dilma Rousseff do bolso do colete, do anonimato e da inexperiência político-eleitoral.
A fila do Partido dos Trabalhadores, conceda-se, parecia mais um cordão de fuzilados após o escândalo do mensalão. Este, por sinal, foi o lance que determinou as condições do jogo atual: Lula sobreviveu e se fortaleceu; o PT se descaracterizou e se submeteu ao ditado presidencial; Dilma Rousseff substituiu José Dirceu, caído em desgraça.
A transformação de Lula num aiatolá petista, um caudilho que impõe sua vontade e é adulado por isso, não deixa de funcionar como golpe de misericórdia na imagem de uma sigla que gostava de se identificar como a única organização partidária digna do conceito no país. O PT resignou-se a louvar Lula e aparelhar a máquina pública.
Os rasgos cesaristas, entretanto, não ficam restritos à relação entre Lula e seu partido. Inebriado em popularidade, o presidente movimenta seu arsenal numa direção preocupante. Enquanto brinca de atacar e depois afagar os meios de comunicação, se acha no direito de decidir, ao arrepio da previsão legal e da responsabilidade do cargo, quando e em que condições dar início à campanha eleitoral de 2010.
Dilma Rousseff é exposta à exaustão em palanques pelo Brasil afora, em atividades que notoriamente vão muito além de suas atribuições de ministra. Beneficia-se, sozinha, da tutela excessiva da legislação eleitoral, que impede outros potenciais candidatos de fazerem campanha até meados do ano que vem.
Antecipar, nessas condições, a corrida sucessória da candidata biônica do presidente Lula pode parecer, para alguns, um lance de rematada esperteza. Mas é péssimo num país que precisa de tranquilidade, institucional e política, para enfrentar uma gigantesca crise internacional.

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