25.9.08

Plano de poder!!!

Deus tem um plano político para os fiéis da Igreja Universal do Reino de Deus (Iurd) e para os evangélicos que sejam seus aliados: governar o Brasil, segundo as palavras do bispo Edir Macedo, fundador e chefe da Igreja Universal, no livro “Plano de poder”, lançado a duas semanas das eleições.

A reportagem é de Tatiana Farah e publicada pelo jornal O Globo, 21-09-2008.

A partir de uma leitura política do Antigo Testamento, Macedo incita os evangélicos à mobilização partidária, seguindo o “projeto de nação” que Deus teria sonhado para os hebreus, que ele chama de cristãos. O livro tem co-autoria de Carlos Oliveira, diretor presidente do jornal “Hoje em Dia”, de Minas Gerais.

“Tudo é uma questão de engajamento, consenso e mobilização dos evangélicos. Nunca, em nenhum tempo da história do evangelho no Brasil, foi tão oportuno como agora chamá-los de forma incisiva a participar da política nacional”, escreve Macedo, estimando em 40 milhões a comunidade de evangélicos no país: “A potencialidade numérica dos evangélicos como eleitores pode decidir qualquer pleito eletivo, tanto no Legislativo, quanto no Executivo, em qualquer que seja o escalão, municipal, estadual ou federal”.
Sobrinho de Macedo, Marcelo Crivella disputa a prefeitura do Rio pelo PRB, partido ligado à Igreja Universal.

“Forte apelo emocional”

É para essa comunidade, que Macedo chama de cristãos com exclusividade (ele exclui os cristão católicos brasileiros), que Deus teria feito os planos de governo.

No texto — repleto de expressões de linguagem de marketing e administração —, Macedo lança as bases para uma militância evangélica político-partidária.

Diz que no Brasil a comunidade é como um “gigante adormecido”, que se mantém alheia ao processo eleitoral.

Para o cientista político Roberto Romano, Macedo envia uma mensagem aos fiéis para que deixem de lado o pudor de lidar com a política.

— Antes, os protestantes acentuavam a ruptura com o mundo. A política, a idéia de quanto mais abençoado o homem, mais rico ou poderoso ele era, era jogada para o católico ou para o judeu. Os evangélicos estão mudando essa idéia. Agora, Macedo diz: “Vocês já foram conquistados para Jesus, sabem como isso os consola. Mas para que o ‘plano de Deus’ se realize, temos de deixar de ter o pudor de mexer com a política”.

Apesar do texto frio, recheado de expressões filosóficas como “contrato social” e comparações com Thomas Hobbes e Maquiavel, Romano aponta a paixão na retórica.

— Há um forte apelo emocional escondido nessa carapaça de raciocínio do livro, dizendo que as armas maquiavélicas da política devem ser usadas santamente a serviço de Deus. A estrutura do pensamento é sempre esta, Deus propõe um contrato com o povo: “Se me reconhecerem, eu os cumularei de bênçãos”.
Assim, Deus é que tem de receber o poder de volta. O programa político de Edir Macedo está posto aí — diz Romano.

Professor de ética na Unicamp, Romano disse que foi bem escolhida por Macedo a época para lançar o livro, às vésperas da eleições. Afirmou não estranhar o avanço da Igreja Universal sobre a política.

— É próprio do Edir Macedo usar essa terminologia de administração e marketing; ele usa isso na igreja dele, assim como a teologia sincrética. Essa teologia da prosperidade. Não me surpreende que esteja transformando essa bem-sucedida empresa em partido, em base política.

O professor alerta que a liderança do bispo Macedo está longe de ser inconteste.

— Os evangélicos têm todo o direito de tentar chegar ao poder, mas Edir Macedo está querendo dar o salto maior que a perna. Mesmo igrejas pentecostais têm reservas em relação à Universal; nem estou falando do pastor Caio Fabio, cujas denúncias são uma bomba de explodir quartel. É improvável que a Iurd assuma um poder inconteste desses citados 40 milhões de evangélicos— avalia Romano.

Silvana Suaiden, professoratitular de Teologia da PUCCampinas, vê fundamentalismo por parte de Macedo.

— O bispo Macedo faz uma leitura fundamentalista da Bíblia. O que ele entende por povo cristão? Para ele, é, sobretudo, o povo da Iurd. Utilizar a Bíblia para amparar essa tese, principalmente nas eleições, quando existe esse projeto de sustentação da base de políticos evangélicos? É uma jogada.

A especialista explica:

— A Bíblia tem de ser lida no contexto em que foi escrita. Ler o Antigo Testamento e dizer que ali está escrito que Deus tem um plano para os cristãos, quando não há uma referência aos cristãos? Isso não tem sustentação teológica. Ele (Macedo) pode tentar explicar, mas isso não existe. Pode servir ao discurso do pastor-candidato, mas não se sustenta teologicamente.

“Projeto de nação” divino

Nesse ponto, do “projeto de nação” do povo de Deus — previsto supostamente no Antigo Testamento —, Macedo se antecipa às críticas, não teológicas, mas políticas. Aos que diriam que os escolhidos, então, seriam os hebreus e o Estado em questão já estaria pronto e seria o de Israel, o líder da Universal argumenta: “Israel representa uma célula de tudo o que está planejado para acontecer. A promessa de Deus feita ao patriarca Abraão denuncia sua intenção ao dizer que o colocaria por pai de numerosas nações”.

O jornal O Globo tentou entrevistar os autores do livro, por meio da assessoria de imprensa da editora Thomas Nelson Brasil, mas não houve resposta. Edir Macedo, segundo a assessoria, não daria entrevistas por estar fora do Brasil.

22.9.08

Equipe original da operação foi desmantelada

A equipe da Polícia Federal que fez o trabalho de inteligência na Operação Satiagraha foi desmantelada a partir do afastamento, em meados de julho passado, do delegado que comandava as investigações, Protógenes Queiroz.
Dois dos mais ativos investigadores da PF na Satiagraha logo abaixo do delegado, um escrivão e um agente de polícia, foram destacados para atuar na Operação Providência, desencadeada no último dia 11. Esses policiais -que poucos meses antes investigavam centenas de telefonemas e complexas operações financeiras envolvendo o banqueiro Daniel Dantas, o investidor Naji Nahas e executivos do grupo Opportunity- passaram a vigiar barracos em favelas da periferia de São Bernardo do Campo (SP), atrás de supostos "laranjas" utilizados em fraudes contra a Previdência Social.
Outro delegado que teve papel importante na Satiagraha, Victor Hugo Rodrigues Alves Ferreira, trabalha em Ribeirão Preto (SP), bem longe das descobertas que ajudou a promover em São Paulo. Com o conhecimento da Justiça Federal, Ferreira fingiu aceitar participar de um suborno de R$ 1 milhão que, segundo as investigações, foi comandado pelo executivo Humberto Braz, um dos principais auxiliares de Dantas. A ação, acompanhada pelo juiz Fausto De Sanctis, levou à apreensão de cerca de R$ 865 mil na casa do professor universitário Hugo Chicaroni. Os dois negam tentativa de suborno.
Protógenes segue afastado da segunda etapa da Operação Satiagraha e não tem sido procurado pela PF para falar sobre a primeira fase das investigações. O delegado cumpriu parte do curso de formação na Academia de Polícia em Brasília e agora faz a segunda etapa, que não requer a presença física do aluno. Protógenes, oficialmente lotado na Diretoria de Inteligência Policial, em Brasília, não tem mais uma sala, telefone fixo ou computador em algum prédio da PF. Há um mês, enquanto fazia o curso em Brasília, suas coisas foram embaladas e colocadas num armário. Ele foi avisado pelo telefone.
Folha

PF não consegue abrir arquivos de Dantas

Criptografado, conteúdo de computadores apreendidos no apartamento do banqueiro no Rio não é acessado pela perícia

Envolvidos na investigação estudam pedir ajuda para a empresa americana que criou o código de segurança para proteger os arquivos


Dois meses e meio depois, um dos principais materiais apreendidos pela Polícia Federal no dia em que a Operação Satiagraha foi deflagrada -cinco discos rígidos que estavam no apartamento do banqueiro Daniel Dantas, no Rio- permanece um enigma para os investigadores. Os HDs são protegidos por uma senha que a polícia não havia conseguido, até a última sexta-feira, desvendar.
Numa análise inicial, peritos da Polícia Federal disseram que precisariam de um ano para quebrar os códigos. Um dos peritos disse que nunca havia visto um sistema de proteção tão sofisticado no Brasil.
O delegado Protógenes Queiroz, que coordenou a Satiagraha, diz que os HDs "guardam segredos da República".
Na época da operação, a PF ventilou que 16 HDs haviam sido apreendidos numa "parede falsa" na casa de Dantas, um apartamento na avenida Vieira Souto, em Ipanema, na zona sul do Rio. Um investigador que participou do cumprimento da ordem judicial de busca e apreensão no apartamento confirmou que são cinco os HDs. São unidades externas de memória. Estavam dentro de um armário com porta de correr, num corredor que dá acesso ao quarto da mulher de Dantas. Estavam guardados numa sacola plástica.
Quando tentaram abrir os arquivos dos HDs, na superintendência da PF de São Paulo, os peritos descobriram que o acesso era criptografado. Isso significa que quem criou os arquivos inseridos nos HDs usou uma chave secreta para protegê-los. É como uma senha eletrônica. Sem ela, os arquivos, quando abertos, aparecem embaralhados e incompreensíveis na tela do computador.
O impasse levou os investigadores da PF a estudar uma alternativa jurídica para o rompimento do sigilo. Em conjunto com o juiz federal Fausto De Sanctis, informado há mais de um mês sobre os problemas nos HDs, os policiais discutem a possibilidade de obrigar, por ordem judicial, a empresa norte-americana que criou o software a fornecer as chaves eletrônicas que abrem os arquivos. É também aguardada a chegada de um grupo de peritos da PF de Brasília.
Não é a primeira vez que investigadores da Operação Satiagraha se vêem às voltas com dados criptografados do banco Opportunity, de Dantas. Em 28 de junho de 2006, os procuradores da República Rodrigo de Grandis e Ana Carolina Alves Araújo Roman informaram à 2ª Vara Federal de São Paulo que "muitos dos arquivos (mensagens de e-mail e anotações)" que integravam o disco rígido do banco estavam protegidos por senhas sigilosas, "o que torna impossível o seu acesso".

