15.6.08

Projeto de Eliasch na Amazônia era conhecido do governo Lula

Sonia Racy

Altamente reservado, o sueco Johan Eliasch - um dos homens mais ricos da Inglaterra e da Suécia - dá a entender, por declarações monossilábicas, que seu projeto na Amazônia era conhecido do governo Lula. Portanto, a ação de órgãos do governo contra sua proposta seria algo política, coincidindo com o momento em que o Brasil anuncia desmatamento recorde. O empresário caiu na malha da Abin, ressuscitando antigo preconceito contra estrangeiros no País. O gancho foi uma declaração sua, durante reunião em uma seguradora, onde teria dito que a Amazônia poderia ser comprada por US$ 50 bilhões. “Não disse isso”, afirmou Eliasch, em conversa esta semana, em Paris, logo após a partida final do torneio de Roland Garros, do qual sua empresa, Head, é patrocinadora.

O tycoon sueco tem evitado dar declarações. Na condição de assessor “verde” do primeiro-ministro inglês Gordon Brown, prefere não dar continuidade a uma história que teve pouca repercussão na Europa e nos EUA, foco de seus principais negócios. No Brasil, seu principal interesse é outro: Ana Paula Junqueira, companheira dos últimos seis anos. “O Brasil é hoje minha segunda casa”, diz Eliasch, que, depois de muita insistência, acabou sendo convencido por Ana Paula a dar esta entrevista. Afinal, o celular da brasileira foi literalmente invadido por telefonemas do Brasil, em busca de informações.

Você está tentando comprar a Amazônia?

Definitivamente não. A Amazônia é do povo brasileiro.

É verdade que você disse que a Amazônia pode ser comprada por US$ 50 bilhões?

Não. O que eu disse é que a indústria de seguros seria incentivada financeiramente a preservar as florestas tropicais no Amazonas, lembrando o que aconteceu com o Katrina, que custou US$ 75 bilhões. Existe claramente uma correlação entre desflorestamento e desastres naturais.

Por que você comprou terras na Amazônia?

Eu amo o Brasil. É como uma segunda casa para mim. Minha relação vem também de meu casamento com Ana Paula, há 6 anos. Sou apaixonado pelo povo e pelo País. O processo de conservação da floresta amazônica me atrai e pensei que poderia fazer a diferença tentando protegê-la.

Você tem algum projeto sustentável para a Amazônia?

Sim. O que fazemos é dar para as comunidades locais 100% dos direitos sobre o que plantarem e colherem. Damos oportunidades para as pessoas na própria terra.

Vocês escolhem quem vai entrar na terra?

Todas as comunidades locais podem entrar. Elas protegem as florestas porque é a vida delas. Não querem que ninguém entre lá e corte as árvores.

Hoje, é permitido que se desmate até 20% da área, certo? E é isso que está desmatado hoje?

Não, mas isso já estava assim antes de eu chegar.

E a multa do Ibama, de R$ 381 milhões?

Foi aplicada muito antes da compra que fiz. Jamais derrubamos uma árvore. Ao contrário: plantamos algumas.

Desde que a terra é sua, você nunca derrubou árvores?

Não. Quando comprei as companhias elas desmatavam, mas assim que assumi, parei com a atividade.

Que companhias eram essas?

Eram empresas que pertenciam ao U.S. Fund Management Company. O que eles faziam era uma atividade de desenvolvimento sustentável. Não seguiam os 20% da lei brasileira, seguiam as linhas do Forest Steward Council, que aliás, é muito mais severo que as linhas brasileiras.

Então, essa terra já era estrangeira?

Sim. Desde 1999. Eu a comprei há três anos.

Por quanto?

Não posso dizer. É informação confidencial.

O que é o Cool Earth?

Eu e Frank Field (ex-ministro do governo de John Mayor) somos os co-fundadores do Cool Earth. Tudo começou com proposta feita ao Brasil, em 2006, cujos termos comunicamos tanto a Tony Blair como ao presidente Lula.

Recebeu resposta para a sua idéia?

Não.

Esse projeto tem alguma semelhança com as idéias da ex-ministra Marina Silva?

Sim. O conceito é bastante similar.

Como funciona esse projeto?

A proposta é criar um fundo internacional que possa garantir a proteção da floresta.

Qualquer floresta?

Não, florestas na Amazônia, Congo e Ásia.

Você já havia sofrido ataques em 2006 por causa das terras que comprou. Como resolveu isto?

Deixei claro para o Ministério das Relações Exteriores que qualquer sugestão de compra de florestas na Amazônia era considerada incorreta por nós.

O Itamaraty entrou em contato com vocês?

Sim, Frank Field e eu fomos contatados pelo embaixador José Bustani. E expusemos nossa posição. Explicamos a declaração sobra a Amazônia, que não foi feita. E que o Cool Earth não tinha nenhuma intenção de comprar mais terras e preservaria a floresta na sua totalidade.

O Bustani tinha conhecimento dos contatos de vocês com as autoridades brasileiras?

Surpreendentemente, não.

É correto que você se encontrou com o ministro Celso Amorim em Davos, em 2007, para falar sobre este assunto?

Sim, é correto.

Marina Silva acabou de sair do ministério e temos agora um novo ministro. O desmatamento é assunto central já que cresceu 774,48% , segundo o Inpe. Os ataques a você têm conotação política?

Adoraria pensar que não, mas considerando a conjuntura... As coisas estavam acontecendo na mesma semana. As ações do Ibama têm algumas (conotações políticas).

Você se arrepende? Não.

Por conta dessa pressão, pretende vender?

Não. Estou totalmente comprometido com o meu trabalho.

A maneira nada amigável com que tem sido tratado pode afastar outros investidores estrangeiros?

Espero que os investidores vejam isso como uma exceção. O povo brasileiro é amigável. Na verdade, o Brasil é um exemplo para o resto do mundo. É a única nação onde pessoas de diferentes etnias convivem em paz e não existem tensões raciais.

O fundo para a Amazônia, criado pelo ex-secretário Virgílio Vianna e o Bradesco, tem alguma ligação com o Cool Earth?

Não.

Mas vocês ajudaram?

Informalmente. Tive reuniões com o Virgílio, que pediu conselhos. E Matthew Owen, diretor do Cool Earth, participou de vários workshops organizados por ele.

Qual é o papel de Johan Eliasch? Foi você que fundou a Head Company?

Não, eu a comprei em 1995. Há 25 anos, eu compro empresas com problemas e faço reestruturações, a partir de Londres.

Sua família tem empresas de siderurgia?

Sim.

Você é sempre assim, monossilábico?

Sou sueco...

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