Filósofo só desiste de processar empresa controlada por fundos estatais 1 ano após posse
Acordo só saiu depois da interferência de Dantas, na negociação da fusão BrT-Oi; Mangabeira diz que instruiu retirada de ação em 2007
Só depois de um ano no governo, o ministro Roberto Mangabeira Unger (Assuntos Estratégicos) desistiu, em maio passado, da ação judicial que movia contra a BrT (Brasil Telecom), controlada por fundos de pensões estatais.
A informação, que aparece em e-mails interceptados pela Polícia Federal na Operação Satiagraha, foi confirmada à Folha por Mangabeira e pela Brasil Telecom.
Os e-mails indicam que a desistência da ação era uma exigência do Opportunity, de Daniel Dantas, em um acerto feito diretamente com a BrT. Esse entendimento abriu caminho para a fusão da BrT com a Oi, acertada em abril. Dantas travava disputa com a BrT, que já havia controlado, e abandonou o jogo em um acordo estimado em US$ 1 bilhão.
O processo, movido por Mangabeira em abril de 2007, e a ligação dele com Dantas, causaram desconforto no governo e quase lhe custaram o cargo -que só assumiu em junho daquele ano. À época, Mangabeira afirmou que desistira da ação em nome do cargo.
Por meio de sua assessoria de imprensa, ele disse que instruiu seus advogados a retirarem a ação no ano passado, antes de ele tomar posse, mas que a formalização só ocorreu em maio por conta das "negociações entre os envolvidos".
Procurado desde segunda, Mangabeira não comentou a interferência do Opportunity. O Palácio do Planalto não se manifestou.
Mangabeira tomou posse em junho de 2007, mas já havia sido indicado ao cargo em março daquele ano. Ou seja, ele moveu a ação contra a BrT pouco depois do convite.
A notícia do processo criou resistência no Planalto à indicação de Mangabeira, pois os fundos de pensões já haviam assumido o controle da BrT, em acordo com o Citibank. Lula queria que o filósofo desistisse de assumir o cargo por mover ação contra fundos que tinham dinheiro público.
"Trustee"
Mangabeira entrou com o processo, no Estado norte-americano de Massachusetts, contra a BrT, requerendo pagamento por serviços de curador ou "trustee" (espécie de procurador) referente ao período de 1º de abril de 2006 a 31 de março de 2007. Quando o grupo de Dantas controlava a BrT, até 2005, o ministro recebeu US$ 2 milhões pelo trabalho.
Em resposta ao processo judicial de Mangabeira, a BrT moveu uma ação contra ele por perdas e danos, sem reconhecer a suposta dívida pelos serviços de "trustee".
O caso da ação judicial voltou à tona no inquérito da Operação Satiagraha, cujo alvo central é Dantas. No inquérito, Mangabeira é citado como uma das pessoas "influentes nos entes federativos" que dão "apoio ostensivo" ao grupo de Dantas.
Durante a investigação, a PF interceptou e-mail entre advogados do Opportunity e da BrT. Neles, as duas empresas acertaram a retirada de processos judiciais entre elas conforme o acordo, de 25 de abril deste ano, para compra da BrT pela Oi.
"Por exigência dos advogados do Opportunity nos EUA, foi incluído na petição de dismissal [despedimento para um acordo judicial] o sr. Mangabeira Unger, que é co-réu. É o advogado dele que (o tal de David Brower citado abaixo) que está enrolando agora", diz e-mail de 8 de maio, enviado pela BrT ao Opportunity.
A BrT sugere que o acordo no processo seja feito só com o Opportunity, enquanto prosseguiria com a ação contra "Unger até ele parar de enrolar".
Conforme a BrT, uma semana depois do e-mail, o acordo foi fechado. Mangabeira desistiu da ação e, em troca, a BrT retirou o processo de perdas e danos contra ele.
Ainda segundo a BrT, se Mangabeira não desistisse da ação, isso não provocaria danos ao acordo para a compra da empresa pela Oi. Isso porque o acordo para retirada das ações era entre o Opportunity e BrT. Mangabeira foi incluído por intervenção do grupo de Dantas.
Acordo
À Folha, a BrT informou que houve uma tentativa de acordo com Mangabeira quando ele assumiu cargo no governo, mas "os advogados das partes não se entenderam".
Após anexar e-mail ao inquérito da Satiagraha, a PF faz o seguinte comentário sobre ele: na "mensagem buscam solucionar o acordo, entre as diversas partes, de desistir de ações judiciais, conforme acordo durante a compra de Brasil Telecom pela Telemar".
"Cabe lembrar", prossegue a PF, "que Mangabeira Unger que atualmente assumiu a Secretaria Especial de Ações de Longo Prazo [cargo extinto e transformado em Assuntos Estratégicos] possui forte vínculos profissionais com o grupo Opportunity, atuou como trustee nos EUA, defendendo os interesses do Opportunity".
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