Para a ANP, combustível é muito viscoso e pode danificar os motores; oleaginosa foi carro-chefe no programa do biodiesel
Mas Minas e Energia diz que processo de fabricação consegue trazer ao óleo de mamona a viscosidade exigida pela norma da ANP
Desde março não é mais tecnicamente possível produzir biodiesel usando apenas óleo de mamona. A oleaginosa, ex-vedete do programa, não reúne as condições técnicas definidas pela ANP (Agência Nacional do Petróleo) para composição do biocombustível.
Em 20 de março, o "Diário Oficial" da União publicou a resolução nº 7 da ANP. No documento, foram estabelecidos vários critérios físicos e químicos para o biodiesel. Pelos parâmetros, o biodiesel produzido apenas com mamona é muito viscoso e, por isso, não pode ser usado diretamente nos motores, pois poderia danificá-los.
A mamona sempre foi o carro-chefe do governo na propaganda do programa do biodiesel. Em vários discursos, o presidente Lula se referiu ao plantio da oleaginosa como uma alternativa para agricultores pobres do Nordeste. "É com a mesma motivação que estamos lançando o Programa do Biodiesel, que vai utilizar a mamona e a palma para produção de combustível, criando mais uma alternativa para pequenos agricultores do semi-árido nordestino", disse o presidente, em cerimônia realizada em Maceió (AL), em novembro de 2004.
Para a ANP, a mamona é a única oleaginosa que não se enquadra nos parâmetros técnicos do biocombustível. Com todas as demais -soja, pinhão manso, algodão etc.-, é possível produzir biodiesel sem precisar de mistura.
Com a edição da resolução da ANP, para usar óleo de mamona na produção do biodiesel, é preciso misturá-lo com o óleo de algum outro vegetal ou outro material gorduroso.
Os números oficiais de produção, contabilizados pela ANP, indicam que a mamona, que já tinha uma participação pequena, desapareceu da lista de insumos do biodiesel justamente em março.
Em fevereiro, a mamona ainda respondia por 0,17% da produção de biodiesel, contra 68,41% da soja. Em março, a mamona já tinha desaparecido do mapa de produção. O dado mais atual, de maio, indica que a soja ampliou sua participação para 77,35% entre os insumos usados para a produção de biodiesel. Os números confirmam que o programa é, na verdade, um filão a ser explorado pelos produtores de soja.
Concentração
De acordo com Arnoldo de Campos, coordenador do programa no Ministério do Desenvolvimento Agrário, a concentração nas matérias-primas para produção de biodiesel é uma preocupação do governo. "Há uma concentração de matérias-primas desde o início do programa. Isso não é bom. Está na ordem do dia diversificar."
O objetivo da diversificação é tornar o preço do biodiesel menos sensível à cotação internacional da soja, commodity de alta volatilidade. Em julho, o preço do diesel normal (que leva 3% de biodiesel) subiu 2,1% na bomba dos postos. Os distribuidores atribuíram a alta ao uso do biocombustível, que, por sua vez, aumentou por conta da alta do preço da soja.
Ainda segundo Campos, o fato de a mamona não estar sendo usada para a produção de biodiesel não é um problema para o produtor. "Existe a demanda da indústria química."
Ele explicou que, quando o governo vislumbrou na mamona uma fonte de matéria-prima para o biodiesel, o quilo da oleaginosa valia aproximadamente R$ 0,25. Na última safra, esse preço já estava variando entre R$ 1,00 e R$ 1,20.
Minas e Energia discorda
Ao contrário da ANP e do Ministério do Desenvolvimento Agrário, o Ministério de Minas e Energia informou, por meio de sua assessoria, que é possível produzir biodiesel usando 100% óleo de mamona.
Para o ministério, o nível de viscosidade exigido pela portaria da ANP é "mais difícil" de ser atingido com a mamona pura, mas "o processo industrial de fabricação de biodiesel consegue trazer ao óleo de mamona a viscosidade exigida pela resolução".
Folha
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