Origem
Dados do HD do banco, que fora apreendido em 2004 pela Operação Chacal, da PF, foram analisados e utilizados com ordem judicial na Satiagraha, que nasceu com o objetivo de averiguar a possível participação das empresas do grupo Opportunity no financiamento do mensalão. O HD foi copiado por ordem da Justiça Federal de São Paulo. O ato da cópia, feita por peritos da PF, foi acompanhado por representantes do Ministério Público Federal e um advogado do Opportunity.
Em 2004, os procuradores pediram à Justiça que oficiasse a IBM, detentora do software usado na criptografia, que apresentasse dois técnicos "habilitados a trabalhar com o programa Lotus Notes e com sistema de criptografia".
A Folha apurou que a PF, por meio de peritos do INC (Instituto Nacional de Criminalística) de Brasília, conseguiu depois quebrar esses códigos. O INC informou aos procuradores que tinha condições de romper o sigilo dos arquivos, que foram enviadas a Brasília. Foram desses discos que saíram o que a PF julga serem os principais indícios de que o Opportunity cometeu uma série de fraudes financeiras.
Os discos não foram os únicos aparelhos que Dantas protegia com códigos. Ele usava celulares criptografados, os quais o banqueiro chamava de "pretinhos". Quando precisava ter conversa reservada, ele pedia ao interlocutor para falar no "pretinho". Para gravar essas conversas, os investigadores tiveram de romper a codificação usada por executivos do Opportunity em seus celulares.
No depoimento de seis horas que prestou à CPI dos Grampos, em 13 de agosto, Dantas não foi questionado sobre o conteúdo dos HDs por nenhum parlamentar. Limitou-se a responder uma pergunta genérica do presidente da comissão, Marcelo Itagiba (PMDB-RJ), se tinha ou não uma "parede falsa" no seu apartamento. "Eu tenho um armário no meu apartamento, com portas de correr. São várias. Eu não tenho nenhuma parede falsa."
Folha

21.9.08

O ministro grampeado também foi vigiado

A desembargadora Suzana Camargo confirmou ter ouvido do juiz Fausto de Sanctis relatos sobre conversas reservadas e reuniões ocorridas dentro do gabinetedo presidente do STF, ministro Gilmar Mendes


Expedito Filho e Diego Escosteguy

Fotos Wilson Dias/ABR, Ricardo Moraes/Folha Imagem
MONITORAMENTO
Em depoimento à polícia, Suzana reproduziu comentários feitos pelo juiz De Sanctis (no alto, à dir.) baseados em "informes" que ele receberia sobre os passos do ministro (acima) em Brasília: "Cuidado! Seu gabinete pode estar sendo monitorado", avisou a desembargadora

"Cuidado, seu gabinete pode estar sendo monitorado", advertiu a desembargadora Suzana Camargo, vice-presidente do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, em São Paulo, em telefonema ao presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes, na tarde do dia 10 de julho deste ano. O presidente do Supremo concedera no dia anterior um habeas corpus libertando o banqueiro Daniel Dantas, preso na Operação Satiagraha. O ministro havia ligado para o TRF na tentativa de descobrir se procedia a informação de que o juiz Fausto de Sanctis, responsável pela primeira ordem de prisão do banqueiro, determinara que Dantas voltasse para o xadrez. Como a presidente do tribunal não estava, Mendes foi atendido pela desembargadora, que procurou o juiz para saber maiores detalhes do caso. A conversa entre os dois produziu a primeira grande evidência de que o presidente do STF era alvo de uma implacável perseguição. Num tom de advertência, Suzana Camargo, além de confirmar a existência do novo pedido de prisão, recomendou a Gilmar Mendes que adotasse um comportamento cauteloso, já que comentários feitos por ele dentro do gabinete e até detalhes de reuniões de assessores com advogados estavam chegando ao conhecimento do juiz De Sanctis por meio de "informes".

VEJA divulgou a advertência da desembargadora dias depois do episódio. Procurada à época, ela limitou-se a dizer que tudo não passava de um "mal-entendido". Há duas semanas, a desembargadora quebrou o silêncio que vinha mantendo sobre o caso e contou detalhes do episódio aos delegados da Polícia Federal que investigam os grampos ilegais promovidos pela Agência Brasileira de Inteligência contra o ministro Gilmar Mendes. Aos investigadores, Suzana Camargo confirmou que De Sanctis lhe disse que recebia informes do que se passava no gabinete do presidente do STF. Segundo ela, o juiz lhe disse que soube, por meio de informes, que Gilmar Mendes o chamara de "incompetente" numa conversa reservada com assessores, logo depois de revogar o primeiro pedido de prisão do banqueiro Daniel Dantas. A desembargadora afirmou que o juiz também descreveu um suposto jantar de assessores de Mendes com advogados de Daniel Dantas, em Brasília, e que havia "muita sujeira" nessas relações. Ou seja: se o relato da desembargadora foi fidedigno – e nada indica que não seja –, o juiz sabia que os passos do ministro e de seus assessores estavam sendo monitorados.

Fotos Sérgio Castro/AE, Sérgio Lima/Folha Imagem
BONS SERVIÇOS
O delegado Paulo Lacerda foi afastado da Abin após a revelação de que agentes do órgão grampearam o presidente do STF. O Ministério Público investiga o "sumiço" de escutas legais que comprometiam o ex-tesoureiro do PT, Delúbio Soares. Elas só apareceram depois que o MP intimou Lacerda a apresentar o material

O depoimento da desembargadora é essencial para as investigações, entre outros motivos, porque o episódio relatado por ela aconteceu antes que viessem a público provas de que o ministro estava de fato sendo espionado. Naquele instante não se sabia ainda que os telefones do presidente do STF estavam grampeados nem a dimensão da participação de agentes da Abin no caso. Horas após ser alertado sobre o provável monitoramento pela vice-presidente do TRF, porém, Gilmar Mendes mandou fazer uma varredura em seu gabinete. Foi quando os peritos do STF descobriram a presença de ondas eletromagnéticas invasoras na sala da assessoria do ministro – exatamente onde se deu a conversa em que ele classificou o despacho de De Sanctis como "incompetente", conversa que chegou ao conhecimento do juiz horas depois. Segundo os técnicos, o tipo de sinal encontrado na sala – de alerta máximo – só poderia ser emitido por aparelhos de escuta ambiental posicionados do lado de fora do Supremo. Tudo levava a crer que Gilmar Mendes era mantido sob vigilância.

A desembargadora foi aconselhada pelos delegados que investigam o caso a não comentar o teor de seu depoimento. "Não posso falar sobre isso. Está protegido por segredo de Justiça", disse ela. Os investigadores temem que o vazamento dos detalhes prejudique a produção de provas. Frise-se que, mesmo que tenha recebido os tais informes, De Sanctis poderia não ter conhecimento dos métodos empregados na elaboração deles – apesar de serem públicas e notórias as relações próximas entre o juiz e o delegado Protógenes Queiroz, o comandante da Operação Satiagraha. Nesse sentido, a própria desembargadora foi cuidadosa em seu depoimento. Em nenhum momento ela afirmou que De Sanctis mencionou o uso de meios ilegais de espionagem na produção dos tais informes, como escutas clandestinas em telefones ou no gabinete do ministro. O juiz, inclusive, já negou à CPI dos Grampos que tenha relatado o que declara a desembargadora. Ele também disse que não autorizou nenhum tipo de monitoramento do presidente do Supremo. "Sobre esse tema eu não vou falar", afirmou a VEJA. A um amigo, De Sanctis contou que tem uma testemunha para provar que a conversa com a desembargadora não passou por esse tipo de assunto.

Na semana passada, diante de uma aloprada busca para encontrar uma explicação qualquer que afastasse as suspeitas contra a Abin nas ações clandestinas de grampo e monitoramento de autoridades e jornalistas, os personagens envolvidos no enredo voltaram a falar sobre o assunto. Nada ainda foi esclarecido. Em entrevista, o presidente Lula chegou a elogiar o diretor afastado Paulo Lacerda – aquele que não sabia da ação de seus arapongas, depois sabia um pouco, depois não sabia dos detalhes, depois disse que eram uns poucos agentes, depois disse que eram 52... – e afirmou que o governo está de "braços abertos" para recebê-lo de volta. Lula sempre defende publicamente assessores suspeitos até que haja uma condenação definitiva. No caso de Lacerda, o governo também deve gratidão ao delegado pelos bons serviços prestados no período em que ele chefiou a Polícia Federal. Além de estrelar grandes operações, em 2004 o governo poderia ter sido tragado por um escândalo de resultados imprevisíveis. A investigação da chamada máfia dos vampiros, um grupo que tomou de assalto o cofre do Ministério da Saúde, fisgou o então tesoureiro do PT, Delúbio Soares, ainda um personagem das sombras, em traficâncias de alto calibre. O que fez a PF então? Sumiu com as gravações que envolviam o tesoureiro. O material só reapareceu depois que o Ministério Público descobriu a trama e emparedou Paulo Lacerda (veja documento abaixo). Àquela altura, em meados de 2005, Delúbio já estrelava o escândalo do mensalão. "Isso não é comum, é muito estranho e está sendo investigado", diz Gustavo Pessanha, procurador da República que integra o grupo de Controle Externo da Atividade Policial.

20.9.08

Grampo da PF sobre fraude em SC pega genro de Lula e deputado do PT

Marcelo Sato e Décio Lima não são alvos do inquérito, mas aparecem em diálogos com empresário sob suspeita

Marcelo Sato, genro do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, caiu no grampo da Influenza, investigação da Polícia Federal em Santa Catarina sobre suposto esquema de fraudes e lavagem de dinheiro no Porto de Itajaí.

Sato aparece em conversas telefônicas com o empresário Francisco Ramos, o Chico Ramos, sócio-controlador da Agrenco do Brasil S/A e principal alvo da operação.

Casado com Lurian Cordeiro Lula da Silva, filha do presidente, Sato não é investigado pela PF, mas as interceptações sugerem seu empenho em atender demandas de interesse do executivo junto a órgãos públicos federais.

Dia 18 dezembro de 2007, às 15h42, os dois se falaram e a PF gravou. Ramos liga para Sato e diz que "precisa de um favor". O empresário quer um atalho para colocar na pauta da Agência Nacional do Petróleo (ANP) seu projeto para uma fábrica de biodiesel.

Ramos explica que o processo "está na área jurídica" da agência e pede a Sato que faça um "pedido especial". O genro do presidente se prontifica: "Estou ligando agora."

A malha fina também pegou o deputado Délio Lima (PT-SC), ex-superintendente do Porto de Itajaí de janeiro de 2005 a março de 2006. Duas vezes prefeito de Blumenau, Lima é candidato novamente ao cargo.

A mulher de Décio, Ana Paula Lima, é deputada estadual, líder da bancada do PT na Assembléia. Sato trabalha no gabinete de Ana, em Florianópolis.

Dia 1º de abril, às 11h25, Ramos telefona para o parlamentar e diz que tem um "documento pendente na Receita": "Para a gente poder se qualificar e vender biodiesel no leilão", continua. Ele diz que "tá apavorado". Décio pede que lhe seja transmitido e-mail "para entender direitinho com quem tem que falar".

Chico Ramos teria bancado hospedagem em hotel para Sato e vôos fretados para o deputado, além da aquisição de notebooks.

O deputado, assim como Sato, não é alvo da Influenza. Ambos foram interceptados involuntariamente pela PF, que seguia os passos de Ramos escorada em ordem judicial.

O monitoramento incluiu e-mails, como um de 24 de outubro, do gabinete do deputado para Ramos. "Assunto: audiência ANP", anuncia o texto capturado pelos peritos no HD do computador do empresário.

Não há nos autos nada que incrimine Sato e Décio com a trama de operações cambiais ilegais, ocultação de bens, licitações fraudulentas, movimentações financeiras por laranjas e simulação de transações comerciais com emprego de papéis forjados. Mas a escuta federal mostra que eles fazem parte do círculo de amizades e influências do empresário que teria sido o mentor do esquema.

A Influenza foi desencadeada em 20 de junho - 250 policiais e 33 auditores fiscais cumpriram 54 mandados de busca em Santa Catarina e São Paulo. Foram capturados 24 suspeitos com quem o arrastão da PF apreendeu 31 veículos de luxo, 3 armas, R$ 255 mil , US$ 22 mil e 4 mil euros, além de 200 quilos de documentos.

DOADORA

O objetivo central da missão é a Agrenco, conglomerado especializado na exportação e comercialização de produtos agroindustriais.

A Agrenco é freqüente doadora de políticos. Nas duas últimas eleições, em 2004 e em 2006, injetou R$ 1,1 milhão no caixa de candidatos de partidos diversos.

Na campanha de Décio Lima por uma cadeira na Câmara, há dois anos, o grupo repassou R$ 179,9 mil, segundo consta da prestação de contas do petista ao Tribunal Superior Eleitoral - o montante total das receitas de Décio foi a R$ 452,9 mil.

O inquérito Influenza nasceu em Itajaí, onde os federais identificaram crime organizado e sonegação de tributos. Em agosto do ano passado, o juiz estadual Paulo Afonso Sandri autorizou os grampos, acatando pedido do delegado PF Roberto Mário da Cunha Carneiro.

