17.10.09

O talibã de Obama é... uma TV!

A Casa Branca perde a linha e parte para cima da Fox News,
a única emissora que fiscaliza o governo numa imprensa ainda
apaixonada por Obama. A TV, claro, deitou, rolou e rolará


André Petry, de Nova York

Jill Greenberg / Corbis / Latinstock
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"ESTE É O INIMIGO, AMÉRICA!"

Glenn Beck e, na sequência de fotos, sua sátira da Casa Branca atacando os estúdios da Fox no mapa de Nova York: prontidão no telefone vermelho


A sincronia dos acontecimentos não deixa margem a dúvida. Primeiro, o presidente Barack Obama aplicou um castigo no inimigo. Depois, tentou amansá-lo, mandando um assessor com uma conversa de lábios de mel. Também não deu certo. Aí, na semana passada, abriram-se as baterias contra o inimigo – no caso, a Fox News, o canal de notícia mais popular da TV a cabo dos Estados Unidos. O primeiro torpedo veio quando o porta-voz do governo, Robert Gibbs, disse que já viu muitas reportagens na Fox que "não são verdadeiras". Em seguida, despejando chumbo mais grosso, veio o segundo torpedo. Em entrevista à CNN, concorrente da inimiga, a chefe da assessoria de imprensa da Casa Branca, Anita Dunn, acusou a emissora de ser um "braço do Partido Republicano" e anunciou que o governo vai tratá-la do "mesmo jeito que trata um oposicionista". Foi como uma declaração oficial de guerra. Tudo porque a Fox critica, denuncia e azucrina a administração Obama dia após dia. Das grandes redes, é a única emissora da televisão americana que faz o que toda a imprensa deveria estar fazendo: fiscalizar o governo.

O troco veio na forma amarga do ridículo. O apresentador Glenn Beck, 45 anos, humorista nato, dono da audiência que mais cresce no país, deitou e rolou. Na segunda-feira, abriu seu programa na Fox com um mapa de Nova York, marcou o local do edifício da emissora, cercou-o com aviões e tanques militares de plástico e esbravejou: "Este é o inimigo, América! Tudo o que está errado no país acontece bem aqui!". No dia seguinte, instalou no estúdio um telefone vermelho para que a Casa Branca ligue quando ouvir uma informação mentirosa. Desde então, ele vive sussurrando ao telespectador: "Anita Dunn ainda não ligou...". Pegou no pé da moça. Mostrou um vídeo em que Dunn exibe a coe-rência de seu ideário – é fã, em igual medida, de Madre Teresa de Calcutá e Mao Tsé-tung. As escaramuças contra a Fox vêm de antes. Em setembro, Obama fez um tour dominical pelas TVs e excluiu a Fox. Depois, despachou seu auxiliar, David Axelrod, para uma conversa sigilosa com Roger Ailes, cérebro do sucesso da emissora. A conversa não serviu para sossegar o governo.

Fundada em 1996, a Fox News integra o conglomerado do bilionário Rupert Murdoch, do qual faz parte o Wall Street Journal, que acaba de roubar do USA Today a coroa de o maior jornal do país. Já na campanha eleitoral, a Fox ficou nos calcanhares de Obama. Jogou luz sobre seu pastor, Jeremiah Wright, o amalucado que pedia "Deus amaldiçoe a América". Obama deixou a igreja. Depois da posse, coube à Fox divulgar que o responsável por empregos ecológicos da Casa Branca, um tal de Van Jones, era um radical esquerdista do tipo que acusa o governo de tramar o 11 de Setembro. Jones foi demitido. A Fox também noticiou que a Acorn, entidade ligada aos democratas que atua no movimento comunitário e recebe dinheiro público, é um antro de ilegalidades. Equipes flagraram funcionários da Acorn ensinando a sujeitos que se faziam passar por imigrantes como montar uma casa de prostituição com meninas menores de idade. Não foi um azar da Acorn. Ensinar a cometer crimes parece parte dos seus serviços. O flagra deu-se em seis escritórios da Acorn em diversos estados, e em todos a orientação sobre como explorar sexualmente menores de idade foi dada com a mesma precisão. O Congresso se limitou a cortar o dinheiro da Acorn.

