19.12.07

CMPF, carnaval e fúria

Tu fingiste que me enganaste, /eu fingi que acreditei; /foste tu que me enganaste /ou fui eu que te enganei? Velha quadrinha mineira

Neste governo, tudo o que é rotina vira drama e todos os dramas se transformam em rotinas. Confunde-se ressentimento com governabilidade, rotina administrativa com autoritarismo, e retaliação com advertência. No caso do julgamento pela prorrogação ou extinção da CMPF, vimos, mais uma vez, a nudez carnavalesca da política nacional e, com ela, a atualização da velha quadrinha mineira que glorifica a insinceridade, o algumas coisas: a nossa trajetória, nossos interesses, projetos e coisas que tal. É fascinante, embora seja trágico, viver numa sociedade capaz de justificar tudo, menos a capacidade de honrar alguma coisa que vai além dos projetos imediatos dos seus membros.

Será que o ’poder’ justifica tudo? Seria ele apenas um mecanismo concentrador de tudo o que sociedade produz, a ponto de fazer com que o Estado englobe tudo, inclusive o sistema cultural e social que o sustenta? Ou seria o poder a capacidade de articular interesses partidários (que pertencem a classes sociais e categorias profissionais especificas) a valores e necessidades nacionais? Juntar país e interesse partidário, Estado e sociedade não seria a base do poder moderno, democrático e necessariamente pragmático que pensa nos impostos como um meio de melhorar a sociedade?

Nesse sentido, o que o debate sobre a CPMF colocou em cena foi a nossa incapacidade de pensar o bom uso dos recursos que, na forma de impostos, seguem sempre da sociedade para o Estado. Fica para mim evidente que, no Brasil, há o desígnio de que o imposto pertence ao governo, como se ele nada devesse à sociedade a qual ele é, afinal de contas, imposto! Ora, se a CMPF jamais foi aplicada com eficiência na saúde, então não há por que anunciar um desastre que jamais ocorreu porque o nosso sistema de saúde é, para desgraça e vergonha nossa, além de desastroso, vergonhoso. Mas há, sim, que tomar essa oportunidade para discutir de modo mais sincero e menos eleitoreiro nesta área, pensando mais nos doentes e menos nos cargos e no partidarismo. Pois, no fundo, resta a questão: para que, afinal, servem os impostos?

Roberto Damatta

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