Em novembro, a investigação apontou prática de lavagem de dinheiro e, por isso, foi deslocada para a Justiça Federal onde funciona vara exclusiva para combater esse tipo de delito. Na semana passada, a Justiça Federal esticou em mais 45 dias o prazo para conclusão do procedimento.
Estadão

19.9.08

Governo quer criminalizar mídia por publicar grampo

Projeto prevê punição a veículo ou repórter que divulgar escutas sob segredo de Justiça

Já enviada ao Congresso, proposta também pretende responsabilizar fontes de informação de jornalistas que vazarem interceptações


O governo federal encaminhou ontem ao Congresso um projeto de lei que prevê a possibilidade de punição criminal ao veículo de imprensa e ao jornalista que divulgar escutas telefônicas ilegais ou legais sob segredo de Justiça.
Pessoas que transmitirem dados à imprensa também poderão ser responsabilizadas -por exemplo, quem entregou ou fez chegar o grampo a um veículo de comunicação.
Após discussão com o presidente Lula e integrantes do governo, o ministro da Justiça, Tarso Genro, preparou o projeto deixando brecha para criminalizar a conduta da imprensa e de suas fontes de informação.
O projeto dá nova redação ao artigo 151 do Código Penal, que estipula pena de reclusão de dois a quatro anos e multa para quem "diretamente ou por meio de terceiros" realizar grampo "sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei".
No inciso 1 do parágrafo 1º, o projeto prevê a punição para quem "violar o sigilo ou o segredo de Justiça". Ou seja, se refere a grampo legal. No inciso 2, o projeto diz que receberá a pena quem usar qualquer tipo de grampo "para fins diversos dos previstos em lei".
Com essa redação, o juiz poderá condenar o veículo de imprensa, o jornalista e a fonte de informação caso entenda que a ação teve objetivo ilegal, como chantagem, calúnia, injúria e difamação. Elaborado após o episódio do grampo ilegal do presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), ministro Gilmar Mendes, o projeto foi feito a pedido de Lula.
Com redação propositadamente genérica, mas que explicita o uso "para fins diversos dos previstos em lei", uma pessoa que se sentir ofendida ou não gostar do conteúdo de determinado grampo que for divulgado poderá questionar na Justiça o interesse de quem publicou a informação e de quem passou a informação.
Reservadamente, um ministro admite que o projeto gerará polêmica. Mas nega que esteja em curso uma tentativa de cercear a liberdade de imprensa, uma garantia constitucional.
"A utilização criminosa [dos grampos] precisa ser punida. Mas isso não vale para o repórter que faz uma denúncia. A restrição da liberdade de informação não está em jogo. Ela é garantida pela Constituição", diz o secretário de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça, Pedro Abramovay.
O projeto enviado ao Congresso altera duas leis e um decreto para inscrever o grampo ilegal praticado no exercício da função no rol das transgressões passíveis de demissão. Inclui a interceptação de comunicação sem permissão da Justiça entre os crimes previstos no Código Penal. A pena de reclusão de dois a quatro anos de prisão pode ser ampliada em até 50% se o crime for praticado por um servidor público.
Passa a ser crime, ainda, "produzir, fabricar, comercializar, oferecer, emprestar, adquirir, possuis ou manter sob sua guarda, sem autorização legal, equipamentos destinados à interceptação telefônica". A tramitação do projeto no Congresso tem início a partir de hoje.
Folha

18.9.08

Jobim agora diz não saber se maleta da Abin faz grampo

O ministro da Defesa, Nelson Jobim, recuou ontem da acusação feita por ele há duas semanas de que a Abin (Agência Brasileira de Inteligência) comprou equipamentos capazes de fazer grampos sem depender de operadoras telefônicas. Em depoimento à CPI dos Grampos, Jobim disse só ter recebido informações de que os aparelhos tinham essa capacidade, mas que não tem certeza disso.
Em 1º de setembro, em reunião do conselho político do governo, Jobim afirmou na presença do presidente Lula e de seis ministros que a Abin comprara equipamentos com poder de fazer escutas por meio de comissão do Exército em Washington (EUA). A acusação foi decisiva para o afastamento do diretor da Abin, Paulo Lacerda.
Dois dias depois, após a agência ter contestado, Jobim confirmou a acusação em declaração pública: "Na relação dos aparelhos adquiridos pela Abin, há alguns que têm essa característica de interceptação telefônica", disse.
Ontem, baixou o tom: "Eu não tenho certeza sobre isso, porque isso dependia de uma investigação (...) Recebi notícias de que esses instrumentos viabilizariam escuta, não fiz nenhuma afirmação".
Jobim decepcionou a CPI ao entregar o documento que, segundo ele, foi apresentado a Lula, e que provaria a compra das chamadas maletas de grampo. São cinco folhas extraídas da internet com a descrição dos equipamentos no site do fabricante. Questionado se possui o registro oficial da compra, disse: "Não tenho. Posso providenciar, mas não tenho". Este era o documento aguardado pela comissão.
As suspeitas do ministro e da comissão recaem sobre o Stealth LPX Global Intelligence Surveillance System. A descrição do equipamento no prospecto da internet apresentado à CPI revela a capacidade de grampo, mas Jobim reconheceu que não tem certeza se foi este o modelo adquirido pela Abin: "Se esse que está com eles [Abin] pode ou não pode [grampear], eu não sei".
Oficialmente, a Abin nega ter equipamento que faça grampo. Em conversas reservadas, autoridades da agência dizem ter adquirido um modelo simples do Stealth, que só faz varreduras. Em tese, ele pode ser adaptado para interceptação.
Jobim afirmou que, na reunião de coordenação política, defendeu o afastamento do diretor da Abin, mas negou que tenha feito isso com base nas informações de compra de maletas. "A decisão [do afastamento de Lacerda] não se deu por força dessa informação, e sim da notícia de que a Abin tinha participado da interceptação [no telefone do presidente do STF, Gilmar Mendes]."
O ministro negou que o Exército tenha comprado para si próprio maletas de escuta.
Folha

Jobim defende mudança na lei para obrigar jornalistas a revelar fontes

Em depoimento à CPI do Grampo, o ministro da Defesa, Nelson Jobim, defendeu mudanças na legislação para punir pessoas responsáveis por vazar informações obtidas em escutas telefônicas, inclusive jornalistas. Jobim também sugeriu que a imprensa possa ser obrigada a revelar suas fontes em alguns casos.
— Os senhores terão que prestar atenção não só no interceptador ilícito, mas também no vazador de informações.
Se os senhores não fecharem as duas pontas, vai continuar a acontecer o que está acontecendo — disse Nelson Jobim.
“Já há casos em que o STF relativizou direitos? O ministro sugeriu aos integrantes da CPI que façam propostas para alterar a legislação sobre o tema: — Temos que discutir se o sigilo da fonte é ou não absoluto, ou se pode ser relativizado em casos constitucionais.
Já há alguns casos em que o Supremo Tribunal Federal relativizou os direitos constitucionais.
O ministro insinuou, em debate com parlamentares, que a categoria pode utilizar o preceito da liberdade de expressão para agir com irresponsabilidade e sugeriu que os deputados considerem se “a liberdade é a mesma coisa que a irresponsabilidade?.
Em outro momento, ao ser questionado sobre a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que limitou o acesso a dados sobre escutas legais registradas nas empresas de telefonia, Jobim lembrou que as CPIs são conhecidas fontes de vazamento de dados.
Segundo ele, isso ocorre devido à “relação perniciosa que se estabelece entre jornalistas, deputados, ministério público e polícia?.
O deputado Miro Teixeira (PDT-RJ) confrontou Jobim e lembrou o ministro dos prejuízos à democracia que resultariam do cerceamento da liberdade de imprensa. Ele citou o ex-presidente americano Thomas Jefferson, defensor da liberdade de imprensa como garantia de uma sociedade livre e segura. Depois pediu que o ministro Jobim se recordasse que só foi possível descobrir que o presidente do STF, Gilmar Mendes, teria sido grampeado por descoberta da imprensa.
ANJ: “Congresso não aceitará uma sugestão de retrocesso? Procurada ontem à noite, a ANJ afirmou que irá analisar as declarações do ministro antes de fazer qualquer manifestação.
Já o presidente da Fenaj, Sérgio Murillo de Andrade, considerou a fala de Jobim uma “infelicidade?.
— Foram declarações infelizes, um ministro deveria ter mais cuidado. Eu só fico tranqüilo porque acho que é só retórica e não vai ter conseqüência.
Não acredito que o Congresso possa acolher uma sugestão de retrocesso. Se há abuso na reprodução de escutas, é a própria imprensa que deve debater e resolver isso — disse Andrade.
O Globo

Tarso reclama de prisão de diretor da PF

Em reunião, ministro diz a procurador-geral da República, Antonio Fernando Souza, que pedido de afastamento foi exagero

Número dois da PF, Romero Menezes, foi preso suspeito de favorecer um irmão no Amapá; ele nega privilégios e afirma que é perseguido


A prisão do número dois da Polícia Federal, delegado Romero Menezes, anteontem, provocou um desgaste na relação da corporação com o Ministério Público Federal. Anteontem à noite, o ministro Tarso Genro (Justiça), a quem a PF está subordinada, reclamou diretamente com o procurador-geral da República, Antonio Fernando Souza.
Menezes foi preso a pedido do Ministério Público Federal do Amapá, suspeito de ter agido em benefício de um irmão e de ter vazado informações privilegiadas da Operação Toque de Midas, que investiga supostas irregularidades em licitações que teriam sido cometidas pelo grupo EBX, de Eike Batista.
Na avaliação de Tarso e da cúpula da PF, o Ministério Público extrapolou ao pedir a prisão de Menezes, afastado da função de diretor-executivo da corporação após o episódio.
Tarso levou sua reclamação a Antonio Fernando num jantar na casa do advogado-geral da União, José Antonio Dias Toffoli, anteontem à noite, dia da prisão de Menezes. "A determinação [da prisão] era desnecessária, porque não era pelo perigo que ele eventualmente representava, mas por poder interferir", disse Tarso.
Apesar de o pedido ter sido aceito pela Justiça Federal do Amapá, Menezes não chegou efetivamente a ser preso. Ele recebeu, pela manhã, voz de prisão do diretor-geral da PF, Luiz Fernando Corrêa, mas no final da noite de terça obteve um habeas corpus do Tribunal Regional Federal da 1ª Região suspendendo a prisão.
Ao longo do dia, prestou depoimento à Corregedoria Geral da PF e, depois, aguardou no próprio edifício-sede da corporação o alvará de soltura.
"A operação do Ministério Público foi altamente respeitável. Nós consideramos esse controle externo [do Ministério Público sobre a PF] uma necessidade. Mas não tinha nenhum fundamento, nenhuma necessidade o pedido de prisão do doutor Romero", disse o ministro da Justiça.
Segundo ele, Antonio Fernando reagiu com naturalidade a seus comentários e ficou de analisar o caso.
Apesar da indignação causada pela prisão de Menezes, o ministro avaliou que o episódio é benéfico para a imagem da PF. "Se houve contaminação [se ficar provada a culpa de Menezes], a Polícia Federal demonstrou que não vacila em tomar providências contra o número quatro, o número três, o número dois, o número um ou o número zero, que sou eu."
Folha

17.9.08

Petralhas comendo petralha

Vamos guardar, caso seja deletado

Luiz Nassif Online

Lula, Satiagraha e a Real Politik


Atenção, um novo capítulo se abre para o caso Satiagraha.

O governo Lula acertou um acordo com a Editora Abril – e, por extensão, com Daniel Dantas – para anular a Operação Satiagraha. O acordo foi montado da seguinte maneira:

1. É impossível interferir nos trabalhos em andamento do Ministério Público Federal e do juiz De Sanctis. A ofensiva de Gilmar Mendes foi um tiro no pé.

2. A estratégia acertada consistirá em tentar anular o inquérito de Protógenes, no âmbito da Polícia Federal. A versão preparada é que o inquérito continha irregularidades que precisariam ser sanadas. E a Polícia Federal colocou seus homens de ouro para “salvar” o inquérito. O trabalho dos “homens de ouro, na verdade, será o de garantir a anulação do inquérito.

3. Ao mesmo tempo, o governo aproveitará o factóide dos 52 funcionários da ABIN que participaram da operação - uma ação de colaboração já prevista pelo Sistema Brasileiro de Inteligência - para consumar a degola de Paulo Lacerda. A matéria do Estadão de domingo, o da "demissão em off" estava correta. Sabe-se, internamente no governo, que a operação foi normal. Assim como se tem plena convicção de que o tal “grampo” entre Gilmar Mendes e Demóstenes Torres foi uma armação. Mas Lula se curvou à real politik.

4. De sua parte, jornais e jornalistas mais envolvidos com o jogo estão reforçando essa versão do “inquérito ilegal” e do messianismo do delegado Protógenes. A armação, agora, terá o reforço da concordância tácita do Palácio.

