11.9.08

Morales expulsa embaixador americano

Presidente boliviano acusa diplomata de conspirar com oposição; Washington rechaça denúncia e vê "grande erro" de La Paz

Governo afirma que não reagirá com violência a golpistas; "a oposição quer um morto e não vai ter", diz ministro da Presidência


O presidente boliviano, Evo Morales, declarou ontem o embaixador americano Philip Goldberg "persona non grata", o que o obriga a deixar o país.
Morales acusou o diplomata de conspirar com opositores contra a unidade nacional, que estaria ameaçada pelo que o porta-voz presidencial Iván Canelas chamou "tentativa [da oposição] de desencadear uma espécie de guerra civil".
No discurso pronunciado no Palácio do Governo, Morales mandou que o chanceler David Choquehuanca cumpra os marcos legais e diplomáticos para que "aquele que conspira contra a democracia e busca a divisão da Bolívia" volte "imediatamente" aos Estados Unidos. Citando o trabalho de Goldberg para o Departamento de Estado americano na Bósnia e em Kosovo, qualificou-o como "especialista em promover conflitos separatistas".
O chefe da diplomacia americana para a América Latina, Thomas Shannon, rechaçou as acusações de Morales e afirmou que a expulsão é "um grande erro". Goldberg "é um diplomata com comportamento impecável", disse Shannon.
O governo boliviano relacionou ontem a viagem aos Estados Unidos do empresário Branko Marinkovic -líder do poderoso Comitê Cívico do departamento de Santa Cruz, que reúne a elite regional- ao levante de opositores na região, a mais rica da Bolívia. La Paz acusa Marinkovic de ter fomentado a violência anteontem, quando voltou ao país.

"Golpe civil"
"O fascismo deu início a um golpe de Estado contra a unidade do país e a democracia", afirmou o ministro do Governo, Alfredo Rada. Segundo o ministro, a ofensiva da oposição será enfrentada "junto ao povo", com todos os instrumentos legais ao seu alcance. "Os fascistas não passarão." "Certamente eles estão esperando que respondamos com armas. Não vamos abrir fogo, não usaremos armas de fogo sob nenhuma circunstância.
Não vamos pôr em risco a vida dos cidadãos", afirmou o ministro da Presidência, Juan Ramón Quintana. "O que a oposição quer é um morto e isso eles não vão ter."
O ministro da Defesa, Walker San Miguel, elogiou ontem o "trabalho patriótico" das Forças Armadas e da Polícia Nacional -que, nas palavras reproduzidas pela agência estatal de notícias da Bolívia, "enfrentaram os vândalos com tolerância e sem disparar nenhuma bala".
O governo afirma que não reagirá com violência nem decretará estado de sítio. Especialistas citam o despreparo dos militares bolivianos como uma das razões para a relutância em conter, pela força, os motins.
"O governo sabe que nem a Polícia Nacional nem as Forças Armadas estão preparadas para situações como essa, de motim.
Há essa consciência, e isso só mostra a debilidade do Estado boliviano", afirma Roberto Laserna, economista e estudioso dos conflitos na Bolívia, lembrando o episódio de 2003, quando mais de 70 morreram na chamada "guerra do gás".
Ele não crê em golpe nem em enfrentamento com forças de segurança regulares. O risco, diz, é que ocorram conflitos entre grupos civis dos dois lados. Para Manuel Mercado, do Observatório de Politicas Publicas -ligado à Presidência-, "há um nervosismo grande na polícia e nas Forças Armadas, há muita pressão por uma ação mais dura do governo, de setores das Forças e dos movimentos sociais". A decisão de não declarar estado de emergência é "muito dinâmica", diz o especialista. "Tudo esta sendo reavaliado o tempo todo."

"Terrorrismo de Estado"
O governador de Santa Cruz, Rubén Costas, ex-líder "cívico" do departamento e principal opositor de Morales, culpou o presidente pela "batalha campal" registrada na terça na capital cruzenha. Segundo Costas, o conflito é causado pelo "terrorismo de Estado" e pela "cegueira" em não reconhecer "o direito dos povos (...) às autonomias departamentais". O presidente do Senado boliviano, Óscar Ortiz, do opositor Podemos, de direita, ameaçou intensificar as manifestações caso o governo insista em aprovar a nova Carta.
Folha

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