2.12.07

Mania de mudança


Editorial Folha

"PRIMEIRO o povo vai dizer se quer ou não a Constituinte. Se quiser, a Constituinte é que vai dizer o que ela vai votar." Com didatismo rudimentar, o deputado petista Mauricio Rands (PE) quis tranqüilizar o público sobre as intenções de seu partido, que agora defende uma assembléia exclusiva para modificar todo o sistema político-eleitoral a partir de um cheque em branco assinado pelos eleitores.
O PT encontrou um modo matreiro de manter viva a centelha do terceiro mandato para Luiz Inácio Lula da Silva. A tática é tão eficaz que permite aos dirigentes petistas negar, e com ênfase "indignada", que persigam o objetivo continuísta. Mas, "se o povo quiser" e a Constituinte decidir votar o assunto...
Por esse e outros experimentalismos de petistas e pelos temores exaltados da oposição, o assunto da extensão do mandato acabou entrando de soslaio na pauta das discussões políticas e assim permaneceu. O Datafolha resolveu quebrar esse diálogo cifrado e perguntar diretamente ao eleitor a sua opinião sobre o terceiro mandato. A resposta, eloqüente, deveria bastar para enterrar de vez o assunto.
De cada 100 eleitores, 65 se declaram contrários à segunda reeleição para o presidente Lula. Numa demonstração de maturidade, a grande maioria coloca em universos distintos de valor o desempenho do governo -o de Lula apresenta popularidade elevada- e a necessidade de preservar um pilar da democracia, que é a alternância no poder.
Contra o mudancismo casuísta que ainda ronda a política nacional, uma brisa no vendaval de manipulações constitucionais na América do Sul, a maioria dos brasileiros antepõe um saudável respeito às normas. Constituintes exclusivas, manobras plebiscitárias, extensão de mandatos, alteração de ciclos eleitorais, fim da reeleição. Há de tudo no mercado persa das "refundações" das regras do jogo propostas pelas mais diversas forças representadas no Congresso.
Poucos, no entanto, se dispõem a defender a permanência do "statu quo" na disputa pelo poder. Por paradoxal que possa parecer, essa agitação é um índice de adolescência democrática dos partidos brasileiros. O regime se fortalece e se enraíza na medida em que tais discussões fundamentalistas desaparecem da agenda das forças políticas majoritárias. Quando isso ocorre, o jogo ganha previsibilidade e o sistema se torna robusto o bastante para rechaçar aventuras populistas e autoritárias.
É hora de dar por encerrado o capítulo das grandes reformas que envolvem ciclos eleitorais. O apaziguamento dos partidos a esse respeito é passo crucial para que instituições mais específicas da política, como a fidelidade partidária e o sistema de voto, possam ser aperfeiçoadas.

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