5. O pacto foi referendado pela Ministra-Chefe da Casa Civil Dilma Rousseff. O Ministro Tarso Genro foi o que se mostrou mais constrangido com a operação, mas acabou se curvando à força dos fatos. Com essa operação, Lula e Dilma passam a ser aceitos no grande salão nobre, pavimentando a candidatura da Ministra para as próximas eleições.

6. O seu principal adversário, José Serra, já é outro aliado que entrou à reboque da Editora Abril. Está pagando um preço caro, com a descaracterização do seu discurso político.

7. A bola, agora, está com o Ministério Público e o Juiz De Sanctis, que terão que trabalhar com essa nova peça do jogo: a intenção de se anular o inquérito.

Não sei por que, mas o evento da Abril me lembrou aquela cena épica de Francis Ford Copolla, o fecho do filme. Enquanto todos estão na grande ópera, os inimigos são fuzilados na calada da noite.

Na grande festa foram selados os destinos do delegado Protógenes e Paulo Lacerda, dois funcionários públicos cumpridores da lei. Anotem os nomes deles e os repassem para seus filhos e netos: foram dois brasileiros dignos, sacrificados por um jogo sujo.

É o fim da grande batalha pela instituição da legalidade no país? Longe disso. É apenas um novo capítulo. Tanto assim, que integrantes próximos ao jogo estão completamente incomodados, assim como vários colegas jornalistas, que entenderam que esse jogo de cena foi longe demais e está comprometendo a imagem da categoria como um todo.

Com tanta testemunha, tanto conflito de consciência, julgam ser possível varrer o elefante para debaixo do tapete? É muita falta de fé no estágio atual de desenvolvimento do país.

De uma fonte palaciana

De uma conversa ocorrida há pouco (13:35):

Do ponto de vista dos fatos, esse acordo não existe, Muito menos com a Veja. O presidente sequer se dispõe a dar entrevistas à Veja. No momento, admito que todo mundo possa ter dúvidas, inclusive internamente. Mas ao final do inquérito se mostrará se houve ou não houve acordo. E garanto que não houve. O tempo mostrará que, obedecendo às regras do Estado de Direito, se produzirá um inquérito consistente, porque virou uma questão de honra para a Polícia Federal. O governo não tem interesse em encobrir nada. Só quer que se aplique a lei. E, para isso, o inquérito tem que ser conduzido tecnicamente. Admito que há dúvidas que só podem ser desfeitas com fatos. E o fato será o final do inquérito. Não haverá como convencer ninguém antes disso".

A parcialidade da Unasul

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva deveria ter seguido seu instinto político. Quando soube da convocação, pela presidente do Chile, Michelle Bachelet, da reunião da União das Nações Sul-Americanas (Unasul) para examinar a crise boliviana, seu primeiro impulso foi recusar o convite e mandar um representante em seu lugar. Ele não via sentido numa reunião de chefes de Estado, uma vez que o grupo não poderia tomar decisões que só cabem ao presidente Evo Morales. Isso, aliás, havia ficado claro quando o presidente boliviano recusou a mediação do Grupo de Amigos da Bolívia (Brasil, Argentina e Colômbia) oferecida dias antes pelo próprio Lula - enquanto procura negociar com seus opositores. De certo, o presidente brasileiro também receava que o encontro de presidentes fosse usado como palco para mais uma das agressivas demonstrações de radicalismo do caudilho Hugo Chávez, que já havia ameaçado intervir militarmente na Bolívia se a crise interna pusesse em risco o governo de seu discípulo bolivariano, Evo Morales.

Mas Lula deixou-se convencer, finalmente, de que a reunião da Unasul não apenas não configuraria uma intromissão nos assuntos internos da Bolívia, como sua realização interessava a Morales. Também teria pesado na sua decisão de ir a Santiago o fato de ser aquela a primeira reunião do novo organismo regional criado para substituir a OEA - ou seja, para evitar qualquer ingerência política dos Estados Unidos nos assuntos sul-americanos.

Os debates entre os presidentes e o texto do comunicado final da Unasul mostram que o presidente Lula teria saído no lucro não indo a Santiago. Para começar, Michelle Bachelet, presidente de turno da organização, teve grande trabalho para evitar que referências grosseiras aos Estados Unidos - acusados de fomentarem uma guerra civil na Bolívia - constassem do documento final, como exigiam Hugo Chávez, Evo Morales e Rafael Correa. Mesmo assim, o texto aprovado por unanimidade é um primor de parcialidade, não por dar respaldo a um presidente eleito, mas por considerá-lo, contra todas as evidências, como o paladino da "institucionalidade democrática", do "Estado de Direito" e da "ordem jurídica vigente".

Não há quem não saiba que o caos político e social se instalou na Bolívia porque Evo Morales violentou todos os princípios da democracia na sua tentativa de implantar no país um extravagante regime socialista, baseado no autoritarismo do confuso bolivarianismo de Chávez e temperado com um modelo de organização social pré-colombiano.

Antes que a situação chegasse ao ponto atual, o homem que a Unasul considera o guardião das liberdades democráticas fechou o Congresso, praticamente dissolveu a Corte Suprema e fraudou escandalosamente o processo de elaboração da Constituição que quer impor ao país. Foi contra tudo isso que se insurgiram cinco dos nove Departamentos da Bolívia. Seus governadores também deixaram a lei de lado e seria risível, não fosse trágico, falar na "ordem legal vigente" na Bolívia.

É também estranho que a Unasul exija respeito à integridade territorial da Bolívia. Há pelo menos dois anos, desde que os ânimos começaram a se acirrar, os governadores de oposição e as organizações cívicas que os apóiam não se cansam de afirmar que seu objetivo é evitar a imposição do socialismo e da ordem social pré-colombiana - que deixa em posição de submissão quem não é índio - e consagrar a autonomia dos Departamentos - e não a deposição de Evo Morales e, muito menos, a secessão do país. Se, nesse período, existiu alguma ameaça à integridade da Bolívia, ela partiu do caudilho Hugo Chávez, que mais de uma vez se disse disposto a intervir militarmente no país.

Do espetáculo encenado em Santiago teria restado de útil a decisão de organizar uma comissão para acompanhar os trabalhos de uma mesa de diálogo entre o governo e a oposição bolivianos. Mas os presidentes reunidos fizeram um "apelo ao diálogo" quando, havia já 48 horas, se reuniam no Palácio Quemado, em La Paz, o vice-presidente Álvaro Garcia Linera e o governador de Tarija, Mario Cossio, para acertar as bases das negociações entre o governo e os governadores da "meia-lua". É desse diálogo que pode surgir a tão desejada "harmonização" entre a Constituição de Morales e as reivindicações políticas dos governadores - única forma pacífica de solucionar a crise boliviana.
Editorial Estadão

16.9.08

Universidade omite 'raça branca' em inscrição

Dirigente de federal baiana afirma que só foram incluídas etnias que podem ser beneficiadas por sistema de cotas

BRASÍLIA e SALVADOR. A ficha de inscrição para o próximo vestibular da Universidade Federal da Bahia (UFBA) pede aos candidatos que indiquem a sua etnia e oferece uma série de opções para os estudantes, mas não cita a raça branca. Quem se considera branco, portanto, deve marcar a categoria "outras". As demais opções listadas no formulário são: "preto", "pardo", "índio descendente", "aldeado" (no caso de índios que vivem em aldeias) e "quilombolas".

O pró-reitor de Ensino de Graduação da UFBA, Maerbal Marinho, disse que a omissão da raça branca tem caráter meramente operacional. Isso porque, segundo ele, a ficha lista apenas as etnias beneficiadas pelo sistema de cotas da universidade, que reserva 45% das vagas para estudantes de escolas públicas, com subcotas para os autodeclarados negros e índios.

Militante negro se diz surpreso com medida

Diferentemente de outras instituições de ensino, argumentou Maerbal, os candidatos no vestibular concorrem pelo sistema de cotas automaticamente. Para isso, basta que assinalem uma das cinco opções beneficiadas pela reserva de vagas na inscrição via internet.

- As etnias que constam no formulário correspondem às que concorrem a uma das vagas no sistema de cotas. É assim desde 2005.

A falta de uma opção específica para candidatos brancos surpreendeu frei David Santos, fundador da Educafro, rede de cursos pré-vestibulares para negros e pobres.

- O ideal é que o sistema de informática da universidade colocasse todas as opções. Se não colocou, eu gostaria de ouvir o reitor da universidade. Isso merece um debate - afirmou frei David, ressalvando que desconhece detalhes do sistema de inscrição no vestibular da universidade baiana.

Para ele, no entanto, a omissão serve para que os candidatos brancos sintam na pele a exclusão a que pretos e pardos são submetidos no país:

- Inconsciente ou conscientemente, a universidade está levando quem é euro-descendente a fazer a experiência de não se ver refletido, a exemplo do que sofre e sofreu a comunidade indígena e negra em vários setores da sociedade brasileira.

O pró-reitor, no entanto, rejeita qualquer interpretação de racismo às avessas. Ele destacou que os candidatos devem preencher um questionário socioeconômico que registra outras opções étnicas, incluindo a branca.

- Só está destacado quem tem direito às cotas. Se eu botar brancos, alguém pode dizer que é asiático e reclamar, assim como um índio americano e por aí vai. Onde a gente acabaria essa lista? - afirmou Maerbal.

UFBA reserva 45% de vagas para alunos de rede pública

A UFBA reserva 45% de suas vagas no vestibular para egressos da rede pública, sendo que 2% vão para descendentes de índios e os demais 43% seguem a seguinte lógica: 80% dessas vagas são preenchidas por autodeclarados pretos e pardos e os demais 20% para outras etnias.

A vestibulanda Laine Lima dos Santos, de 22 anos, que assinalou a opção "parda" na ficha eletrônica, disse que a omissão pode fomentar um preconceito ao contrário:

- Acho errado que não tenha a opção branca no formulário, porque existem pessoas que têm pais europeus, são brancas e não podem explicitar sua etnia. Acho importante a valorização do afro-descendente, mas isso não pode gerar preconceito às avessas.
O Globo

Com Agência A Tarde

Protógenes teve outros auxiliares externos

As investigações de supostos abusos cometidos pelo delegado Protógenes Queiroz na condução da Operação Satiagraha têm três novos nomes de colaboradores recrutados por ele fora da Polícia Federal. Eles são suspeitos de terem manipulado ilegalmente dados sigilosos usados na apuração contra o banqueiro Daniel Dantas.
A lista inclui um servidor da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) identificado apenas como Luiz, responsável na Satiagraha pela transcrição de e-mails grampeados. A Folha apurou que trata-se de Luiz Eduardo Melo, fiscal tributário da Secretaria de Fazenda do Distrito Federal, cedido sem ônus à Abin. Melo foi incorporado à equipe de Protógenes em fevereiro de 2008, período em que o delegado afirma ter parado de receber recursos da cúpula da PF para tocar a Satiagraha. Melo não foi localizado.
Além dele, a Aeronáutica anunciou ontem que abriu sindicância para apurar a informação de que o major Paulo Ribeiro Branco Junior e o sargento Idalberto Matias de Araújo, ambos da ativa, atuaram na Satiagraha. Mas há ainda outro militar da FAB, este reformado, suspeito de colaborar ilegalmente com Protógenes.
Identificado apenas como Rodopiano, ele exerceu diversas funções: de consulta a cadastros de pessoas física e jurídica até a análise de informações cercadas de sigilo, como o disco rígido do banco Opportunity. Também passaram pelas mãos de Rodopiano documentos obtidos nos EUA sobre investigações feitas pela empresa Kroll, contratada pela Brasil Telecom, que já foi controlada por Daniel Dantas.
Rodopiano também monitorava jatinhos particulares de investigados. Segundo fontes da investigação, ele foi apresentado a Protógenes pelo major Branco e pelo sargento Araújo. Trabalhou dois meses e recebeu R$ 1.400 por mês, bancados com recursos do suprimento de fundos da operação.
Araújo também repassava informações privilegiadas sobre o paradeiro dos aviões de Dantas ao delegado. Protógenes diz que eles trabalharam legalmente na operação.
Outra pessoa estranha aos quadros da PF, identificada como Juarez, é investigada. Segundo fontes da PF, ele fazia serviços em São Paulo, como o monitoramento de suspeitos.
O Ministério da Defesa divulgou nota para dizer que Aeronáutica, Marinha e Exército "não deram qualquer contribuição" à Satiagraha. Sobre a participação de um major e um sargento da ativa, a nota diz que a FAB "não reconhece participação institucional de militares da FAB na operação" e esclarece que, "se ocorreu, foi de maneira informal e irregular".
Folha

15.9.08

Acredite: a "Tropa de Elite" do PCC vai sair da cadeia

O sistema penal brasileiro, por suas ineficiências, está inventando o crime perfeito – aquele que, se imaginava, existia só na ficção. Eis os fatos: ao meio-dia do 1o de junho de 2004, 12 homens armados de fuzis, submetralhadoras, pistolas e granadas preparavam a invasão da Penitenciária 2 de Franco da Rocha, município da região metropolitana de São Paulo. Eles pertenciam à “tropa de elite? do Primeiro Comando da Capital (PCC), a facção criminosa que domina os presídios paulistas e aterrorizou São Paulo dois anos atrás.

