9.9.08

Dantas dribla Receita com recursos judiciais

Fisco só conseguirá analisar 670 das 24 mil operações financeiras de disco rígido do Opportunity apreendido pela PF em 2004

Por lei, a Receita só pode cobrar impostos retroativos a cinco anos; disco obtido na Operação Chacal registrava movimentações desde 19
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Graças à passagem do tempo, em parte propiciada pela apresentação de recursos judiciais, o banqueiro Daniel Dantas, do Opportunity, livrou milhares de operações de seus clientes de passar pelo crivo da Receita. O fisco vai analisar apenas 670 das quase 24 mil movimentações que constam do disco rígido do banco apreendido pela Polícia Federal em 2004 e que tiveram o responsável identificado pela fiscalização.
Assim, em vez de ter como base de cálculo US$ 6 bilhões para cobrar impostos devidos aos cofres públicos, os fiscais da Receita irão se debruçar sobre um montante de US$ 534 milhões -a soma das 670 operações entre 2003 e 2004.
A Folha tentou, sem sucesso, falar com o advogado de Dantas até a conclusão da edição.
Por lei, a Receita só pode cobrar impostos devidos retroativos a um prazo de cinco anos. A matéria-prima do trabalho dos fiscais poderia ser maior, não fossem os sucessivos recursos que os advogados do banqueiro apresentaram e por meio dos quais conseguiram, inclusive no STF (Supremo Tribunal Federal), a proibição da abertura e da análise dos dados contidos no disco rígido apreendido na Operação Chacal e que registra 33 mil operações financeiras internacionais, entre dezembro de 1992 e junho de 2004.
O principal argumento dos advogados é que as movimentações não eram alvo da Chacal, que tinha como foco a contratação da empresa Kroll para espionar, inclusive com métodos ilegais, a Telecom Italia -que mantinha disputas judiciais com a Brasil Telecom, então gerida pelo Opportunity.
Por uma manobra jurídica do Ministério Público e da PF, o sigilo do disco rígido foi quebrado, sob o argumento de que necessitavam ter acesso aos dados para verificar eventual envolvimento do banqueiro com o mensalão -o esquema de pagamento a congressistas da base aliada em troca de apoio ao governo Lula. Tudo isso ancorado no fato de que as companhias telefônicas de Dantas teriam contribuído com R$ 150 milhões para tais pagamentos.
Três anos depois de aprovada a quebra do sigilo do disco rígido pela Justiça, os peritos acessaram seus dados e constataram a prática de crime financeiro. Elaboraram um laudo que foi um dos fundamentos para a prisão de Dantas na Operação Satiagraha, em julho.
As operações financeiras sob investigação da Receita e da PF fazem parte de um tipo de aplicação destinada a um fundo no qual só podem investir pessoas não-residentes no país. Ao colocar seu dinheiro no Brasil, ganham como benefício isenção de Imposto de Renda.
Havia a suspeita, confirmada pela Satiagraha, de que residentes no Brasil usavam essa movimentação para burlar a lei e livrar-se de tributos.
A passagem do tempo, com os sucessivos recursos, na prática fez com que uma montanha de US$ 5,5 bilhões eventualmente ilegais tenha sido legalizada, o que beneficia diretamente clientes de Dantas.
As 670 operações sob investigação têm como titulares 120 pessoas físicas e jurídicas. Entre impostos, juros e correção monetária, devem recolher mais de R$ 6 bilhões.
Ainda que prescritos do ponto de vista da Receita, os crimes financeiros continuam sob investigação, na esfera criminal, da equipe da PF da Satiagraha.
Folha

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