Chris Bowe/Corbis/Latinstock
SOB CONTROLE TOTAL
O’Reilly, líder de audiência: malho no governo e "psiu" para entrevistado


A Fox não falsifica fatos. Ela os relata com a crueza necessária. Assim, destaca-se no cenário de jornalismo serviçal à Casa Branca que se instalou nos EUA. Os leitores do New York Times, por exemplo, foram informados do escândalo da Acorn de forma truncada, parcial e vergonhosamente partidária. Nesse ambiente, a Fox sente-se segura para caricaturar e reafirmar a ideologia e os preconceitos de sua audiência. Glenn Beck, com seus olhos arregalados, parece um pregador messiânico, a última esperança para "salvar a América dos comunistas marxistas revolucionários". A visão é desagradável até para os conservadores. Michael Savage, o popular radialista conservador, diz que Beck é "uma hemorroida com olhos". Desde que a Casa Branca decidiu competir com Beck para ver quem reage de forma mais ridícula, seu show tem sido mais engraçado que ofensivo. O mapinha de guerra e o telefone vermelho são achados cômicos sensacionais. Governos, de esquerda, centro ou direita, acima ou abaixo do Equador, têm de lidar com a imprensa, com toda a imprensa: a chapa-branca e aduladora, a crítica e independente e a sensacionalista ou irresponsável. Os presidentes americanos costumam ser mestres nessa arte que, agora, parece perdida. E virou piada: além da Al Qaeda, Bin Laden, talibãs e aiatolás, Obama tem agora a Fox.

A história americana é crivada de exemplos de imprensa atacando o governo impiedosamente. George Washington? Um déspota que "ameaçou a própria existência da liberdade", segundo The Aurora. Abraham Lincoln? Um "gorila tirano que usurpou a Presidência", de acordo com The Old Guard. Franklin Roosevelt? Implementava "o manifesto comunista de 1848 com mais competência que a Rússia", segundo The Nation’s Business. Mas é raro encontrar exemplo do contrário, de governo atacando a imprensa. Acontece. Aconteceu com Richard Nixon, quando o jornal The Washington Post denunciava o Watergate. É raro porque é incompatível com a democracia americana – na verdade, com qualquer democracia que mereça o nome. George W. Bush e o vice Dick Cheney achavam que o New York Times e a CNN eram um braço do Partido Democrata. E aí? Presidentes devem ficar acima disso. A lição vem dos tempos de Thomas Jefferson (1743-1826), que, se tivesse de escolher, preferiria "uma imprensa sem governo a um governo sem imprensa".

Alexis C. Glenn / UPI / Landov
BARULHENTO ELE É
Limbaugh, o radialista mais popular dos EUA: esbraveja e provoca, mas não dá as cartas do jogo político


Em vez de se contentar com a docilidade generalizada que já desfruta na imprensa, a Casa Branca, ao confrontar a Fox, exige nada menos que a unanimidade a favor. É mau sinal, mas é também um equívoco de curto e longo alcances. De curto alcance, porque a tendência é que o telespectador da Fox se torne ainda mais fiel. O erro de longo alcance é comparar a Fox com os republicanos. No governo Bush, do qual era devota, a emissora não mostrou um décimo da combatividade atual. Mas não é republicana. Faz uma agitação direitista que é mais espetáculo e fanfarra do que manifesto ou linha partidária. A Fox não quer eleitores. Quer audiência. E está conseguindo. Dos dez programas mais vistos dos canais de notícias a cabo, todos – sim, todos – são da Fox. O líder é The O’Reilly Factor, apresentado por Bill O’Reilly, um senhor que desce o malho no governo e faz "psiu" para mandar o entrevistado calar a boca. Está há mais de 100 semanas no topo de audiência.

A Fox faz parte de um nicho dominado por essa direita estridente. Nas rádios, a supremacia é acachapante. Todos os dez programas mais ouvidos são apresentados por algum radialista conservador. A explicação é singela. "Acontece que eles são os mais talentosos, oferecem o que o público busca: informação e entretenimento", diz Michael Harrison, da revista Talkers, a bíblia do rádio do país. O campeão, com 14 milhões de ouvintes semanais, é Rush Limbaugh, eterno guru da provocação política. Faz tanto sucesso que enriqueceu. Coleciona carrões, tem avião de 54 milhões de dólares e cinco casas na Flórida. Uma delas, de 6 000 metros quadrados, tem réplica do lustre de cristal Baccarat do hotel Plaza, em Nova York, e quarto de hóspedes que imita a suíte presidencial do George V, em Paris. Na lista dos livros mais vendidos do New York Times, todos os títulos de política, com uma exceção, são de autores da direita. O sucesso do momento é Arguing with Idiots (Discutindo com Idiotas), do mesmo Glenn Beck da Fox. Seu livro é um manual de instruções para debater com democratas liberais e esquerdistas em geral – os "idiotas".