O objetivo da invasão era resgatar um comparsa e soltar todos os 1.279 detentos. A polícia descobriu o plano, invadiu o esconderijo, envolveu-se num tiroteio com os bandidos, matou um deles e prendeu dez. Agora, apesar de terem sido presos em flagrante e de não haver dúvidas sobre seu caráter perigoso, os dez integrantes da “tropa de elite do PCC? vão ganhar a liberdade e voltar às ruas, porque o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu conceder habeas corpus aos acusados.

Por todos os aspectos, a decisão parece absurda. Mas, juridicamente, ela é inquestionável, segundo atestaram advogados criminalistas, promotores e juristas. Os dez réus passaram quatro anos na cadeia, mas não foram levados a julgamento, porque a instrução do processo, que deveria durar 81 dias, não foi concluída. “O STF só cumpriu a lei. É contra a lei manter alguém tanto tempo preso sem um julgamento?, diz o ex-juiz Luiz Flávio Gomes, professor de Direito Penal.

Na sentença em que concedeu o habeas corpus, o ministro Carlos Ayres Britto, do STF, mostrou a gravidade das acusações e indícios que pesam sobre os réus. Mas argumentou que as falhas do Estado tornaram inevitável a decisão de beneficiá-los com o habeas corpus. Segundo Britto, o julgamento não foi concluído porque audiências foram canceladas ou adiadas em razão da falta de escolta policial para garantir segurança ao transporte dos réus do presídio para o fórum. Uma das audiências da instrução chegou a ser suspensa quando os presos estavam no fórum, por causa de uma denúncia de um plano para resgatá-los. “Isso mostra uma ineficiência insuportável do Estado na contenção da criminalidade?, diz a antropóloga Alba Zaluar, coordenadora do Núcleo de Pesquisas em Violências da Universidade Estadual do Rio de Janeiro.

O caso da “tropa de elite? do PCC é apenas o paroxismo de uma situação comum no sistema penal brasileiro, diz o criminalista Antônio Cláudio Mariz de Oliveira, ex-secretário da Justiça e da Segurança Pública de São Paulo. “Tem muita gente presa há tempos sem ser julgada. Processos ficam emperrados porque não é possível fazer audiência por falta de escolta.? Apesar de contar com cerca de 2 mil homens para fazer a escolta de presos, a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo sofre com o excesso de demanda e o custo dessas operações – muitas altamente arriscadas por causa da periculosidade dos presos. Só neste ano, segundo dados da Secretaria, foram feitos 53.658 escoltas e 215 mil transportes de presos. De acordo com um levantamento feito pelo deputado federal Otávio Leite (PSDB-RJ), só São Paulo gasta R$ 700 milhões por ano com escoltas de presos solicitadas pelo Judiciário. Isso equivale a todo o gasto do governo federal em 2007 com a distribuição de coquetéis anti-aids no Brasil inteiro.

Há uma solução tecnicamente avançada e barata, que não exige a escolta de presos por vias públicas, com a mobilização de centenas de homens: o interrogatório por videoconferência. “Transportar presos perigosos é um risco e não faz sentido botar um exército na rua para realizar uma audiência?, diz Gomes. Países como Estados Unidos e Itália adotam a videoconferência. Em Portugal, ela consta do código de processo penal. Em São Paulo, desde 2005 são feitos interrogatórios por videoconferência.

No ano de 2007, segundo a Secretaria de Administração Penitenciária, foram feitas 1.472 audiências em que presos foram interrogados dessa forma no Estado. Mas a prática não foi regulamentada por lei. Há três projetos em tramitação no Senado, com propostas de regulamentação da videoconferência. Mas não há previsão de quando serão votados. Enquanto isso não ocorre, o interrogatório a distância é contestado por advogados. Eles argumentam, com base numa convenção internacional de direitos humanos, firmada pelos países das Américas em 1969, que os presos têm direito a ser conduzidos à presença de um juiz. O STF só vai se manifestar sobre a legalidade da videoconferência quando julgar um pedido de habeas corpus movido pela Defensoria Pública do Estado de São Paulo em nome de um homem, preso em flagrante, acusado de tentar roubar um celular, em 2005 – e interrogado por videoconferência.

O caso da “tropa de elite? do PCC revela ainda a inércia do poder público, que age burocraticamente e não encontra solução para os problemas do sistema penal brasileiro, que se arrastam há anos e só se tornam mais graves. Segundo o Departamento Penitenciário Nacional (Depen) do Ministério da Justiça, há 133 mil pessoas nas prisões brasileiras, ou 30% da população carcerária, em situação similar à dos integrantes da “tropa de elite? do PCC – em regime de prisão preventiva.

O presidente do STF, Gilmar Mendes, afirmou que o número de presos provisórios aumentou 88%, entre 2003 e 2007. Isso mostra que também aumentou o tempo para a coleta de provas nos processos. Apesar desse quadro, que exige medidas urgentes, o país ainda debate, 12 anos depois da primeira experiência de videoconferência, se ela é legal ou não. “Todos os Poderes estão acomodados e têm sua parcela de culpa?, diz Gomes. “O Legislativo não aprova a videoconferência. O Executivo não providencia a escolta. E o Judiciário não toma providências para obrigar a apresentação dos réus.? É uma situação exasperadora.
Época

11.9.08

Morales expulsa embaixador americano

Presidente boliviano acusa diplomata de conspirar com oposição; Washington rechaça denúncia e vê "grande erro" de La Paz

Governo afirma que não reagirá com violência a golpistas; "a oposição quer um morto e não vai ter", diz ministro da Presidência


O presidente boliviano, Evo Morales, declarou ontem o embaixador americano Philip Goldberg "persona non grata", o que o obriga a deixar o país.
Morales acusou o diplomata de conspirar com opositores contra a unidade nacional, que estaria ameaçada pelo que o porta-voz presidencial Iván Canelas chamou "tentativa [da oposição] de desencadear uma espécie de guerra civil".
No discurso pronunciado no Palácio do Governo, Morales mandou que o chanceler David Choquehuanca cumpra os marcos legais e diplomáticos para que "aquele que conspira contra a democracia e busca a divisão da Bolívia" volte "imediatamente" aos Estados Unidos. Citando o trabalho de Goldberg para o Departamento de Estado americano na Bósnia e em Kosovo, qualificou-o como "especialista em promover conflitos separatistas".
O chefe da diplomacia americana para a América Latina, Thomas Shannon, rechaçou as acusações de Morales e afirmou que a expulsão é "um grande erro". Goldberg "é um diplomata com comportamento impecável", disse Shannon.
O governo boliviano relacionou ontem a viagem aos Estados Unidos do empresário Branko Marinkovic -líder do poderoso Comitê Cívico do departamento de Santa Cruz, que reúne a elite regional- ao levante de opositores na região, a mais rica da Bolívia. La Paz acusa Marinkovic de ter fomentado a violência anteontem, quando voltou ao país.

"Golpe civil"
"O fascismo deu início a um golpe de Estado contra a unidade do país e a democracia", afirmou o ministro do Governo, Alfredo Rada. Segundo o ministro, a ofensiva da oposição será enfrentada "junto ao povo", com todos os instrumentos legais ao seu alcance. "Os fascistas não passarão." "Certamente eles estão esperando que respondamos com armas. Não vamos abrir fogo, não usaremos armas de fogo sob nenhuma circunstância.
Não vamos pôr em risco a vida dos cidadãos", afirmou o ministro da Presidência, Juan Ramón Quintana. "O que a oposição quer é um morto e isso eles não vão ter."
O ministro da Defesa, Walker San Miguel, elogiou ontem o "trabalho patriótico" das Forças Armadas e da Polícia Nacional -que, nas palavras reproduzidas pela agência estatal de notícias da Bolívia, "enfrentaram os vândalos com tolerância e sem disparar nenhuma bala".
O governo afirma que não reagirá com violência nem decretará estado de sítio. Especialistas citam o despreparo dos militares bolivianos como uma das razões para a relutância em conter, pela força, os motins.
"O governo sabe que nem a Polícia Nacional nem as Forças Armadas estão preparadas para situações como essa, de motim.
Há essa consciência, e isso só mostra a debilidade do Estado boliviano", afirma Roberto Laserna, economista e estudioso dos conflitos na Bolívia, lembrando o episódio de 2003, quando mais de 70 morreram na chamada "guerra do gás".
Ele não crê em golpe nem em enfrentamento com forças de segurança regulares. O risco, diz, é que ocorram conflitos entre grupos civis dos dois lados. Para Manuel Mercado, do Observatório de Politicas Publicas -ligado à Presidência-, "há um nervosismo grande na polícia e nas Forças Armadas, há muita pressão por uma ação mais dura do governo, de setores das Forças e dos movimentos sociais". A decisão de não declarar estado de emergência é "muito dinâmica", diz o especialista. "Tudo esta sendo reavaliado o tempo todo."

"Terrorrismo de Estado"
O governador de Santa Cruz, Rubén Costas, ex-líder "cívico" do departamento e principal opositor de Morales, culpou o presidente pela "batalha campal" registrada na terça na capital cruzenha. Segundo Costas, o conflito é causado pelo "terrorismo de Estado" e pela "cegueira" em não reconhecer "o direito dos povos (...) às autonomias departamentais". O presidente do Senado boliviano, Óscar Ortiz, do opositor Podemos, de direita, ameaçou intensificar as manifestações caso o governo insista em aprovar a nova Carta.
Folha

10.9.08

Lacerda contesta Jobim

Lacerda vai ao Congresso e contesta versão de Jobim sobre escutas ilegais

O diretor-geral afastado da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), delegado Paulo Lacerda, desmentiu ontem o ministro da Defesa, Nelson Jobim, ao negar, em depoimento na CPI dos Grampos, que o órgão tenha equipamentos capazes de fazer escutas telefônicas e tenha praticado ilegalidades na sua gestão.

Afastado do cargo devido à crise provocada pelo episódio dos grampos contra o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, e outras autoridades, ele acabou se envolvendo em um bate-boca com o líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio (AM), um dos supostos alvos das escutas ilegais.

Virgílio interrompeu a fala de Lacerda para indagar se ele considerava que o ministro da Defesa mentira quando disse que a Abin tinha maletas capazes de fazer escutas à margem da Justiça. "Como diretor da Abin, afirmo que ela não possui (as maletas)", respondeu, ríspido, Lacerda. "Acho que o senhor deveria indagar ao ministro", disse. "Não sou seu preso. Não me trate como se eu estivesse num pau de arara. O ministro mentiu?", retrucou Virgílio.

Lacerda explicava, ao ser interpelado, que os equipamentos adquiridos pela agência são de varredura. "A Abin não possui equipamentos específicos para ouvir ou gravar conversações."

Depois do mal-estar, Lacerda pediu desculpas, mas explicou que estava também indignado com as "acusações levianas" das quais se disse vítima. Por sugestão do senador Romeu Tuma (DEM-SP), a comissão aprovou a realização de uma diligência, com um perito, para saber quem tem razão. Jobim deporá em data a ser acertada.

