PF quebra sigilo telefônico sem autorização da Justiça
Nextel dá à polícia números que podem identificar aparelhos usados por jornalistas
Pedido partiu de delegado que investiga se Protógenes vazou informações à Globo sobre Operação Satiagraha; Nextel nega irregularidades
Na investigação aberta para apurar o vazamento de informação da Satiagraha, a Polícia Federal conseguiu, sem autorização judicial, a quebra do sigilo telefônico de dezenas de aparelhos da Nextel utilizados na madrugada em que a operação foi deflagrada. O objetivo foi identificar os aparelhos usados por jornalistas da TV Globo.
Segundo a Folha apurou, a PF queria descobrir se o delegado Protógenes Queiroz, que comandou a Operação Satiagraha, ou algum dos seus subordinados avisou os repórteres sobre a operação.
Questionada ontem sobre o fato, a Nextel emitiu uma nota lacônica: "A Nextel informa que, neste e em outros casos, tem seguido estritamente as determinações judiciais a ela requeridas".
A assessoria da TV Globo informou que não "se manifesta em questões sub judice".
As informações da Nextel à PF com os números dos telefones foram anexadas ao inquérito e serviram de base para as ordens de busca e apreensão autorizadas pelo juiz federal Ali Mazloum, da 7ª Vara Criminal Federal, contra Protógenes -a PF vasculhou a casa do policial em Brasília, um quarto de hotel, em São Paulo, e o apartamento de um filho dele, no Rio.
Há no inquérito a relação de 10 a 12 aparelhos da Nextel, com os respectivos Cell ID -número de identificação e antenas, o que permite a localização física do usuário do aparelho. Constam ainda as horas em que as ligações foram feitas. Segundo a Folha apurou, a PF obteve também a lista de chamadas e ligações recebidas de cada aparelho, mas ainda não a anexou aos autos.
Não há a transcrição de conversas telefônicas.
Quando a Satiagraha foi deflagrada, na madrugada de 8 de julho, foram feitas buscas e apreensões contra 17 pessoas, entre elas o banqueiro Daniel Dantas, o investidor Naji Nahas e o ex-prefeito Celso Pitta.
O pedido
No início da investigação sobre o vazamento, o delegado Amaro Vieira Ferreira, da Delegacia de Polícia Fazendária em São Paulo, indicado para a função pela Corregedoria da PF, enviou ofício diretamente à Nextel pedindo a relação completa de "todos" os celulares e antenas usadas nas imediações da sede paulista da PF e em três locais alvos de buscas durante a deflagração da Satiagraha.
Nos quatro locais havia equipes de jornalistas da TV Globo antes mesmo da chegada da PF. Um dos endereços é a casa do ex-prefeito Celso Pitta. A prisão dele, ainda de pijamas, por volta das 6h, foi filmada por uma equipe da TV da Globo.
A Folha apurou que outras autoridades do caso foram consultadas pela PF sobre a quebra de sigilo telefônico dos jornalistas que estavam nos locais de busca, e se opuseram ao pedido, entendendo que tal iniciativa violaria o direito constitucional de sigilo da fonte.
Mesmo assim, a PF encaminhou o ofício à Nextel sem autorização da Justiça.
Num primeiro momento, a empresa de telefonia informou que não poderia repassar os dados sem a autorização judicial. Depois, a Nextel, em outro documento, informou que, "em face de esclarecimento verbal prestado por um agente federal", disponibilizaria as informações. Os dois ofícios da Nextel estão nos autos.
O procurador da República Roberto Dassié, que atua no caso, se manifestou contra a intenção da PF de quebrar o sigilo dos jornalistas para tentar descobrir quem os avisou da operação. A posição de Dassié consta dos autos. Para ele, se o investigado era Protógenes, apenas os celulares dele deveriam ter o sigilo quebrado.
Na manifestação, o procurador pede ainda à PF que esclareça expressamente o objetivo da medida e que junte aos autos todos os documentos do caso, sob pena de cometer o crime do artigo 305 do Código Penal (subtração de documento de que não pode dispor).
A PF enviou ofício ainda ao Detran (Departamento Estadual de Trânsito de São Paulo) e ao DSV (Departamento de Operação do Sistema Viário), da Prefeitura de São Paulo, para que informassem " todas" as multas aplicadas durante a madrugada do dia 8. O objetivo seria tentar rastrear o trajeto das equipes da Globo. Os pedidos estão nos autos, mas ainda não foram respondidos.
Polícia Federal
A assessoria de imprensa da PF de Brasília disse, sem se referir ao caso, que nenhum dado sigiloso é obtido de forma direta, sem a autorização da Justiça Federal. Às 17h20, a assessoria afirmou que o superintendente da PF de São Paulo, Leandro Coimbra, falaria sobre o episódio. Procurado, às 17h25, a assessoria da PF-SP disse que desconhecia a orientação da PF de Brasília e que o assessor de Coimbra não estava na sala.
Às 17h45, a reportagem ligou novamente e foi informada de que o superintendente já havia partido. O juiz Ali Mazloum não falou sobre o assunto.Folha
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