13.5.09

Caixa um e meio

Editorial da Folha

Doação indireta ao político, feita via partido, é cômoda para várias empresas, mas se choca com o interesse público

A PRODIGIOSA criatividade dos políticos brasileiros inventou um sistema de financiamento de campanhas peculiar. Trouxe ao mundo um meio termo entre o caixa um -no qual o elo entre o doador e o beneficiário é claríssimo- e o caixa dois.
Quem não quer revelar o destino final do dinheiro doado, mas tampouco deseja atuar na ilegalidade, pode optar pelas contribuições indiretas, por meio do partido. A alternativa oferece um outro bônus: enquanto as contas de campanha dos candidatos são abertas 30 dias após o encerramento do pleito de outubro, os partidos terão de publicar seus balanços apenas no fim de abril do ano seguinte.
No Brasil, grandes doadores têm seus motivos para permanecer na meia-luz. Como contribuem ao mesmo tempo com candidatos e partidos rivais entre si -e têm interesse em decisões de Estado-, temem ser vítimas de represália caso o político vencedor saiba ter sido prejudicado na divisão de fundos.
Não é de espantar, portanto, que 60% dos fundos eleitorais doados por empreiteiras, bancos e empresas de coleta de lixo na eleição municipal do ano passado tenham fluído para o caixa geral dos partidos políticos, e não para candidatos específicos. Nesse ambiente favorável à camuflagem, mais curioso talvez seja notar o contrário -que 40% ainda lancem mão da via mais transparente.
Compreender a preferência de grandes doadores por contribuições oblíquas, decerto, não é justificar tal modelo, que se choca com o interesse público. Em matéria de financiamento eleitoral, não se prescinde da explicitação total do caminho do dinheiro.
O Tribunal Superior Eleitoral cogita implantar dispositivos para dificultar a manobra já no pleito de 2010. Uma maneira de fechar brechas para doações legais ocultas é estabelecer a prestação de contas instantânea de campanhas no Brasil. A qualquer cidadão deve ser permitida a consulta, na internet, à conta corrente, seja do partido, seja do candidato, no período eleitoral.
Tão interessante quanto ampliar a visibilidade sobre os fundos de campanha seria implantar ligeiras modificações a fim de diminuir o peso dos grandes doadores -estabelecendo um montante em reais como teto- e favorecer a multiplicação de pequenas contribuições. É o caso de oficializar as doações de cidadãos feitas pela internet, com cartão de crédito ou débito.
A democracia só ganha conforme mais pessoas e empresas passem a custear, às claras, as candidaturas de sua preferência.

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