A comissão aprovou, ainda, a tomada de depoimento do araponga aposentado Francisco Ambrósio do Nascimento, suspeito de ter auxiliado nas investigações da Operação Satiagraha, que resultou na prisão do banqueiro Daniel Dantas, do ex-prefeito de São Paulo Celso Pitta e do investidor Naji Nahas.

Presente à audiência o ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Jorge Armando Felix, negou que a Abin tenha feito escutas ilegais durante a Satiagraha.

Último a depor, o diretor-geral da Polícia Federal, delegado Luiz Fernando Corrêa, disse que a PF apenas faz grampos com autorização judicial e em casos excepcionais. "Há um mito em torno do uso de escutas."

As seis horas de discussões, porém, não trouxeram respostas para questões centrais sobre as escutas ilegais. Não ficou esclarecido se a Abin e a PF estão envolvidas nas escutas ilegais e nem se as maletas da Abin podem fazer grampos.
Estadão

Oposição fecha válvulas de gás na Bolívia

Brasil diz que fornecimento não foi afetado, mas adversários de Morales ameaçam prosseguir com ação contra gasodutos

Diferentemente de campos petrolíferos e estações de compressão, válvulas de segurança não estão sob proteção de Forças Armadas


Opositores ao governo Evo Morales da região do Chaco, zona gasífera do sul boliviano, anunciaram ontem ter fechado quatro válvulas do gasoduto que envia o combustível ao Brasil. O fornecimento ao país não foi afetado, no entanto, segundo autoridades do setor.
O gerente comercial da Transierra, empresa que administra o gasoduto Bolívia-Brasil no país vizinho, Jorge Bolant, disse que os opositores de Morales ocuparam uma das instalações com o objetivo de fechar uma válvula de segurança do gasoduto, mas não tiveram êxito.
"É uma válvula que funciona com acionamento automático, mas que também pode ser manipulada manualmente. Mas não é algo simples de ser feito, é necessário conhecer o equipamento. Por isso, não conseguiram", disse Bolant.
A Transierra tem como sócias a Petrobras, a Andina-Repsol e a francesa Total. Segundo Bolant, a operação do gasoduto funciona normalmente e, até agora, não há ameaça de interrupção do abastecimento de gás para Brasil e Argentina.
Na cidade de Villamontes, um dos focos do protesto no Chaco, a Folha falou com um homem que diz ter participado do fechamento de uma segunda válvula, a 36 km da cidade. O mesmo disse o líder dos manifestantes da região, Felipe Moza, presidente do Comitê Cívico local. "Sei que fecharam quatro, mas essa é a única que garanto, essa sim está fechada", afirmou Moza.
A válvula afetada pelos manifestantes de Villamontes é como as outras, parecida com uma chave de torneira gigante, segundo imagens da TV local. É cercada por arame farpado, rompido na ação.
Não havia confirmação sobre o fechamento das outras duas válvulas, mas a ameaça dos líderes cívicos era seguir com as ações para chamar atenção do governo, de quem cobra que reveja a decisão de reduzir o repasse aos departamentos do IDH, imposto sobre hidrocarbonetos, para financiar o pagamento de pensões a idosos.
À diferença dos campos petrolíferos e das estações de compressão, as 20 válvulas de segurança ao longo do gasoduto da Bolívia até o Brasil não estão sob vigilância militar. Tarija é responsável por 60% da produção de gás boliviano. O Brasil, por sua vez, importa da Bolívia metade do gás natural que consome.

Abastecimento garantido
No começo da noite de ontem na Bolívia, TVs informavam que o presidente Evo Morales estaria reunido com o comando militar e integrantes do gabinete. Mais cedo, o governo voltara a garantir o abastecimento do Brasil e da Argentina.
Ontem, em Manaus, a diretora de Gás e Energia da Petrobras, Maria das Graças Foster, reafirmou que considera o governo boliviano um fornecedor confiável: "A Bolívia tem sido um excepcional supridor de gás para o Brasil, apesar de todas as suas inquietações. Até o momento não há sinal algum de que possamos ter perda de suprimento do gás da Bolívia".
A TBG (Transportadora Brasileira Gasoduto Bolívia-Brasil), que administra o gasoduto no Brasil, informou que o abastecimento está normalizado.
Apesar dessas declarações, executivos que atuam na indústria de petróleo e gás da Bolívia temem que os opositores de Morales queiram adotar uma estratégia de interrupções pontuais do fornecimento.
Segundo essa interpretação, não interessaria a eles paralisar completamente o fornecimento de gás a Brasil e Argentina.
Isso porque o objetivo dos manifestantes seria o de pressionar os governos brasileiro e argentino a adotar uma posição mais dura quanto a Morales.
Os dois países integram com a Colômbia o chamado "grupo de amigos", que tentou sem sucesso destravar a crise que se arrasta no país desde que o governo aprovou, sem a anuência da oposição, uma nova Constituição no ano passado, e que apenas se acirrou após a ratificação de Morales, com mais de dois terços dos votos, em um referendo revogatório realizado no mês passado.
A maioria das empresas que atuam no Chaco montou um plano emergencial para assegurar o abastecimento das unidades de produção e garantir o deslocamento dos funcionários para os locais de trabalho.
Folha

Candidatos do PT são os que mais gastam e arrecadam

Juntos, 17 postulantes da sigla declararam receita de R$ 13,7 mi e gastos de R$ 12,3 mi

Paulo Ferreira, tesoureiro do PT, diz que valores se devem à maior quantidade de candidatos; próximos da lista são PSDB, PMDB e DEM


Os candidatos do PT são os que mais arrecadaram e também os que mais gastaram nos dois primeiros meses de campanha nas capitais, conforme análise da última prestação de contas apresentada pelos candidatos a prefeito ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
Juntos, os 17 candidatos petistas declararam arrecadação de R$ 13,7 milhões e gastos de R$ 12,3 milhões.
Depois dos petistas estão os candidatos do PSDB, do PMDB e do DEM, nesta ordem, com maior receita e despesa na campanha nas capitais.
Para o tesoureiro do PT, Paulo Ferreira, o partido arrecadou mais porque tem o maior número de candidatos. Concorrem às capitais 164 políticos, sendo 17 do PT, 12 do PMDB, 12 do DEM e 11 do PSDB.
"O PT não teve facilidades no governo Lula. Mas, nos últimos dez anos, temos registrado um aumento das doações a candidatos e ao próprio partido", disse o tesoureiro petista.
Mesmo depois da crise do mensalão, onde as contas do PT foram questionadas, Paulo Ferreira afirma que a arrecadação aumentou.
"A crise política foi em 2005. No ano seguinte, o Diretório Nacional recebeu um valor recorde de doações", disse ele.
A petista Marta Suplicy é a candidata com maiores receita e despesa do país. Declarou ter arrecadado R$ 4,6 milhões e gasto R$ 4,4 milhões.
O tucano Geraldo Alckmin arrecadou e gastou R$ 4,1 milhões, segundo informação que consta no site do candidato.

Não disponíveis
Os dados do prefeito de São Paulo e candidato à reeleição Gilberto Kassab (DEM), o candidato que mais arrecadou no Brasil na primeira parcial entregue em agosto, não estão disponíveis no site do tribunal.
De acordo com a assessoria de imprensa do tribunal, as prestações de conta parciais de Kassab e do tucano Geraldo Alckmin não constam no banco de dados do TSE.
Um dos coordenadores das campanha de Alckmin, Edson Aparecido (PSDB-SP) assegurou que protocolou às 16h24 da última quinta-feira no cartório da 1ª Zona Eleitoral não apenas a prestação de contas do candidato como a do comitê.
A assessoria de Kassab também afirmou que as contas do prefeito candidato à reeleição foram entregues à Justiça Eleitoral no dia 5 de setembro. Não há punição prevista a candidato ou partido que deixa de apresentar a parcial ao tribunal.
Na segunda prestação de contas apresentada pelo TSE, os gastos aumentaram 206%, se comparados aos do primeiro mês de campanha.
Já a arrecadação total dos 164 candidatos nas capitais caiu 28,6%.
Ainda assim, se somadas as receitas e as despesas de todos os postulantes à principal cadeira do Executivo, o saldo é positivo. Há em caixa cerca de R$ 5 milhões.
Folha

9.9.08

Dantas dribla Receita com recursos judiciais

Fisco só conseguirá analisar 670 das 24 mil operações financeiras de disco rígido do Opportunity apreendido pela PF em 2004

Por lei, a Receita só pode cobrar impostos retroativos a cinco anos; disco obtido na Operação Chacal registrava movimentações desde 19
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Graças à passagem do tempo, em parte propiciada pela apresentação de recursos judiciais, o banqueiro Daniel Dantas, do Opportunity, livrou milhares de operações de seus clientes de passar pelo crivo da Receita. O fisco vai analisar apenas 670 das quase 24 mil movimentações que constam do disco rígido do banco apreendido pela Polícia Federal em 2004 e que tiveram o responsável identificado pela fiscalização.
Assim, em vez de ter como base de cálculo US$ 6 bilhões para cobrar impostos devidos aos cofres públicos, os fiscais da Receita irão se debruçar sobre um montante de US$ 534 milhões -a soma das 670 operações entre 2003 e 2004.
A Folha tentou, sem sucesso, falar com o advogado de Dantas até a conclusão da edição.
Por lei, a Receita só pode cobrar impostos devidos retroativos a um prazo de cinco anos. A matéria-prima do trabalho dos fiscais poderia ser maior, não fossem os sucessivos recursos que os advogados do banqueiro apresentaram e por meio dos quais conseguiram, inclusive no STF (Supremo Tribunal Federal), a proibição da abertura e da análise dos dados contidos no disco rígido apreendido na Operação Chacal e que registra 33 mil operações financeiras internacionais, entre dezembro de 1992 e junho de 2004.
O principal argumento dos advogados é que as movimentações não eram alvo da Chacal, que tinha como foco a contratação da empresa Kroll para espionar, inclusive com métodos ilegais, a Telecom Italia -que mantinha disputas judiciais com a Brasil Telecom, então gerida pelo Opportunity.
Por uma manobra jurídica do Ministério Público e da PF, o sigilo do disco rígido foi quebrado, sob o argumento de que necessitavam ter acesso aos dados para verificar eventual envolvimento do banqueiro com o mensalão -o esquema de pagamento a congressistas da base aliada em troca de apoio ao governo Lula. Tudo isso ancorado no fato de que as companhias telefônicas de Dantas teriam contribuído com R$ 150 milhões para tais pagamentos.
Três anos depois de aprovada a quebra do sigilo do disco rígido pela Justiça, os peritos acessaram seus dados e constataram a prática de crime financeiro. Elaboraram um laudo que foi um dos fundamentos para a prisão de Dantas na Operação Satiagraha, em julho.
As operações financeiras sob investigação da Receita e da PF fazem parte de um tipo de aplicação destinada a um fundo no qual só podem investir pessoas não-residentes no país. Ao colocar seu dinheiro no Brasil, ganham como benefício isenção de Imposto de Renda.
Havia a suspeita, confirmada pela Satiagraha, de que residentes no Brasil usavam essa movimentação para burlar a lei e livrar-se de tributos.
A passagem do tempo, com os sucessivos recursos, na prática fez com que uma montanha de US$ 5,5 bilhões eventualmente ilegais tenha sido legalizada, o que beneficia diretamente clientes de Dantas.
As 670 operações sob investigação têm como titulares 120 pessoas físicas e jurídicas. Entre impostos, juros e correção monetária, devem recolher mais de R$ 6 bilhões.
Ainda que prescritos do ponto de vista da Receita, os crimes financeiros continuam sob investigação, na esfera criminal, da equipe da PF da Satiagraha.
Folha

8.9.08

Carta do presidente do PT

Brasília, 4 de agosto de 2008

Aos Diretórios e Bancadas Parlamentares do PT,
Aos/às Militantes Petistas nos Movimentos Sociais

Homologação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol

No próximo dia 27 de agosto, o Supremo Tribunal Federal decidirá sobre o futuro da demarcação e homologação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol. É uma batalha decisiva pelos direitos dos povos indígenas no Brasil, visto que esta decisão responde a questionamento da ação de nosso governo que assegura antiga e fundamental reivindicação do movimento indígena e indigenista e terá reflexos em todos os demais processos de demarcação e homologação de terras indígenas em qualquer estado do país.