Amanda Lucidon / The New York Times
BALAIO DE CONTRAS
Manifestação contra o governo de Obama: o entusiasmo popular está nas ruas, mas onde estão as ideias?


Glenn Beck é, ele mesmo, o melhor exemplo da ascensão da direita festiva pós-Obama. Há dez anos, sua vida poderia ser resumida assim: filho de mãe suicida e alcoólatra em recuperação, ele acaba de se casar de novo e perder o emprego de radialista – pela quarta vez. Hoje, uma década depois, ele é um fenômeno. Escreveu seis livros, e quatro chegaram à lista do Times. Seu site recebe 5 milhões de visitantes únicos por mês. No rádio, com 8 milhões de ouvintes semanais, tem a quinta maior audiência. Mas explodiu mesmo foi na Fox. Seu programa estreou em janeiro, junto com Obama na Casa Branca. Em setembro, Beck apareceu, de língua de fora, na capa da revista Time. Já ganhou 23 milhões de dólares. Apesar do sucesso na TV, em rádios e livrarias, essa turma não dá as cartas no jogo político, nem no Partido Republicano. "Não devemos confundir barulho com influência", diz Markus Prior, professor de Princeton e autor de Post-Broadcast Democracy, uma análise sobre a TV e a internet na política americana. "A vasta maioria dos americanos é politicamente moderada."

No período glorioso do movimento conservador americano, dos anos 60 até o governo de Ronald Reagan, havia um equilíbrio entre a direita fanfarrona e os intelectuais do conservadorismo, como William Buckley e Milton Friedman. Hoje, restou só a fanfarra. Obama, com seus assessores torpedeando a Fox, parece profundamente irritado de ser chamado de "comunista do Quênia" ou ser acusado de querer matar velhinhos, doutrinar crianças na ideologia marxista ou despachar adolescentes para campos de reeducação. Talvez tudo isso faça mais estrago ao próprio conservadorismo americano, que, assim, arrisca passar a imagem de ser constituído apenas dessas frivolidades paranoicas, como a de dizer – essa é impagável – que Hillary Clinton, na verdade, é uma judia lésbica chamada Rodenhurst...! O pensador John Derbyshire, num artigo recente, disse que se o movimento conservador seguir na mão dessa direita midiática vai acabar parecido com "um McLanche Feliz: barato, infantil e familiar".

Susan Walsh/AP
A VOZ DO MAO
Anita Dunn, que criticou a Fox em entrevista na CNN: fã de Madre Teresa e Mao Tsé-tung


"O conservadorismo prospera mais quando os ataques contra o liberalismo combinam ideias alternativas sérias com entusiasmo popular", escreveu Steven Hayward, autor de A Era Reagan. Ninguém sabe onde estão as ideias sérias, mas o entusiasmo popular está aí – na audiência da TV e do rádio, na preferência pelos livros de crítica aos democratas e ao governo, e até nas ruas, território monopolizado pela esquerda. Em 12 de setembro, 70.000 pessoas fizeram uma manifestação em Washington. Sintomaticamente, não havia clareza nas mensagens dos manifestantes. Protestavam contra a ajuda bilionária a bancos e montadoras, a reforma do sistema de saúde, contra uma sensação de que o país está inclinando-se demais à esquerda. Parecia, no fundo, uma massa em busca de uma ideia e de um líder. Glenn Beck estava lá. Mas Glenn Beck já chamou Obama de "racista", atraiu um boicote de anunciantes ao seu programa – gente graúda como AT&T, Mercedes-Benz, HSBC – e obviamente não é um líder político. É um excelente animador de auditório, que ridiculariza a Casa Branca e, deitando e rolando, continua à espera da ligação de Anita Dunn...

Um comentário:

Anônimo disse...

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