A Executiva Nacional do PT já se posicionou em duas oportunidades em apoio à demarcação em áreas contínuas, e no dia 30 de junho realizou seminário em que participaram lideranças dos movimentos indígenas, de outros movimentos sociais, parlamentares e dirigentes partidários que aprovou uma ampla mobilização para enfrentarmos os argumentos conservadores contra a demarcação e homologação.

Para a semana do julgamento, entre os dias 25 e 27, caravanas de todo o país dos movimentos sociais realizarão atos, debates, seminários e vigílias em Brasília em solidariedade aos povos indígenas.

O PT patrocinará as seguintes iniciativas neste mês de agosto, para a qual pedimos a participação de todos/as:

1. criação de espaço próprio no portal do PT, www.pt.org.br, reunindo documentação capaz de fornecer os argumentos em favor da tese defendida pelos movimentos indígenas, pelo governo e pelo partido sobre a demarcação e homologação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol;

2. envio a todos/as os/as vereadores/as do PT do país de modelo de moção a ser apresentada e aprovada nas Câmaras Municipais, dirigidas ao STF;

3. realização, por iniciativa das bancadas estaduais, de audiências públicas ou atos nas Assembléias Legislativas para debate da questão indígena e da importância da decisão favorável do STF à demarcação de Raposa Serra do Sol;

4. realização de audiências públicas em comissões legislativas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal;

5. estímulo a mais ampla divulgação dos nossos argumentos e posições na mídia pública e privada, propondo debates nas emissoras públicas em todo o país através de nossas bancadas parlamentares;

6. divulgação de todas as iniciativas do governo federal e dos movimentos pró-ratificação da homologação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol para incentivar a participação dos/as petistas em seu fortalecimento.

Assim, a Executiva Nacional do PT pretende estimular o mais amplo engajamento do conjunto do partido nesta luta, e solicita que as iniciativas adotadas pelos estados e municípios sejam comunicadas à Secretaria Nacional de Movimentos Populares e Políticas Setoriais (11.3243-1313) e à Secretaria Nacional de Mobilização (61.3213-1313).

Saudações petistas,

Ricardo Berzoini
Presidente Nacional do PT

Marinete Merss
Secretária Nacional de Mobilização do PT

Renato Simões
Secretário Nacional de Movimentos Populares e Políticas Setoriais do PT

Mensaleiros são candidatos em outubro

Réus no caso que está sendo julgado pelo Supremo, José Borba e Anderson Adauto tentam vagas de prefeito neste ano

Impedidos pela Justiça de concorrer, Dirceu, Roberto Jefferson e Pedro Corrêa vêem filhos consolidarem suas carreiras políticas


Três réus do caso mensalão, em julgamento no Supremo Tribunal Federal, são candidatos neste ano, e pelo menos sete apadrinham outros políticos.
O ex-deputado José Borba, acusado de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, é candidato a prefeito de Jandaia do Sul (PR). Borba, que renunciou ao mandato para não ser cassado, migrou do PMDB para o PP. Sua candidatura foi impugnada em primeira instância, mas foi deferida após recurso.
À Justiça Eleitoral Borba declarou patrimônio de R$ 300 mil, que inclui uma caminhonete Hilux (R$ 153 mil) e aplicações em nome da esposa.
Outro que teve a candidatura contestada mas aprovada em segunda instância foi o ex-ministro Anderson Adauto (PMDB), que tenta se reeleger prefeito de Uberaba (MG).
Adauto, que confessou uso de caixa dois em disputas eleitorais, foi questionado pelo Ministério Público por seu envolvimento com o mensalão. Ele responde a crimes de lavagem de dinheiro, corrupção ativa e improbidade administrativa. Seu nome foi incluído na "lista suja" da AMB (Associação dos Magistrados Brasileiros).
Adauto declarou patrimônio superior a R$ 987 mil, sendo R$ 519 mil referentes a uma mansão que tem em área nobre de Vila Santa Maria, em Uberaba. O prefeito também é sócio de uma empresa de consultoria na área de biocombustíveis.

Apoio de Lula
Outro mensaleiro em campanha neste ano é Professor Luizinho (PT), que perdeu a reeleição para a Câmara federal em 2006 e tenta agora uma vaga de vereador em Santo André -mesmo cargo em que iniciou sua carreira política há 20 anos.
O petista nega até hoje relação com o saque de R$ 20 mil feito por um assessor.
Luizinho foi elogiado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva na inauguração do campus da Universidade Federal do ABC, em Santo André, há uma semana. À Justiça Eleitoral o candidato petista declarou patrimônio de R$ 457 mil, em sua maior parte formado por imóveis e aplicações financeiras.

Pais e padrinhos
Com os mandatos cassados, os ex-deputados José Dirceu (PT-SP), Roberto Jefferson (PTB-RJ) e Pedro Corrêa (PP-PE) estão impedidos de concorrer a cargo eletivo até 2014.
Os filhos, no entanto, consolidam suas carreiras políticas. Aline Corrêa, filha de Pedro, é vice na chapa de Paulo Maluf (PP), e Roberto Jefferson tenta reeleger a filha vereadora Cristiane Brasil (PTB), no Rio.
Zeca Dirceu tenta novo mandato na Prefeitura de Cruzeiro d'Oeste (PR), onde venceu em 2004 com 72% dos votos válidos e apoio ostensivo do pai.
Dessa vez, o ex-ministro prometeu não interferir. "Não fui lá e só falo com meu filho uma vez por semana", disse à Folha. O prefeito declarou patrimônio de R$ 157 mil, inclusive uma Brasília velha, ano 78.
Zeca, José Dirceu e Waldomiro Diniz (ex-assessor da Casa Civil) foram acusados pelo Ministério Público, em 2005, de improbidade administrativa. Dirceu teria beneficiado seu filho com a liberação de recursos para Cruzeiro d'Oeste. O processo está em tramitação.
Brasil a fora, mensaleiros têm saído em campanha para apoiar candidatos do PT ou da base aliada do governo. O deputado João Paulo Cunha (PT) foi uma das principais lideranças na convenção de lançamento da campanha para reeleição de Emídio em Osasco (SP).
Na semana passada, o deputado José Genoino (PT) esteve em comício de Marta Suplicy. Paulo Rocha (PT-PA) apóia a eleição de Mario Cardoso em Belém. Delúbio Soares, ex-tesoureiro, já participou de ato da campanha de Iris Rezende (PMDB) em Goiânia.
Folha

6.9.08

Os olhos por trás do grampo

Como o agente Francisco Ambrósio do Nascimento, da Abin, coordenou na Polícia Federal a equipe que fez a escuta de 18 senadores, 26 deputados, ministros do governo e das mais altas autoridades do Judiciário

Por MINO PEDROSA E HUGO MARQUES
Revista IstoÉ

Francisco Ambrósio do Nascimento, um ex-agente do extinto Serviço Nacional de Informações (SNI), é o espião que coordenou a atuação de um grupo de agentes da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) na Operação Satiagraha, da Polícia Federal. A pedido do delegado Protógenes Queiroz, responsável pelas investigações contra o grupo do banqueiro Daniel Dantas, Ambrósio se instalou no começo do ano em uma sala no Máscara Negra, como é conhecido o edifício-sede da PF em Brasília. Tornou-se uma espécie de braço direito do delegado, funcionando como elo entre Protógenes e os agentes operacionais da Abin, cedidos à Satiagraha.

Foi da sala situada bem em frente ao gabinete do diretor da Divisão de Inteligência, delegado Daniel Lorenz, que o espião coordenou os trabalhos que resultaram em milhares de horas de diálogos telefônicos gravados, centenas de filmagens e diversos monitoramentos que compõem as entranhas da Satiagraha. Muitas das escutas extrapolaram as autorizações legais da Justiça. Numa delas, gravou-se uma conversa telefônica do presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes, com o senador Demóstenes Torres (DEM-GO). A partir daí, o arsenal clandestino da Satiagraha desencadeou uma crise institucional entre os Três Poderes da República. E o espião passou a última semana esquivando-se nas sombras de Brasília. Ele sabe que deverá ser chamado a depor no Congresso, no Ministério Público e na própria PF. Nessa hora, certamente será pressionado a revelar como, quando, por que e por ordem de quem sua equipe monitorou e promoveu escutas telefônicas e ambientais envolvendo autoridades do Executivo, Legislativo e Judiciário.

Apesar de o QG desses agentes da Abin ocupar um espaço privilegiado no Máscara Negra, nem o diretor de Inteligência nem o diretor-geral, Luiz Fernando Corrêa, sabiam das missões confiadas ou da autonomia concedida ao espião. Para entrar no prédio e nos computadores da PF sem deixar rastros, Ambrósio usava crachá e senhas de outra pessoa, uma funcionária. Os caminhos percorridos por esse crachá e por essa senha já começaram a serem rastreados numa investigação da Polícia Federal. A pedido do presidente do Senado, Garibaldi Alves (PMDB-RN), o caso também será acompanhado por representantes do Congresso e do Judiciário.

Na linguagem dos porões, o que eles vão descobrir é nitroglicerina pura. Segundo arapongas revelaram à ISTOÉ, a operação gravou conversas e monitorou os passos de 18 senadores, 26 deputados, do secretário-geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho, da ministra Dilma Rousseff, de ministros do STF e do STJ, advogados, lobistas e inúmeros jornalistas. "O Protógenes tem em mãos um arsenal que destrói o governo passado, o atual e o próximo", revelou Ambrósio a um amigo. Como tudo que é feito clandestinamente, não se sabe o que, na frase do espião, é fato, bravata ou ameaça.

Mas é justamente porque os poderes não podem funcionar sob a insegurança das escutas telefônicas que o governo precisa urgentemente esclarecer o caso. Dois delegados, William Morad e Rômulo Berredo, foram designados para conduzir esse inquérito. Na semana passada, ambos foram apresentados ao ministro Gilmar Mendes. O ministro da Justiça, Tarso Genro, anunciou que, além de colher depoimentos, a primeira etapa da investigação irá realizar perícia nos equipamentos de escuta telefônica da PF e da Abin para tentar encontrar a origem de alguns grampos. Não será tarefa das mais fáceis.

Boa parte das conversas telefônicas gravadas pela equipe de Ambrósio foi feita a partir do Guardião, software capaz de monitorar centenas de telefones simultaneamente, mas que depende da participação das companhias telefônicas para ser operado. O equipamento permite que qualquer pessoa que faça contato com alguém cujo telefone esteja grampeado possa também virar alvo da escuta. Basta um simples comando do araponga de plantão e a cooperação da companhia telefônica. Essa facilidade de se grampear um novo número a partir da ligação recebida por outro telefone tem sido fundamental para a polícia e a Justiça desmontarem organizações criminosas complexas ligadas ao tráfico de drogas, ao contrabando, à pedofilia ou a crimes cibernéticos. Mas a montagem da grande rede da grampolândia revela a tênue fronteira da legalidade, e, tal qual uma CPI, no uso do Guardião sabe-se como a investigação começa, mas não se sabe até onde chegará.

No caso dos excessos cometidos na Satiagraha, os espiões de Ambrósio também promoveram gravações a partir de maletas que tanto podem diagnosticar a presença de grampos como captar conversas telefônicas quando colocadas a até 100 metros de um dos interlocutores. Esse tipo de equipamento permite que as conversas sejam interceptadas, independentemente da participação das companhias telefônicas. A PF dispõe do Guardião e a Abin dessas maletas, como foi revelado na última semana pelo ministro da Defesa, Nelson Jobim, embora legalmente a agência de inteligência não tenha a prerrogativa de promover escutas telefônicas.

Os arapongas comandados por Ambrósio chegaram a alguns senadores, como Demóstenes Torres e Heráclito Fortes, a partir do monitoramento ilegal feito contra a repórter Andréa Michael, da Folha de S. Paulo. Foi ela quem primeiro revelou que havia a Operação Satiagraha, o que irritou o delegado Protógenes. Ele chegou a pedir sua prisão temporária, negada pela Justiça, sob a alegação de que ela estaria favorecendo a defesa de Daniel Dantas. Os agentes da Abin gravaram em vídeo um diálogo da jornalista com fontes da área de informações. No diálogo, eles debatem as investigações contra Dantas. No curso do monitoramento à repórter, foi grampeada uma ligação dela para o senador Demóstenes. "Não existe nenhuma autorização para o monitoramento de meus telefones ou de minhas conversas", lembra a jornalista. "Nunca tratei de nenhum assunto do Daniel Dantas, mas a repórter Andréa Michael conversa comigo em busca de notícias, como muitos outros jornalistas", diz Demóstenes.

A partir do monitoramento da jornalista, os espiões da Abin passaram a acompanhar o senador. Ele acabou também sendo gravado. Na Polícia Federal, suspeita-se que esteja aí a origem da gravação do diálogo do senador com o ministro Gilmar Mendes. Isso, no entanto, não exclui a possibilidade de que outras formas de monitoramento tenham sido praticadas contra autoridades do STF, do Superior Tribunal de Justiça e do Congresso. O senador Heráclito Fortes, por exemplo, que nunca escondeu ter boas relações com o banqueiro Dantas, chegou a ter seus passos seguidos pela equipe de Ambrósio no Rio de Janeiro.

Agentes ouvidos por ISTOÉ confirmam o que as autoridades suspeitam: a liberdade com que os espiões trabalharam, sem prestar contas à Justiça ou a superiores, levou a Satiagraha a descambar para uma grande teia de escutas e filmagens que nada tinham a ver com o objetivo inicial. Como bem lembrou o espião Ambrósio a um amigo, Protógenes tem em suas mãos muita coisa que não está no inquérito da Satiagraha. Existem casos inimagináveis, como seguir um senador pelas ruas do Rio de Janeiro, mas há também outros casos menos estrondosos. Os arapongas contam, por exemplo, que a advogada Carolina Louzada, de Brasília, que trabalha em centenas de processos com tramitação no STJ, foi grampeada. Na conversa, teria antecipado a decisão que seria tomada por um dos ministros da Casa. Até a sexta-feira 5, o STJ não havia sido comunicado oficialmente sobre o caso. Procurada por ISTOÉ, a advogada afirmou que não tinha conhecimento do grampo. "Estou chocada com tudo isso. Sou mais uma vítima nessa história", disse Carolina. Ela afirmou que de fato faz parte de um escritório que tem diversas causas no STJ, mas que em poucas ações é parte direta. "Jamais em minha vida prometi facilidades em ações junto ao STJ. Pelo contrário. Não tenho contato em gabinetes dos ministros e nunca tive facilidade alguma", afirma.

A presença dos espiões liderados por Ambrósio no centro das investigações contra Daniel Dantas é o resultado de divergências internas da própria PF. Protógenes já deixou claro que não confia em seu chefe, o delegado Luiz Fernando Corrêa. Quando Corrêa assumiu a direção-geral da PF, em setembro de 2007, Protógenes já comandava as investigações da Satiagraha a pedido do delegado Paulo Lacerda, ex-diretor da Polícia Federal e atual diretor afastado da Abin. Na troca de comando, Lacerda fez um único pedido ao sucessor: conservar o delegado por ele escolhido à frente da Satiagraha e lhe dar carta branca para solicitar todos os recursos materiais e humanos que fossem necessários para as investigações. O pedido não foi aceito.

No final do ano passado, Protógenes começou a ficar sem recursos para continuar a apuração e interpretou que seus novos superiores estariam empenhados em evitar que o cerco a Dantas fosse fechado. Traçou, então, uma estratégia ousada. Pediu que seus próprios telefones fossem grampeados. Sempre que queria reunir elementos contra Luiz Fernando Corrêa e Daniel Lorenz, telefonava-lhes reivindicando apoio para as operações da Satiagraha e, legalmente (estava registrando sua própria conversa), gravava os diálogos em que os recursos eram negados. Com essas gravações, poderia tornar publica a qualquer momento sua versão de que o comando da PF estaria agindo de maneira a proteger Dantas.

A relação entre Protógenes e seus chefes degringolou de vez no início do ano, quando, depois de cobrar insistentemente um relatório das ações da Satiagraha, Lorenz recebeu do subordinado uma solitária lauda de papel ofício com apenas seis tópicos que não diziam nada. Depois disso, o chefe da Divisão de Inteligência decidiu checar de perto as atividades de Protógenes no Máscara Negra e ali reconheceu Márcio Seltz, um agente da Abin com quem trabalhara em outras operações. Lorenz interpelou Seltz:

O que você está fazendo aqui?, quis saber o delegado.

Trabalho para o Protógenes, respondeu secamente o agente da Abin.

Quem autorizava o ingresso de Seltz no prédio da PF era alguém que se identificava como Moisés Andrade e atendia o ramal interno na sala de Protógenes. Agora, a Polícia Federal quer saber quem é Moisés Andrade, uma vez que esse nome não consta no quadro de funcionários.

Na semana passada, depois que os grampos ilegais promovidos sob suas barbas ganharam contornos de crise institucional, Lorenz fez um mea-culpa ante o diretor Corrêa. "Naquele momento eu deveria ter relatado em ofício a presença de pelo menos um homem da Abin dentro da Polícia Federal e exigido seu afastamento das investigações", lamentou Lorenz. Quando descobriu a presença de Seltz no Máscara Negra, Lorenz disse a Protógenes que era inaceitável ver espiões da Abin circulando na sede da PF e ameaçou tirar de suas mãos o controle da Satiagraha. Protógenes contra-atacou dizendo que tinha gravações de conversas suas tanto com Lorenz como com o diretor Corrêa e que se elas vazassem "ficaria chato". Protógenes, então, seguiu no comando da Satiagraha, mas deixou a sede da Polícia Federal, transferindo-se para um conjunto de salas comerciais no Setor Sudoeste, bairro de classe média de Brasília, e viu minguarem as verbas de investigações.

Com a medida, o diretor da Divisão de Inteligência conseguiu tirar os arapongas da Abin de dentro da sede da PF, mas não evitou que suas atividades continuassem em outro QG, ainda ao lado de Protógenes. Lorenz, então, viajou a São Paulo para uma conversa reservada com o juiz Fausto De Sanctis, cujas decisões davam garantia legal aos atos de Protógenes e a alguns dos grampos e monitoramentos promovidos pela equipe do espião Ambrósio. Lorenz pediu ao juiz que encerrasse as autorizações dadas à equipe da Satiagraha. As autorizações, contudo, continuaram a ser dadas. Lorenz está convencido de que Protógenes ficou sabendo de suas intenções no mesmo dia em que esteve com o juiz. Na manhã da sexta-feira 5, o magistrado afirmou que não irá se manifestar sobre o episódio. "Acho uma atitude responsável da revista estar me procurando, mas no momento não vou comentar nada a esse respeito", disse o juiz Fausto De Sanctis à ISTOÉ. O delegado Protógenes tem afirmado que tudo o que fez está legalizado e registrado no inquérito da Satiagraha.

Lorenz e Corrêa, apesar de ocuparem os mais altos cargos da Polícia Federal, jamais oficializaram a suspeita de que arbitrariedades estariam sendo cometidas pelas equipes de Protógenes e do espião Ambrósio. Mas, desde o mês de maio, ambos tiveram a certeza de que os grampos ilegais estavam espalhados por todo o País. A convicção se deu quando Protógenes entregou a Lorenz um ofício solicitando uma maleta para fazer grampos a distância. Para quê a maleta, se Protógenes já tinha à sua disposição o sistema Guardião, que grava as escutas autorizadas pelo juiz? O pedido foi negado. "Eu sabia que o Protógenes não precisava da maleta, pois a operação já estava terminando", justificou o diretor da Divisão de Inteligência.

O descontrole sobre as ações do grupo de Protógenes e do espião Ambrósio ajudam a embasar as desconfianças daqueles que acusam a PF de trabalhar com fins políticos. A PF e os agentes da Abin conseguiram gravar ilegalmente senadores, deputados, ministros e autoridades do Judiciário. No entanto, se mostraram incapazes de cumprir uma determinação do STF que mandou monitorar as conversas telefônicas do exsecretário nacional do PT Romênio Pereira, suspeito de participar de um esquema que desviou do Orçamento da União R$ 700 milhões dos cofres públicos, como revelou ISTOÉ há três semanas. Em carta dirigida ao STF, a Polícia Federal alegou não dispor de recursos técnicos para promover a escuta telefônica do petista.

Embora afirme que seus agentes não tiveram participação oficial na Satiagraha, a direção da Abin tem conhecimento de que uma equipe liderada pelo espião Ambrósio estava atuando sob o comando de Protógenes. Paulo Lacerda, diretor afastado da Abin, revelou a amigos que foi procurado pelo delegado no final do ano passado, dias depois de assumir o comando da agência. "Estou sozinho", reclamou Protógenes a seu antigo protetor. "Estão tirando os meios da operação lá na Polícia Federal." Segundo revelou Lacerda, foi o próprio Protógenes quem solicitou uma reunião dele, Lacerda, com Corrêa.

"Avisei ao doutor Luiz Fernando Corrêa que a investigação do Daniel Dantas tinha um potencial explosivo", disse o diretor afastado da Abin em conversas reservadas. "O Protógenes ressuscitou a operação com a ajuda da Abin." Protógenes também afirmou a Lacerda que Lorenz sabia dos detalhes do trabalho dos espiões da Abin. Nas conversas com amigos, Lacerda assegura que o atual diretor da PF foi nomeado pelo ministro Tarso Genro para brecar investigações que poderiam atingir algumas alas do PT. Segundo ele, na lista de operações que deveriam ser abortadas estava a Satiagraha.

Ao mostrar a zona de ilegalidade por onde trafegam os agentes da Abin, a crise instalada com a confirmação da escuta clandestina de parlamentares e membros da mais alta corte de Justiça do País provocou reações indignadas de toda a sociedade. Na CPI do Grampo, há a disposição de se buscar uma nova legislação que seja capaz de efetivamente impedir o abuso dos arapongas e o uso irregular das interceptações para atender a interesses escusos.O presidente da CPI, deputado Marcelo Itagiba (PMDB-RJ), antecipou à ISTOÉ que vai apresentar um projeto para endurecer a legislação. Um "código nacional de interceptação telefônica", disse Itagiba. O artigo número um dessa nova proposta é uma pena pesada para interceptação ilegal, em torno de quatro anos de reclusão. A comissão também vai sugerir a punição de agentes públicos que "vazam" escutas telefônicas.

Itagiba pretende propor um capítulo especial sobre a comercialização e fiscalização de equipamentos de escuta, nos mesmos moldes do que acontece nos Estados Unidos. Lá, nenhum equipamento pode ser vendido sem a chancela do governo. No Brasil, a idéia é deixar o controle com a Agência Nacional de Telecomunicações, a Anatel. O parlamentar apóia a iniciativa do Conselho Nacional de Justiça de uniformizar os processos para autorização de escuta telefônica. "A CPI mostrou que os preceitos constitucionais não estão sendo observados", diz Itagiba. Também no Ministério da Justiça elabora-se um projeto para disciplinar o uso do grampo telefônico. A proposta do governo é que os espiões da Abin sejam espionados por um grupo de observadores eleitos para isso. Trata-se de uma proposta que tem o aval do senador Demóstenes Torres, vítima do grampo que deflagrou a crise. Na quinta-feira 4, ele prestou depoimento de mais de duas horas ao delegado William Morad e no final do encontro propôs a criação de um núcleo formado por sete pessoas para monitorar, dentro da Abin, todas as atividades dos arapongas.

É certo que a implantação de um estado policialesco incapaz de assegurar o sigilo das comunicações é algo que deve ser rechaçado. Não cabem, porém, as críticas apaixonadas - que sustentam o fim de qualquer grampo ou até mesmo a extinção de todos os serviços de inteligência - nem as motivadas por razões políticas que pretendem se valer do condenável grampo contra o presidente do STF para dar vazão a pendengas partidárias. Há que se considerar que, quando usadas de forma regular, transparente e sob o rígido controle do Judiciário, as escutas telefônicas têm se mostrado uma extraordinária ferramenta de combate ao crime organizado, como tráfico de drogas, lavagem de dinheiro e até casos de pedofilia.